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Pedro Lameira de Andrade

Numa época quando o Espiritismo era ainda muito mal compreendido, e quando
reinava verdadeira desunião entre os seus adeptos e até no seio de suas
instituições, um vulto notável e infatigável surgiu no cenário da divulgação
doutrinária, constituindo- se num dos mais salientes espíritas da época.

Nos anais da História do Espiritismo, os registros biográficos do Dr. Pedro
Lameira de Andrade são bastante escassos, em flagrante contraste com o vulto da
obra que tão bem soube desempenhar, e que projetou o seu nome na posteridade. A
exemplo do que sucedeu com outros grandes missionários, cujas obras foram
legadas aos homens das futuras gerações, através dos informes de discípulos
dedicados, a missão fulgurante de Lameira de Andrade somente é suficientemente
conhecida por aqueles que com ele conviveram, os quais a ele se referem como um
autêntico benfeitor da Humanidade, um homem que procurou impulsionar seus
companheiros de jornada terrena, na senda do aprimoramento espiritual e do
aculturamento, poderosas alavancas que atuam no laborioso processo de reforma
íntima das criaturas humanas.

Seus pais foram Boaventura Plácido Lameira de Andrade e Carolina Levereuth de
Andrade, tendo o seu nascimento corrido no bairro de Vila Isabel, no antigo
Distrito Federal. Aos 17 anos de idade, perdeu seu pai e, atendendo a um convite
de seu padrinho foi para São Paulo, ingressando no Colégio Mackenzie, onde se
formou em Teologia. Não chegou a ordenar- se pastor protestante, em virtude de
haverem surgido algumas divergências entre ele e o reitor do Saninário.

Lameira era exímio tenor e, em 1904, casou- se com D. Elvira Silveira,
pianista e professora de Pedagogia e Psicologia da Escola Normal. Desse
consórcio teve seis filhas. Nessa época ele era também professor de português,
grego e latim, lecionando na escola da Força Pública, atual Polícia Militar de
S. Paulo. Ingressando na Faculdade de Direito de S. Paulo, formou- se em 1912.
Dessa data em diante deixou de lecionar para consagrar- se à profissão de
advogado, tendo montado escritório em S. Paulo.

A desencarnação de sua filha mais idosa, deixou-o desolado e revoltado,
passando a descrer de tudo. Aconselhado por amigos procurou o Espiritismo,
doutrina que lhe trouxe o consolo e a certeza da imortalidade da alma.

Na década de 1920, Pedro Lameira de Andrade já antevia a necessidade da instrução
como fator decisivo para a libertação do Espírito, através do conhecimento da
verdade, por isso sonhava com a fundação de escolas primárias e ginásios, que
viessem a funcionar alicerçados nos postulados da Doutrina Espírita. Nos idos de
1928- 29, com vistas ao desenvolvimento de um programa nesse sentido, ao lado de
outros companheiros que estavam inspirados do mesmo ideal, lutou arduamente para
a implantação de um instituto de ensino que servisse de modelo para as futuras
organizações do gênero. Seu sonho concretizou- se quando viu funcionar o Liceu
Espírita Brasileiro, entidade que teve vida efêmera, durando pouco mais de um
ano. Entretanto, a semente ficou lançada.

Homem dotado de um dinamismo invulgar, arrojado em seus cometimentos e
animado de um idealismo inquebrantável, Lameira tornou- se figura bastante
conhecida em todo o Brasil e principalmente no Estado de S. Paulo e no Rio de
Janeiro, em cujo cenário, teve a oportunidade de desempenhar a sua gigantesca
tarefa.

A missão de Lameira de Andrade, no seio do Espiritismo, foi desenvolvida, em
grande parte, ao lado do Dr. Augusto Militão Pacheco, renomado médico e um dos
grandes baluartes espíritas da época. Através dos seus escritos, das suas
conferências, esse infatigável seareiro não media esforços em suas
peregrinações. Muitas cidades brasileiras foram por ele visitadas e seu nome
conseguiu empolgar grandes auditórios, pois sabia abordar, com raro descortino,
os ensinamentos evangélicos à luz da Doutrina Espírita.

Foi procurador do “Abrigo Batuíra”, tendo sido um dos seus fundadores.
Durante 19 anos prestou inestimáveis serviços a “Instituição Verdade e Luz”.
Embora não conhecesse pessoalmente o grande missionário que foi Antônio
Gonçalves da Silva Batuíra sucedeu- o na direção da revista “Verdade e Luz”,
fundada no ano de 1890. Foi membro da diretoria da Associação Espírita São Pedro
e São Paulo, onde trabalhou intensamente e com raro devotamento, ao lado de
grandes seareiros. Teve também marcante atuação no campo da assistência social,
tendo nesse afã, chegado até o sacrifício.

Foi ainda sócio benemérito da Cruz Azul de S. Paulo, tendo prestado a esse
organismo o fruto de seu esforço, dando viva demonstração do seu Espírito
magnânimo, sempre pronto a servir e a cooperar na implantação e desenvolvimento
de obras altruísticas.

Em 12 de julho de 1936, ao ser fundada a Federação Espírita do Estado de S.
Paulo, Lameira de Andrade foi eleito seu orador oficial, em sua primeira
diretoria, passando a representar aquela egrégia instituição em quase todas as
solenidades promovidas pelas associações espíritas do Estado. Na própria
Federação, ele era invariavelmente requisitado pelos freqüentadores, para
proferir palestras, as quais eram bastante concorridas.

Certa ocasião, chegada a hora designada para a realização de uma conferência
sobre o tema “O Perdão”, na Sede da Associação “Verdade e Luz” choveu
torrencialmente. Apenas estavam na sede da instituição o orador, Elói Lacerda e
outros dois companheiros. Lameira, vendo o salão vazio, aventou a idéia de fazer
uma prece e encerrar a reunião, sugestão prontamente repelida pelos presentes. A
palestra foi proferida, portanto, como se o salão estivesse repleto. A
determinada hora entrou no recinto uma pobre mulher, toda molhada, esperando
resguardar- se da chuva. Assentando- se nas últimas cadeiras, passou a prestar
inusitada atenção às palavras do conferencista.

Ao finalizar a palestra, ela aproximou- se do orador e lhe disse: “Graças a
Deus entrei nesta casa e ouvi suas palavras. Eu estava decidida a cometer um
crime nesta noite. Entretanto, agora compreendo as razões de minha desorientação
e vou tomar rumo diferente, vou lutar contra as forças negativas que quase me
desviaram do caminho do bem.” Lameira abraçou- a comovido, alegrando-se
intimamente pelo fato de ter servido de ponte para que aquela criatura se
reencontrasse e viesse a descortinar novos horizontes.

Lameira de Andrade viveu na Terra pouco menos de 58 anos, desencarnando
vítima de fulminante derrame cerebral que o prostrou em poucas horas. Ele soube
aproveitar bem esses curtos anos de trabalho, desenvolvendo tarefa de gigante,
no sentido de distribuir, em profusão, tudo aquilo que era patrimônio de seu
Espírito esclarecido e evangelizado. Ele soube assimilar, em sua plenitude, os
ensinamentos de Jesus Cristo, no sentido de colocar a luz sobre o velador. Foi o
bom obreiro que soube restituir ao Senhor, em dobro, os talentos recebidos.

Sua desencarnação representou irreparável perda para os espíritas de São
Paulo e do Brasil, uma lacuna que dificilmente seria preenchida.