Culpa, Arrependimento e Reparação
Palestra Virtual
Promovida pelo IRC-Espiritismo
Http://www.Irc-espiritismo.org.br
Palestrante: Henrique Fernandes
Rio de Janeiro
03/05/2002
Organizadores da Palestra:
Moderador: “Jaja” (nick: [Moderador])
“Médium digitador“: “Henrique Fernandes” (nick: Henrique_Fernandes)
Oração Inicial:
<_Alves_> Amado pai. Com a tua benção aqui nos encontramos. Ávidos por conhecimentos que nos aprimorem a alma. Possamos, querido pai. Sermos merecedores da tua proteção. Que os teus mensageiros nos inspirem. Para que neste ambiente virtual. O respeito e a fraternidade sejam o nosso móvel. Permita, senhor, que o nosso palestrante possa transmitir as melhores orientações. Segundo as nossas necessidades. Sê conosco, senhor, agora e sempre. Que assim seja. (t)
Apresentação do Palestrante:
<Henrique_Fernandes> Caros companheiros de ideal espírita, desejamos a todos nós muita paz. É uma satisfação estar participando desta palestra virtual com vocês. Atuamos no movimento espírita realizando alguns trabalhos de divulgação espírita através de palestras e estudos.
Atuo como presidente da Cruzada Espírita Discípulos de Allan Kardec, que fica em Duque de Caxias, no Rio de Janeiro. Faço parte da Associação Médico-espírita do Rio de Janeiro e no campo profissional sou formado em Psicologia e atuo na área clínica.
Fundamos aqui no Rio de Janeiro (Tijuca) o IBRAPE-TVP – Instituto Brasileiro de Pesquisa em Terapia de Vida Passada.
Vamos hoje tratar de uma questão que constitui o objeto central de nosso livro, que esperamos publicar este ano. Culpa e Reencarnação, focalizando especialmente a questão do arrependimento, culpa e reparação. Vamos ao nosso diálogo fraternal. (t)
Considerações Iniciais do Palestrante:
<Henrique_Fernandes> A questão do sentimento de culpa constitui um legítimo objeto de investigações e intervenções no vasto campo temático da Psicologia e das ciências que tratam do Homem.
Não raras vezes percebemos nossa consciência inquietada por tal sentimento, sobretudo quando nos arrependemos por algum erro que cometemos ou quando deixamos de fazer algo que julgávamos pertinente ou necessário. São muitas e variadas as conseqüências da culpa em nossa vida, alcançando dimensões emocionais, psicológicas, comportamentais e morais do indivíduo.
O que temos procurado investigar, tanto na literatura espírita quanto em nossa atuação profissional refere-se particularmente ao sentimento de culpa inconsciente, a se traduzir em nossa vida por problemas de variadas ordens. Neste particular a Psicologia encontra-se limitada, pelo fato de buscar as raízes de tal sentimento nas experiências biográficas do indivíduo, dentro de uma perspectiva materialista.
A doutrina espírita e as abordagens psicológicas transpessoais oferecem um horizonte teórico e experiencial muito mais amplo por considerarem a dimensão espiritual (entenda-se aqui vida passada) na determinação da gênese de patologias atuais associadas à culpa que remonta às experiências anteriores do Ser. Estas as considerações iniciais que julgamos adequadas para suscitar nosso diálogo. (t)
Perguntas/Respostas:
<[moderador]> [1] – <jaja> Aprendemos com a Doutrina Espírita que a Lei de Deus está escrita na consciência. Quando nos pegamos com um sentimento de culpa, significa dizer, necessariamente, que é a nossa consciência que está sinalizando uma infração, cometida por nós, à Lei de Deus?
<Henrique_Fernandes> De certo modo podemos dizer que sim. Recordemos o que disseram os Espíritos a Kardec quando dos estudos referentes às leis morais: a lei divina traça para o homem o limite do necessário. Quando o homem ultrapassa essas marcas limítrofes, geralmente sofre. Deste modo, podemos dizer que já temos dentro de nós este sinal de alerta que é a nossa consciência, conforme propõe a questão 621 de “O Livro dos Espíritos”. (t)
<[moderador]> [2] – <_Alves_na_palestra> Boa noite, amigo Henrique! Seja muito bem-vindo ao #Espiritismo. Existe, atualmente, uma propagação nos meios espíritas do termo karma como se ele fosse doutrinário. Muitos falam em “aceitar a dor” como correção. Pergunto: Deus castiga ou educa? É preciso sofrer para aprender?
<Henrique_Fernandes> O sofrimento é acidente de percurso. Não é condição sine qua non para nosso progresso. Até porque muitos sofrem com revolta e rebeldia. O sofrimento é construído por nós mesmo, e resulta de ações equivocadas por nós cometidas. Deste modo representa, a dor, um convite ao retorno ao equilíbrio. Antes de ser uma punição, é uma forma de despertamos a consciência profunda para outras realidades. Não vejo o termo karma como sendo doutrinário, apesar de até podermos utilizá-lo, como vemos em muitas obras doutrinárias de confiança. Rigorosamente, Kardec não empregava o termo. Preferimos falar em termos de lei do retorno etc. (t).
<[moderador]> [3] – <cfeitosa> A Doutrina Espírita, libertadora por natureza, nos estimula a caminhar livre de culpas e remorsos. Poderemos interpretar isso como incentivo à irresponsabilidade?
<Henrique_Fernandes> Absolutamente. Sendo a Doutrina Espírita uma doutrina eminentemente libertadora, convida-nos ao uso adequado (responsável) de nossa liberdade. Libera-nos da culpa, é verdade.
Todavia, convida-nos a atos de responsabilidade na vida. E é precisamente esta dimensão ética da doutrina espírita que coloca o homem como o responsável pela sua própria felicidade. A culpa e o remorso não são elementos que, isoladamente, nos conduzem ao progresso. Representam convites ao equilíbrio nas trilhas da evolução. O remorso e a culpa nos prendem ao passado e nos levam a viver estagnados, caso não tomemos atitudes de maturidade psicológica para dar um encaminhamento adequado a esses sentimentos. (t)
<[moderador]> [4] – <_Alves_na_palestra> A reparação de uma falta pode ser compulsória ou o arrependimento é imprescindível?
<Henrique_Fernandes> Nos quadros expiatórios estamos diante de uma reparação compulsória. Não há escolha. Isto geralmente decorre de situações onde o Espírito tornou-se recalcitrante no erro, conduzindo-se de modo indiferente às conseqüências de seus erros ou acusando injustamente os outros ou deixando antigos crimes permanecerem ocultos. Nestes casos, mais complexos, o Espírito é automaticamente levado a passar por resgates difíceis que se traduzem por mecanismos de recuperação. Exemplos: estados depressivos graves, quadros de loucura, doenças físicas etc.
A reparação virá depois, quando já estiver preparado para assumir responsabilidades na vida, aprender a perdoar e se perdoar. Não confundamos recuperação com reparação. Em muitos outros casos, menos complexos, temos a reparação que começa, necessariamente, no arrependimento. Sem arrependimento, nestes casos, não avançamos para a reparação. Estas são, por exemplo, as situações da nossa vida comum.
Quando erramos, precisamos antes de tudo aliviar nossa consciência através do arrependimento, passo para o auto perdão e para a necessária reparação da falta cometida. Indico o texto de Kardec contido em “O Céu e o Inferno”: Código penal da vida futura. (t)
<[moderador]> [5] – <cfeitosa> Sempre nos achamos isentos do processo e quando sentimos qualquer influência colocamos o espírito como cruel e bárbaro. O que pensar dessa situação?
<Henrique_Fernandes> Vejamos. Recordemos o que disse há pouco: mecanismo de recuperação é diferente de processo auto-consciente e auto-iluminativo de reparação. No primeiro caso, agem os “automatismos que a Lei impõe”, conforme expressão do Dr. Bezerra.
No outro caso (reparação), temos as ações ditadas pela consciência já trabalhada dentro do processo de evolução. (t)
<[moderador]> [6] – <cfeitosa> O mergulho interior, na tentativa de compreender a própria dor, livrando-se o indivíduo da culpa, o livra da reparação?
<Henrique_Fernandes> Não. Tomar consciência de seus erros e se libertar da culpa, não isenta o indivíduo da necessidade de reparar as suas faltas. Livrar-se do sentimento de culpa não liberta aquele que foi ferido de sua dor. Disse o Codificador: “O arrependimento suaviza os travos da expiação, abrindo pela esperança o caminho da reabilitação; só a reparação, contudo, pode anular o efeito destruindo-lhe a causa. Do contrário, o perdão seria uma graça, não uma anulação”. Acreditamos que estas considerações de Kardec sublinham a dimensão exata do processo de reparação. (t)
<[moderador]> [7] – <dindafoz> Como saber se o sentimento de arrependimento não seria o sentimento do medo, visto que toda mudança é sempre algo novo, seja em auto-descobrir-se, seja na convivência com outros, no trabalho, no lar, etc?
<Henrique_Fernandes> Acredito que aplicando dois critérios: em primeiro lugar observando o grau de inquietação da consciência. O medo perturba o campo emocional, como a culpa também. Entretanto nem sempre perturba a consciência, gerando conflitos que exigem decisões para reverter o quadro. Em segundo lugar, observando que o medo é resposta emocional básica, que nos protege, enquanto que a culpa é processo de construção ao longo do processo de evolução.
É um tema que merece mais estudos e reflexões. (t)
<[moderador]> [8] – <dindafoz> Quando o perdão é oriundo da alma, ou seja, quando o espírito perdoa de todo o coração, não receberia o espírito “culpado” as vibrações desse perdão, amenizando assim sua culpa e tranqüilizando sua consciência, mesmo que inexista contato entre ambos?
<Henrique_Fernandes> O perdão oriundo de qual alma? Daquela que ofendeu ou da que foi ferida? Acreditamos que sim, é claro. O perdão liberta, como temos aprendido. Liberta quem perdoa e, de certo modo, alivia a consciência daquele que foi o autor da agressão. entretanto, aquele que agrediu precisará realizar seu próprio movimento para que conquiste, por ele mesmo, a sua libertação consciencial. Isto quer dizer que deverá, o agressor, agir de tal modo que repare a mal feito, mesmo que tenha sido perdoado pelo que foi agredido. Que não exista o contato, conforme foi dito. Sem problemas. O resgate não se faz apenas e unicamente com AQUELE que foi agredido. Se este me perdoou, eu deverei conquistar, pela reparação com outros, a necessária aprendizagem no campo da evolução. (t)
<[moderador]> [9] – <_Alves_na_palestra> Como fazer para nos livrar do sentimento de culpa, que pode, invariavelmente, acabar em depressão, tão comum em nossos dias?
<Henrique_Fernandes> Esta é uma questão prática e que nos interessa a todos. Fazendo uma auto-análise no nosso próprio comportamento e das motivações que nos levaram a agir daquele modo. A recomendação de Santo Agostinho (LE, p. 919) aqui se aplica. DEspirmo-nos das lamentações, dos processos psicológicos de transferência da culpa, da autocomiseração, das condutas autopunitivas e assumirmos a responsabilidade pelos nossos próprios atos. Em seguida é precisa que nos perdoemos. O perdão luariza nossa consciência, predispondo-nos à reparação necessária.
Em resumo: profunda auto-análise, um estudo de nós mesmos desenvolver um pouco nossa maturidade psicológica e emocional perdoarmo-nos perdoar o outro se for preciso e a reparação. (t)
<[moderador]> [10] – <cfeitosa> Quando cometemos um erro contra um irmão e infringimos a Lei de nosso Pai, que é de Amor, como podemos fazer nossa reparação?
<Henrique_Fernandes> Chamo nossa atenção para o que disse o Codificador em O Céu e o Inferno”: “A reparação consiste em fazer o bem àqueles a quem se havia feito o mal. (…) fazendo-se o que se deveria fazer e foi descurado; cumprindo os deveres desprezados, as missões não preenchidas; praticando o bem em compensação ao mal praticado, isto é, tornando-se humilde se tem sido orgulhoso, amável se foi austero, caridoso se tem sido egoísta, benigno se se tem sido perverso, laborioso se tem sido ocioso, útil se tem sido inútil, frugal se tem sido intemperante, trocando em suma por bons os maus exemplos perpetrados. E desse modo progride o Espírito, aproveitando-se do próprio passado”.
Acho que são dispensados comentários de nossa parte. (t).
<[moderador]> [11] – <Dejavu> As neuroses têm origem no sentimento de culpa subconsciente?
<Henrique_Fernandes> É precisamente um dos assuntos que temos pesquisado na clínica psicológica e nos estudos espíritas. Temos constatado que sim. Muitas neuroses encontram sua origem no sentimento de culpa, geralmente inconsciente. Um exemplo para ilustrar: o medo exagerado que temos de ferir alguém, de assumir responsabilidades, posições de comando etc, podem estar associadas a condutas equivocadas do passado, onde procedemos de modo irresponsável, leviano, inconseqüente quando tínhamos poder de liderança e comando e abusamos desses recursos. Apenas algumas situações dentro muitas outras. A depressão, por exemplo, pode estar vinculada à culpa que trazemos do passado quando nossos personagens arrogantes, dominadores e insubmissos agiram de modo irresponsável e abusivo. Crimes também podem ser observados na conduta pretéritos. A depressão de hoje funcionaria como um mecanismo de resgate, que, aliás, é falso. Por trás do quadro depressivo pode se encontrar, hoje, um Ser revoltado por não ter as mesmas condições de vida de poder de outrora. Ou pode a depressão estar regida por uma crença inconsciente que lhe diz:
“Eu não mereço ser feliz”, “Eu não nasci para ser amado” etc. Aqui se manifesta um comportamento autopunitivo de difícil tratamento muitas vezes. A culpa o está punindo, não o libertando. Está acomodado na queixa e na lamentação (pela culpa). Mais amadurecido psicologicamente avançaria pelo caminho do autoperdão e poderia abrir mais o coração para a vida. Nas patologias depressivas, temos muito ódio guardado no coração. (t)
<[moderador]> [12] – <Dejavu> Como eliminar os efeitos nocivos do sentimento de culpa do psiquismo humano?
<Henrique_Fernandes> Seguindo aqueles passos já referidos. Caberia destacar aqui o valor do trabalho de solidariedade. Os gestos de doação, a atitude de construção de relações humanas mais saudáveis, especialmente no contexto das realizações nobilitantes do caráter. (t)
<[moderador]> [13] – <Dejavu> Em algumas obras espíritas, vemos relatos de Espíritos que são resgatados pelas equipes socorristas em estado de hipnose ou monoideísmo, isto é, sem condições ainda de manifestarem um sentimento de arrependimento. Por que alguns penam durante mais tempo do que outros, antes de manifestar arrependimento?
<Henrique_Fernandes> Parece-me que isto dependerá do grau da falta cometida e, portanto, das repercussões psíquicas do ato abusivo sobre a mente do agente. Dependerá também da soma dos valores morais, ainda que embotados, conquistados por cada um, o que poderá fazer com que demore mais para uns do que para outros o tempo de alienação. (t)
<[moderador]> [14] – <Velho_Bahia> Como se manifesta a Lei de Misericórdia nos casos de arrependimento dos erros cometidos e da necessidade de reparação? O espírito arrependido tem flexibilidade em seus resgates?
<Henrique_Fernandes> Vejamos como os Espíritos tratam do assunto através da questão de número 637. “As circunstâncias dão relativa gravidade ao bem e ao mal. Muitas vezes, comete o homem faltas, que, nem por serem conseqüência da posição em que a sociedade o colocou, se tornam menos repreensíveis. Mas, a sua responsabilidade é proporcionada aos meios de que ele dispõe para compreender o bem e o mal. Assim, mais culpado é, aos olhos de Deus, o homem instruído que pratica uma simples injustiça, do que o selvagem ignorante que se entrega aos seus instintos”.
Como se vê, existe sempre a “flexibilidade” na Justiça Divina. A gravidade é função do ato de compreensão. Quem sabe mais, tem mais responsabilidade pelos erros cometidos. (t)
Considerações finais do palestrante:
<Henrique_Fernandes> A culpa tem um aspecto curioso, que é fruto da nossa imaturidade psicológica: dá-nos a ilusão de que estamos “pagando” pelos erros cometidos ao mesmo tempo em que não fazemos nada pela real reparação, a qual nos proporcionaria, verdadeiramente, um estado de maior equilíbrio na vida.
Neste particular, destaca-se o valor terapêutico do perdão em nosso processo de evolução da consciência. A culpa nos fixa em quadros de aflição e desespero, acalentados pela falsa resignação diante do sofrimento.
A culpa que gera os problemas citados também fala da nossa revolta silenciosa. Somente as atitudes de maturidade promovem nosso crescimento interior, pelo desafio do autoconhecimento.
A Doutrina Espírita e as modernas abordagens transpessoais contribuem significativamente para a compreensão de todo esse processo do viver, revelando a anterioridade do Ser, onde estão as matrizes do seu desequilíbrio atual.
Percebendo-se como o sujeito de suas próprias ações, entende a necessidade de uma mudança profunda nos seus padrões, liberando-se da culpa para aprender a viver com mais responsabilidade. E isto gera muita alegria!
Recordemo-nos de Jesus nos momentos de maior dificuldade, sobretudo o paradigmático encontro dele com o cobrador de impostos chamado Zaqueu. Zaqueu é o exemplo do homem que se arrepende porque estava sofrendo a inquietação da consciência. Resolve dividir seus bens pagando muito mais àqueles de quem retirara muito dinheiro. Esta foi sua reparação. Sem culpa, mas com arrependimento.
Há muitos outros exemplos nos ensinamentos de Jesus. E para encerrar: lembremo-nos de Kardec em código penal da vida futura:
“o arrependimento, conquanto seja o primeiro passo para a regeneração, não basta por si só; são precisas a expiação e a reparação. (…) Arrependimento, expiação e reparação constituem, portanto, as três condições necessárias para apagar os traços de uma falta e suas conseqüências”.
Para os que desejarem trocar idéias sobre o assunto, entrem em contato comigo pelo e-mail ou em nosso site. Muita paz para todos. E obrigado por esta oportunidade. henrique.of@uol.com.br.
www.ibrapetvp.com.br. (t)
Oração Final:
<Dejavu> Boa noite, amigos! Vamos agradecer ao Pai Celestial pelo dia de hoje, onde tivemos nossas oportunidades de crescimento, e em especial pelo estudo dessa noite, onde o companheiro Henrique foi instrumento que nos proporcionou muitas reflexões valiosas. Pedimos que nos dê força e proteção, ó Pai, para vencermos nosso maior inimigo: nossas fraquezas morais. Abençoa-nos agora e sempre! Assim seja! Que assim seja! (t)