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Sermão do Monte – Bem-aventurados os Pobres de Espírito

E Jesus, vendo a multidão, subiu a um monte, e, assentando-se, aproximaram-se dele os seus discípulos e abrindo a sua boca, os ensinava, dizendo… (Mateus, 5: 1)[i]

E Jesus, vendo a multidão, subiu a um monte – Nos mínimos detalhes o Evangelho nos traz grandes ensinamentos. Narra o evangelista que Jesus, para ensinar, subiu ao monte. A expressão subir ao monte nos dá a entender, elevar a vibração, se quisermos transmitir os valores cristãos, temos que estar acima das nossas imperfeições, representadas pela multidão ali presente. A multidão se deixa levar por qualquer novidade, mesmo que seja falsa, isso devido à instabilidade de seus sentimentos calcados em valores puramente transitórios. O próprio Jesus, após ser reverenciado quando de sua entrada triunfal em Jerusalém, foi logo depois condenado por aqueles que o aplaudiram.

Kardec, ao se referir à capacidade premonitória, nos faz entender que esta possibilidade é fruto da experiência do Espírito em termos evolutivos. Explica o Codificador, que é como o elemento que estando em uma montanha consegue enxergar à frente do que caminha no plano inferior, sabendo o que acontecerá a este antes mesmo que ele passe pela situação. O Cristo nos dá todos os recursos para estarmos em cima do monte e, consequentemente, traçarmos nosso destino em bases de maior segurança.

Depreendemos ainda destes versículos, a presença de três faixas distintas em matéria de evolução, presente ali, naquele instante. A primeira representada por Jesus em cima do monte, como o Grande Doador por excelência; a segunda por seus discípulos, um pouco mais abaixo, como aqueles em que a mensagem da Boa Nova já poderia dar frutos mais imediatos; e por fim, a multidão, representando aqueles que mesmo ouvindo, ainda não conseguem assimilar e se acham bem distante da vivência. De acordo com este entendimento, podemos perguntar: e nós, onde nos situamos?

E assentando-se… – A palavra “assentando”, em alguns instantes, pode dar a ideia de comodismo, mas em se tratando de Jesus, é impossível fazer esta análise. Ele mesmo afirma: O meu Pai trabalha até agora, e eu trabalho também. Portanto, o assentando-se aqui nos mostra uma ação tranquila, segura. Nós mesmos quando nos sentimos seguros em determinado assunto, agimos com tranquilidade, com calma. A aflição é por nós externada, somente nos momentos de instabilidade, devido à falta de um piso seguro.

Aproximaram-se dele os seus discípulos… – A Doutrina dos Espíritos como instrumento a nos capacitar para reverenciarmos o Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo, oferece a oportunidade de nos tornarmos seus discípulos. Mas, para isso, é preciso nos aproximarmos do Mestre, conforme Ele mesmo nos disse, permanecendo nas Suas palavras. Portanto ao nos vermos envolvidos em uma faixa negativa, aproximemo-nos de Jesus, sejamos um com Ele, como Ele é um com o Pai.

E, abrindo a sua boca, os ensinava, dizendo – Jesus, como Guia e Modelo para a Humanidade, não podia em momento algum se fazer ocioso, os Espíritos mais evoluídos são os que mais trabalham. Ele não perdia tempo, abrindo a sua boca, os ensinava, dizendo. Sua palavra era, e continua sendo sempre consolo e ensinamento. Portadora de imenso magnetismo, curava, porque conduzia os necessitados à prática do bem, trabalhando o processo de autocura. O Cristo a agir em nossa intimidade deve nos fazer sempre dinâmicos, trabalhando sempre para o bem de todos, fazendo de nossa palavra, não um falatório, mas lição constante.

Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o reino dos céus. (Mateus, 5: 2)

Bem-aventurados… – Bem-aventurado é sinônimo de feliz. E a felicidade promovida pelo Cristo, não é a felicidade que conhecemos, fugaz, momentânea porque embasada em valores temporários. A felicidade a que se refere o Mestre é definitiva, porque é conquistada pelos valores do espírito. Seus ensinamentos são baseados na verdadeira moral, aquela que nos conduz à faixa vibratória do Criador, nos fazendo retornar para o seio amoroso do Pai.
Os pobres de espírito …- A expressão pobre de espírito é usada no mundo se referindo à pessoas sempre fracassadas. “Fulano é um pobre de espírito” indica que este não passa de uma pessoa qualquer, incapaz de realizar algo de bom.

A conotação dada por Jesus é bem diferente. A palavra pobre nos leva a pensar em necessidade. O pobre é o que verdadeiramente não tem, por isso tem necessidade, e consequentemente vai atrás, vai em busca do que lhe falta.

O pobre de espírito, a que se refere Jesus, é o que tem consciência da sua pequenez em relação à grandeza do Universo. Diante da Sabedoria Divina, reconhece que nada sabe, ou sabe muito pouco. Cônscio de seus parcos recursos espirituais, trabalha sabedor de suas necessidades e busca em tudo mais aprender, para melhor entender a vida, e dela recolher os preciosos frutos. Em outras palavras o pobre de espírito destacado pelo Meigo Rabi da Galileia é o humilde. E esta virtude é tão importante, que foi o primeiro grande ensinamento de nosso Mestre, que, como Governador Espiritual da Terra, podia encarnar como bem quisesse. E assim o fez, vindo entre nós no seio de uma família pobre, tendo como primeiro leito uma manjedoura, e, como narra o evangelista, sua mãe o envolveu em panos.[1]

Porque deles é o Reino do Céus – O conceito de céu dado pela Doutrina Espírita é bem diferente da que fora, até então dada pelas outras religiões. Céu não é uma região física, mas um estado do Espírito que se encontra harmonizado com as Leis Divinas. Esta ideia não é nova, Jesus já divulgara este pensamento, quando nos falava sobre o reino de Deus:

O reino de Deus não vem com aparência exterior; nem dirão: Ei-lo aqui! ou: Ei-lo ali! pois o reino de Deus está dentro de vós.[2]

A afirmativa de Jesus está no presente: deles é o reino dos céus. É que a humildade nos conduz sempre a este estado de espírito. Não importa onde esteja ou como esteja, o humilde está sempre bem, pois vê em tudo a manifestação do Criador gerenciando todas as manifestações. Se agredido, vê no agressor não um adversário, mas um doente que precisa ser tratado, se a situação lhe é adversa, sabe compreender e se situar de acordo com a realidade, sabedor ele, de que os bens definitivos são os do espírito e não o estado transitório das coisas. Este é o motivo por que Jesus nos afirmou ser deles o Reino dos céus. Deles, porque qualquer um que atingir este estado d’alma, se capacita a ser habitante do Reino.

Texto extraído do livro:  O Sermão do Monte, de Cláudio Fajardo


[i] André Chouraqui, grande estudioso e tradutor dos textos sagrados propõe uma tradução diversa para este texto. Ao invés de Bem-aventurados… ele propõe Em marcha… Segundo ele, bem-aventurado é fruto da tradução do original grego “Makarioi”, porém o Sermão original foi proferido em hebraico, e a palavra usada por Jesus foi ashréy, primeira palavra dos salmos 1 e 119. Ashréy (plural) tem como radical ashar, que não evoca uma vaga felicidade de essência hedonista, mas implica uma retidão (yashar) do homem marchando na estrada sem obstáculos que leva a IHWH… (A Bíblia Matyah – o Evangelho segundo Mateus, página 84). Ainda segundo este autor todos os dicionários etimológicos do hebraico bíblico dão como primeiro sentido do radical “ashar” o de marchar; ser feliz é um sentido secundário e tardio. (Idem) Depreende-se daí que a Bem-Aventurança, fruto da dinâmica da salvação, não vem antes do fim da estrada, e que é preciso caminhar com retidão dentro das propostas que serão trazidas por Jesus no decorrer do Sermão para obter a felicidade final. A nossa interpretação deste texto de Mateus levou em conta a versão tradicional da Bíblia feita por João Ferreira de Almeida, revista e corrigida, editada pela Imprensa Bíblica Brasileira; porém, entendemos que são tão grandes as lições da Grande Mensagem do Monte, que as duas interpretações são, não só possíveis, como até mesmo coerentes, pois o Evangelho mostra-nos sempre um dinamismo construtivo como base de sua mensagem de amor. Seu seguidor deste modo está sempre em marcha, sendo ao mesmo tempo bem-aventurado, pois a Lei atua sempre em favor daquele que com Ela comunga.

 

Por: Claudio Fajardo de Castro