O Jurado Espírita
Marcelo Anátocles Ferreira
Há uma opinião comum no meio jurídico, entre promotores de justiça, advogados, juizes de direito e serventuários da justiça, que atuam no Tribunal do Júri, que é muito preocupante para nós espíritas. Tal opinião, que é voz comum, é que o jurado espírita sempre absolve os réus.
Inicialmente, cabe uma breve explicação sobre a função do jurado para, em seguida, apresentar a razão da preocupação.
Em nosso país, os crimes dolosos contra a vida, ou seja, os crimes em que o indivíduo emprega a sua vontade para investir contra a vida do próximo, são julgados pelo Tribunal do Júri. O Tribunal do Júri é composto por um juiz de direito que atua em conjunto com sete jurados. Os jurados são escolhidos pelo juiz de direito entre os cidadãos, selecionando-se aqueles que têm conduta digna, equilíbrio e capacidade para julgar o seu semelhante. Observemos a gravidade e a importância da função do jurado. Ele julgará seu semelhante, quando acusado de um crime doloso contra a vida. Os demais crimes, como furtos, roubos, seqüestros, tráfico de entorpecente e outros são julgados pelo juiz de direito, mas, os dolosos contra a vida, como o homicídio (assassinato), pela sua gravidade, são reservados pela Constituição do Brasil para o julgamento pelo próprio povo.
Assim, o jurado deve ter enorme equilíbrio para poder julgar dignamente o seu semelhante.
Em virtude da seriedade do movimento espírita e da nobreza da Doutrina Espírita, é comum espíritas serem convocados para a função de jurado.
Entretanto, é comum, pelo menos nos comentários do meio jurídico e até da imprensa especializada, a afirmação de que o jurado espírita sempre absolve.
Lógico que, do ponto de vista social, um jurado que sempre absolve não é um bom jurado, como não será aquele que sempre condene. O que a sociedade espera do jurado é que ele tenha equilíbrio ao julgar.
E do ponto de vista espírita, qual deverá ser a conduta do jurado, parafraseando o Benfeitor André Luiz?
No Evangelho segundo o Espiritismo, quando Allan Kardec comenta a sentença do Cristo “Não julgueis, para não serdes julgados”, ensina “Não é possível que Jesus haja proibido se profligue o mal, uma vez que ele próprio nos deu o exemplo tendo-o feito, até, em termos enérgicos” (Cap. X, 13).
André Luiz, no capítulo 31 do livro Conduta Espírita, quando estuda a conduta perante a pátria orienta: “Quando chamado a depor nos tribunais terrestres de julgamento, pautar-se em harmonia com os princípios evangélicos, compreendendo, porém, que os irmãos incursos em teor elevado de delinqüência necessitam, muitas vezes, de justa segregação para tratamento moral, quanto os enfermos graves requisitam hospitalização para o devido tratamento”.
Assim como a proposta para o espírita será sempre a do bom senso, é evidente que o espírita deverá ser o jurado equilibrado, que, durante o julgamento apreciará os argumentos da acusação e da defesa e pedindo inspiração divina através da oração, deverá tomar a melhor decisão, condenando ou absolvendo de acordo com a convicção que formar durante o julgamento.
Acreditando que a mencionada opinião é fruto de equivocadas observações, fica o alerta e o convite à reflexão, para que nós espíritas, sempre que convocados para o exercício da nobre função de jurado, ou outra de relevância social, lembremos que ali também estamos divulgando o bom nome da veneranda Doutrina dos Espíritos.
* Marcelo Anátocles Ferreira é Juiz de Direito do Rio de Janeiro, Diretor-adjunto de Cidadania e Direitos Humanos da Associação dos Magistrados Brasileiros, Diretor-adjunto de prerrogativas da Amaerj.
(Jornal Mundo Espírita de Fevereiro de 2000)