Existem muitas opções de estrutura?
A estrutura linear é, sem dúvida, a mais utilizada por ser a mais ensinada nas escolas. Nela ficam bem caracterizadas as partes do ensaio, principalmente a conclusão. Mas não é o único tipo de estrutura que podemos usar. Em determinados casos, ela não é a mais adequada, podendo ser substituída por outras mais apropriadas ao desenvolvimento de um tema — como a estrutura cíclica ou a cíclico-linear. Além dessas estruturas básicas, existem outras, como a linear paralela, a jornalística e a de colagem, que podem ser usadas em algumas situações especiais. Essas são estruturas variantes das básicas e confirmam que o ensaio não é uma forma tão rígida como parece à primeira vista.
1. A estrutura linear
Caracteriza-se por definir uma seqüência de raciocínio. Nela, os argumentos vão progressivamente se somando em direção à conclusão.
Na estrutura linear as idéias têm peso e função bem diferenciados. Cada idéia se relaciona com a anterior e também com a posterior. |
As idéias, os dados, as informações ou as inferências conduzem o leitor para a questão principal, que está sempre na conclusão.
1a. O pensamento do leitor é direcionado
No ensaio linear, o autor do texto vai induzindo o leitor a determinadas conclusões. Por ter esse caráter indutivo, a estrutura linear é a mais utilizada em textos didáticos. Quando o redator do texto usa essa estrutura, ele espera que o leitor acompanhe seu raciocínio passo a passo, e só no final entenda todo o seu significado ou onde se quer chegar.
1b. Como identificar o texto linear
Nesse tipo de texto, as idéias são identificadas com clareza. Podem ser introdutórias, de desenvolvimento ou conclusivas. A conclusão é formada por uma ou mais idéias resultantes de uma argumentação que veio sendo construída desde a introdução.
O objetivo é que o interesse do leitor cresça a cada passo. Por essa razão, o trabalho nunca será satisfatório se a sua conclusão for redundante ou repetitiva. |
No gráfico, a seqüência de idéias está colocada em uma linha reta. Daí o nome “linear” |
Uma conclusão que repete idéias do desenvolvimento, por exemplo, desestimula o leitor e contraria o princípio da estrutura linear, pois não acrescenta nada de novo no final. Se imaginarmos a seqüência de idéias na estrutura linear e a colocarmos em um esquema, poderemos representá-la como no gráfico:
1c. Como um problema matemático
Podemos comparar o texto linear com um problema de Matemática. O enunciado do problema seria a introdução; as operações e os cálculos, o desenvolvimento; e a resposta ou o resultado, a conclusão.
Para lembrar:
Na resolução do texto, a idéia principal está sempre no final. Ao ler um texto linear, temos exatamente essa expectativa. |
O leitor percebe que o principal está no final e vai lendo com um interesse crescente, ou, ao menos, lê as informações e as idéias novas que se sucedem até chegar ao ápice, que é a conclusão.
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A redação de aluno acima desenvolve o tema “Ninguém gosta da poluição. Por que não se acaba com ela?” utilizando a estrutura linear |
1d. A estrutura mais usada
A estrutura linear é a mais usada porque é a que reflete o próprio processo de acúmulo do conhecimento. Ou o modo como costumamos apreender as coisas.
Essa forma de raciocínio está muito presente em nossa cabeça, principalmente se freqüentamos a escola. |
A maior parte das disciplinas escolares, sobretudo na área de Ciências, distribui os conteúdos linearmente a cada aula com o propósito de facilitar a aprendizagem. Nesse caso, também se pretende que o aluno tenha a sensação de começo, meio e fim.
2. Estrutura cíclica
O que caracteriza essa estrutura é a coincidência entre a introdução e a conclusão. O texto cíclico começa pela conclusão e as mesmas idéias são sintetizadas ao final. Embora seja menos comum, na prática podemos encontrar muitos textos que se organizam ciclicamente. Por isso, não deixe de utilizá-la quando achar que é a melhor opção para o seu texto.
Para lembrar:
É preciso saber com certeza quando é melhor utilizar a estrutura cíclica. Para isso, é bom ter muito claro desde o início da redação como deve ser a conclusão, ou qual a síntese que ela deve fazer. Com a conclusão definida, a questão passa a ser a de adequar a estrutura ao objetivo do texto e também ao leitor a que ele se destina. |
A mesma redação de aluno (mostrada abaixo) é trabalhada na estrutura cíclica. Abre com a síntese e termina repetindo idéias semelhantes no último parágrafo ou conclusão | ||||
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2a. Um caminho que volta
Podemos decidir que, em determinados casos, a melhor maneira de fazer com que o leitor se interesse pelo texto seja apresentar, logo no início, a conclusão. É a forma de provocarmos curiosidade. É como se antes de resolvermos um problema matemático, apresentássemos o resultado final.
O texto cíclico começa pela conclusão. Essa é a característica básica dessa estrutura. Mas, para ser utilizada de forma satisfatória, é essencial que se tenha bom domínio do conteúdo e da estrutura de suas idéias. Só assim o redator poderá trabalhar livremente com seus argumentos. |
2b. Pensamentos linear e cíclico
Redigir cíclica ou linearmente pode ser uma questão de simples aptidão pessoal. É como se houvesse “pessoas cíclicas” e “pessoas lineares”.
Isso significa que alguns privilegiam o raciocínio indutivo, outros preferem o raciocínio dedutivo, e outros ainda usam com desenvoltura os dois raciocínios. |
As “pessoas cíclicas”, em geral, são mais intuitivas e conseguem antecipar com facilidade as conclusões. Mas essa é uma característica que depende de cada um. Há pessoas, por exemplo, que conseguem escrever tanto o texto indutivo quanto o dedutivo com a mesma facilidade.
Não há nada de errado em termos maior ou menor facilidade para uma determinada estrutura ou tipo de texto. Erro é considerar que nossa mente só pode funcionar de um único jeito. É possível que muita gente nunca tenha experimentado a estrutura cíclica simplesmente pelo fato de ela ser pouco conhecida e não ter sido ensinada na escola até agora. Mas, para desenvolver essa estrutura instigante, a única coisa de que precisamos é a prática.
2c. Resultado de impacto
Em geral, utilizamos a estrutura cíclica em textos polêmicos ou quando desejamos surpreender. O impacto acontece já no início do texto, ao serem dadas ao leitor as idéias mais importantes sobre o assunto discutido. Por essa razão, tal estrutura é muito usada em discursos políticos e nas falas dos advogados. Imagine, por exemplo, o impacto que um advogado causaria em uma sessão de júri caso chegasse para defender um acusado de assassinato e, em sua primeira intervenção, dissesse: “O réu é inocente!” Essa surpresa é o que se pretende com o uso da estrutura cíclica.
2d. Quando é melhor usar a estrutura cíclica
Na estrutura cíclica, a introdução e a conclusão coincidem |
É bom usá-la se desejamos garantir o interesse do leitor desde o início do texto. É, em certa medida, o caso dos relatórios ou dos textos jornalísticos. Esse tipo de estrutura garante que a introdução seja uma entrada no assunto, sem rodeios. Para isso, não há maneira mais eficiente do que começar pela conclusão.
O gráfico ao lado ilustra a estrutura cíclica:
2e. Como um teorema
Podemos comparar a estrutura cíclica do texto com um teorema de Matemática, que tem estrutura igual. Nesse caso, a introdução equivale à hipótese e a conclusão equivale à tese. Já o desenvolvimento é a demonstração.
3. A estrutura cíclico-linear
As várias estruturas do texto resultam da busca pela objetividade e, ao mesmo tempo, do esforço para interessar o leitor. A estrutura cíclico-linear é um bom exemplo desse esforço. Ela também tem a preocupação de manter o leitor o tempo todo atento ao processo de raciocínio que o autor do texto desenvolve ao redigir.
3a. A idéia que se repete
A estrutura cíclico-linear usa o processo progressivo, ou indutivo, de argumentação da estrutura linear, e utiliza a estratégia de repetição, da estrutura cíclica. O leitor desse tipo de texto é levado a usar os dois processos de raciocínio — indutivo e dedutivo — ao mesmo tempo.
Para lembrar:
Na estrutura cíclico-linear, a repetição se dá não apenas no começo e no fim do ensaio, mas também durante o desenvolvimento, como se fosse um refrão. E o que se repete não é necessariamente uma idéia essencial para a argumentação. |
Pelo contrário, normalmente esse refrão é uma idéia secundária, que às vezes é até dispensável. Essa idéia, geralmente sintetizada em uma frase, representa uma intervenção ritmada do autor no conteúdo do texto.
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Nesse caso, a redação sobre poluição utiliza a estrutura cíclico-linear, repetindo a intervalos um refrão ou uma idéia |
3b. Como um refrão
O que caracteriza esse tipo de texto e o diferencia da redação linear é a reiteração de uma frase no seu decorrer. Essa frase é conotativa, porque vai se enriquecendo dos significados das idéias que a antecedem. Sua função é semelhante à do refrão. E seu efeito é retórico, mexendo com o emocional ou com a sensibilidade do leitor.
É comum observarmos essa estrutura em discursos de políticos, advogados e sindicalistas, que geralmente usam essa frase repetida com sentido irônico. A frase repetida serve também para marcar uma idéia, fazendo com que o leitor ou o ouvinte não a esqueçam mais. |
A função do refrão no texto é a mesma do refrão de uma música. As pessoas nem sempre lembram da canção inteira, mas normalmente se recordam do refrão.
3c. Como posicionar a frase que se repete
É possível variar bastante a sua colocação no texto. Pode aparecer em parágrafos curtos posicionados entre parágrafos longos a intervalos regulares. Também pode ser uma frase que ocupa sempre o final dos parágrafos. Ou ainda aparecer indistintamente durante o texto. Qualquer que seja o modo, seu objetivo é o de funcionar como reforço da argumentação e ser, de fato, um refrão interessante.
Mais linear do que cíclica
Se retiramos essa frase repetida ou mudamos a sua redação, o texto volta a tornar-se simplesmente linear. Assim, comprova-se o seu efeito retórico, que é um recurso para reforçar idéias.
3d. O desenho da estrutura
A estrutura cíclico-linear também pode ser representada por um gráfico. Mas, para isso, é preciso prever o posicionamento da frase repetida. Imagine que o quadro seguinte representa um texto que tem a frase repetida em intervalos mais ou menos regulares:
A Criatividade das Estruturas | |||||
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4. A estrutura linear paralela
Caracteriza-se por desenvolver, paralelamente, duas ou mais linhas de raciocínio. É a estrutura ideal quando se quer confrontar idéias contraditórias ou desenvolver mais de um aspecto de um mesmo assunto.
É usada, por exemplo, quando um autor quer apresentar duas visões diferentes de um mesmo conteúdo e confrontá-las, para tirar suas conclusões sobre qual delas é a mais correta. |
Se esse autor for colocando, alternadamente, idéias de uma e de outra visão até chegar à conclusão, temos uma estrutura linear simples. Mas se ele coloca as posições separadamente, temos a estrutura linear paralela.
• Em princípio, o autor expõe e desenvolve uma primeira idéia ou conceito.
• Em seguida, apresenta e desenvolve a segunda idéia ou conceito.
• Por fim, chega à conclusão.
Nesse caso, a estrutura linear paralela apresenta duas introduções, dois desenvolvimentos e uma conclusão. Alguns textos estruturados dessa maneira podem explorar mais de duas linhas de raciocínio. Outros têm mais de uma conclusão. Existem outros ainda que deixam a conclusão para o leitor. Mas, em qualquer caso, são exemplos variantes da estrutura linear e podem ser reduzidos a estruturas lineares simples.
5. A estrutura jornalística
A estrutura jornalística é essencialmente diferente das demais. O texto típico de jornal não tem conclusão, é simplesmente informativo. Essa é uma forma de garantir a imparcialidade da notícia — embora isso seja quase impossível. Nesse texto, as conclusões sobre o fato relatado devem ficar a cargo do leitor. O que caracteriza o texto jornalístico informativo é o lead, que responde às seis perguntas básicas — o quê? quem? quando? onde? como? e por quê?
| Exemplo de texto noticioso direto, simples e objetivo, extraído do jornal O Estado de S.Paulo |
Para lembrar:
Apesar de ter uma função adequada aos objetivos de jornais e revistas, essa estrutura também pode ser usada em relatórios ou em textos que não são propriamente opinativos. Isso porque é uma maneira eficaz de apresentar, logo de início, o essencial do conteúdo. |
6. Semicíclica
Há ensaios que apresentam características das estruturas cíclica e linear, mas não são cíclico-lineares, com seu típico refrão. São em parte cíclicos e em parte lineares. Ou seja, têm uma estrutura semicíclica. Toda estrutura tem por função favorecer uma melhor exposição do conteúdo. No caso da semicíclica também é assim.
Essa estrutura é adequada para teses polêmicas ou para conteúdos que, por sua complexidade, necessitem de trechos explicativos. |
Na estrutura semicíclica, o autor lança sua tese, discute e conclui ciclicamente. Mas essa tese é, na verdade, somente o ponto de partida para o que o autor realmente deseja, que é desenvolver a discussão. A introdução torna-se cíclica, mas na seqüência o texto passa a ser linear e segue assim até o final.
Para lembrar:
A estrutura semicíclica não é adequada para ensaios muito curtos. |
7. A estrutura não-linear
A estrutura não-linear apresenta uma linha de raciocínio “quebrada”. O texto que a utiliza tem uma seqüência a princípio sem lógica. À primeira vista, parece que o autor salta de um trecho para outro, dando a impressão de falta de unidade. Mas isso só aparentemente. A unidade se dá em um plano mais profundo e exige uma participação ativa do leitor na recomposição da linha.
Essa estrutura revela uma postura crítica em relação à linearidade. O autor recusa-se a dar idéias “mastigadas” ao leitor, exigindo dele uma participação crítica. |
Esse é um recurso tipicamente literário, característico de muitos romancistas modernos, especialmente dos latino-americanos, como Juan Rulfo, Julio Cortázar e Osman Lins. Alguns ensaístas empregaram esse recurso em seus textos, muitas vezes usando imagens conotativas, mas sem que o texto deixasse de ser primordialmente conceitual.
| A estrutura não-linear, como a do texto ao lado, exige atenção redobrada e uma participação crítica do leitor |
8. A falsa cíclica
Caracteriza-se por ter uma introdução que, aparentemente, anuncia uma estrutura cíclica. Mas o texto é linear. A introdução é usada pelo autor para apresentar as idéias principais do texto em uma espécie de resumo.
Nessa estrutura, o autor esclarece de imediato as suas intenções com o texto, muitas vezes usando frases como “Minha intenção é (…)”; “Meus objetivos são (…)”; “Os propósitos deste texto são (…)” etc. |
As idéias principais também podem ser mostradas de forma interrogativa, logo na abertura do texto. Outro recurso do autor é apresentar algumas respostas no final da introdução, que serão discutidas mais adiante.
A introdução da falsa cíclica
É uma espécie de prefácio que se agrega ao texto para indicar ao leitor os objetivos da discussão. O texto que vem após essa introdução tem características introdutórias lineares. Por isso, se excluirmos a introdução ou o prefácio da falsa cíclica, ela se transforma em uma estrutura linear, sem prejuízos fundamentais às idéias do autor.
9. Estrutura de painel ou de colagem
Sua característica é uma colagem de textos, sendo que cada um possui certa autonomia. Essa estrutura é parecida com a não-linear. A diferença é que, neste caso, a falta de unidade é muito evidente, sem “segundas intenções”.
O autor oferece diversos textos ao leitor, em uma seqüência aparentemente arbitrária, esperando que ele os relacione. |
Às vezes, é uma montagem de trechos de textos de diversos autores, unidos por esse novo autor, que pretende provocar discussão sobre determinado conteúdo. É um recurso usado pelos professores para provocar discussões em grupo. Mesmo quando se caracteriza como um conjunto de textos alheios, há uma certa “autoria”, levando-se em conta a pesquisa, as escolhas e a montagem. O uso dessa estrutura só se justifica em situações muito especiais.
Para lembrar:
Há muitas estruturas de texto e as apresentadas aqui não esgotam todas as possibilidades. Ao escrever, fique à vontade para reconhecer as estruturas e batizá-las. Ou mesmo para criar seu texto dentro de uma estrutura nova. Só tenha cuidado para não forçar situações pretensamente criativas. Esse erro é fatal e o resultado pode cair no ridículo ou comprometer a eficiência do que se está escrevendo. Na dúvida, tenha sempre como parâmetro o bom senso e, acima de tudo, o seu leitor. |
| A partir de uma colagem de três diferentes extratos de textos de vários autores, o estudante (ou o novo autor) produz um quarto texto de estrutura linear, com o objetivo de provocar discussão sobre determinado conteúdo | |||||
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Glossário
Conotativo: relativo a conotação; sentido que se acrescenta à acepção usual de uma palavra ou expressão.
Hipótese: teoria provável, mas não demonstrada; a proposição de um teorema.
Inferência: operação lógica pela qual se tira uma conclusão de uma ou várias proposições admitidas como verdadeiras.
Paralelo: semelhante, análogo, correlato.
Refrão: na música, frase melódica que se repete a intervalos regulares; na poesia, verso ou estrofe que se repete, normalmente, a intervalos regulares; estribilho.
Reiteração: repetição, insistência, renovação.
Retórico (relativo a retórica): arte de falar ou escrever bem, com o propósito de convencer, persuadir.
Teorema: proposição científica que pode ser demonstrada.
Tese: o primeiro momento do processo dialético. Proposição formulada para ser defendida.
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