Mozart da Cunha Leite
Rio de Janeiro – RJ
Você não pode entrar numa casa espírita e passar despercebido. Não pode ser um anônimo, um ilustre desconhecido.
A casa espírita, antes de ser um hospital que atenua nossos males e dores; antes de ser uma oficina, que ocupa seus participantes, tornando-os pessoas úteis e operantes no fazer; antes de ser uma legião de assistência, que estimula a ação no bem – o ato espontâneo e despretensioso – na relação com o outro; antes de ser uma escola de almas, ensinando a viver, transformando, fazendo profilaxia, propiciando crescimento, ensejando o autoconhecimento e a auto-estima, é, acima de qualquer coisa, um lar, onde nos expressamos de modo familiar e com respeito; um espaço de convivência em que partilhamos as horas amargas e ditosas do dia a dia, entre a consolação e a iluminação da consciência. Onde o amor de Jesus conduz, com suave serenidade e célere pacificação, a verdade de Kardec.
Por tudo isso, tenhamos a mais plena atenção para com os que adentram o portal do centro espírita, a fim de que sejam vistos, notados e recepcionados. Tudo isso de maneira discreta, mas emocionada, como se fossem pessoas de nosso bem querer. Podemos abordá-los, cumprimentá-los com um aceno ou um aperto de mão, um sorriso leve nos lábios, com simpatia e ternura. Podemos perguntar a eles se é a primeira vez que vêm à casa espírita, se trazem dúvidas, por que vieram e por intermédio de quem, se conhecem outra casa e, por meio desse prévio contato, perguntar-lhes o nome e nos apresentarmos.
Em seguida, muitas atitudes poderemos tomar: atender suas expectativas, dúvidas ou dificuldades, e encaminhá-los para esta ou aquela reunião; apresentar-lhes o programa semanal da casa; apresentar-lhes as dependências e os companheiros da casa; fornecer-lhes dados sobre a filosofia espírita e, ainda, sobre a filosofia de trabalho da casa. Podemos transmitir-lhes alegria e conforto, convidando-os a sentarem-se, e estabelecer com eles um vínculo de amizade. A iniciação nas hostes espíritas deve ser um momento significativo, marcante, caloroso, afetuoso, de profunda e capital importância, posto que encerra o avançar dos umbrais da felicidade. Dizia Antoine de Saint’Exupery: “Você se torna eternamente responsável por aquilo que você cativa”. Desse momento em diante, esses novos amigos devem ser acolhidos, acompanhados, estimulados e orientados sempre que possível, até que eles se firmem, se informem, desenvolvam outros vínculos, conheçam outros companheiros, abracem uma tarefa, até integrarem-se em definitivo na grande família espírita, que é o movimento espírita.
Cada companheiro que cativamos na recepção de entrada do centro é alguém que sempre divulgará uma imagem de excelência da Doutrina Espírita. Por isso, é de extrema relevância amparar, consolar, conviver, se emocionar, enternecer-se, ouvir com o fundo d’alma, olhar, perceber e se ater a cada pessoa.
O relacionamento e o atendimento fraternos, bem como a comunicação social espírita, começam na primeira vez que alguém chega à casa espírita. Devemos investir todos os nossos talentos no companheiro iniciante. Devemos, inclusive, encaminhá-lo às reuniões públicas, já que a Doutrina Espírita tem por base o amor. Devemos transmitir a Doutrina Espírita com esse amor, percebendo os interesses desse companheiro, suas possibilidades, sua história de vida, sua compreensão anterior, o seu desconhecimento do Espiritismo, entendendo as deturpações e deformações que sofre pelo leigo.
Quem deverá recepcionar, atender fraternalmente, comunicar-se, encaminhar, iniciar e acompanhar cada companheiro iniciante? Todos os tarefeiros integrados na casa e imbuídos da filosofia de trabalho. Devem ser conscientizados desses passos, e por eles sensibilizados, motivados e trabalhados em seus sentimentos para cumprir, com qualidade, essa magna tarefa. Devemos nos lembrar, também, que o companheiro mais antigo, vez por outra, traz uma dúvida ou uma dor. Não podemos dar as costas para o companheiro que trabalha na casa, e esquecê-lo; também ele merece nossa atenção, e dela precisa. Se a Doutrina é de amor, o amor é de todos para todos. Queremos encerrar firmando a baliza de Kardec: “trabalho, solidariedade e tolerância”. Trabalhar com senso de compromisso, comprometidos com a casa como um todo, com a filosofia espírita que deve engendrar a filosofia da casa. Devemos ser solidários nas possibilidades e nas dificuldades, usando a sensibilidade, a percepção, o bom senso, estabelecendo uma relação de ajuda com os companheiros, sem rótulos, sem preconceitos, sem hierarquias, onde um é o ajudante e o outro o ajudado. Sejamos tolerantes nas diferenças e nas semelhanças, fazendo cumprir os ditames doutrinários de amor e instrução, entendendo que a melhor disciplina é a da consciência, de dentro para fora, e não inversamente, e o melhor regulamento é um contrato feito com todos os interessados, e que não deve ser vestido com camisa de força, mas com flexibilidade, atendendo ao contexto da situação, das pessoas, da atualidade, do entendimento evangélico. Receber bem não é agradar, simplesmente; é servir, de coração e mente, irmanados no propósito do bem.
*O autor é Presidente do 17o CRE/USEERJ
(Publicado no Dirigente Espírita no 64 de março/abril de 2001)