Pesquisas mostram: Os animais amam, respeitam, ajudam-se e até vão ao sacrifício da morte para defender a prole
“Buffon – escreve Delanne – adverte-nos que as aves representam tudo quanto se
passa num lar honesto. Observam a castidade conjugal, cuidam dos filhos; o macho
é o marido, o pai da família, e o casal, por débil que seja, mostra-se valoroso
até ao sacrifício de morte, em se tratando de defender a prole.
Não há quem ignore o zelo da galinha na defesa dos pintainhos. Os animais ferozes:
– o tigre, lobo, gato selvagem, todos têm por suas crias o mais terno afeto. Darwin,
Brahm, Lauret, citam exemplos capazes de varrer dúvidas a respeito.
Lauret conta que um macaco, cuja fêmea lhe morrera, cuidava solícito do filhote,
pobre rebento esquálido, enfermiço. À noite, tomava-o ao colo para adormecê-lo,
e, durante o dia, não o perdia de vista um instante. De resto, entre os macacos,
os órfãos são sempre recolhidos e adotados com carinho, tanto pelos machos como
pelas fêmeas.
Uma bugia (cinocéfalo), notável por sua bondade, recolhia gatos pequenos, que
lhe faziam companhia. certa feita, um gatinho adotado arranhou-a e ela, admirada,
deu prova de inteligência examinando-lhe as patas, e, logo, com os dentes, aparou-lhe
as garras.
Amor ao próximo
O Sr. Ball – continua Delanne – relatou na Revue Scientifique o seguinte fato,
por ele testemunhado:
O cão fila aventurava-se dentro do lago congelado, quando, súbito, se quebrou
o gelo e ele resvalou na água, tentando em vão libertar-se. Perto, flutuava um ramo
e o fila se lhe agarrou, na esperança de poder alçar-se. Um terra-nova que, distante,
assistira o acidente, decidiu-se, rápido, a prestar socorro. Meteu-se pelo gelo,
caminhando com grande precaução, e não se aproximou da fenda mais que o suficiente
para agarrar com os dentes a extremidade do ramo e puxar a si o companheiro, dessarte
lhe salvando a vida.
“A previdência, a prudência e o cálculo mostram-se, diz o Sr. Ball, de um modo
evidente neste ato, tanto mais notável, quanto absolutamente espontâneo. Os animais,
são comumente, suscetíveis de educação, e sua inteligência desenvolve- se em convívio
com o homem. Mais interessante, porém, é acompanhá-los em sua evolução individual,
e constatar que são capazes, por assim dizer, de evolver a si mesmo. Neste particular,
o nosso terra-nova elevou-se, por instantes, ao nível da inteligência humana, e,
no tocante à observação e ao raciocínio, em nada inferior ao que um homem faria
em tais circunstâncias”.
Comenta Darwin que o capitão Stransbury encontrou num lago salino de Utah um
velho pelicano completamente cego e aliás muito gordo, que devia o seu bem-estar,
de longa data, ao tratamento e assistência dos companheiros. O Sr. Blyt me informa
– diz ele – ter visto corvos indígenas alimentando dois ou três companheiros cegos,
e eu mesmo conheço caso análogo, com um gato doméstico.
Sr. Burton cita o caso curioso de um papagaio que tomara a seu cargo uma ave
de outra espécie, raquítica e estropiada. Assim é que lhe limpava a plumagem e procurava
defendê-la de outros papagaios, soltos no jardim.
Mas, o fato mais demonstrativo é o seguinte, contado por Gratiolet: “O Sr. de
la Boussanelle, capitão de cavalaria do antigo regimento de Beauvilliers, comunica
o seguinte: – Em 1757, um cavalo do meu esquadrão, já fora do serviço devido à idade,
teve os dentes inutilizados a ponto de não poder mastigar o seu feno e a sua aveia.
Verificou-se, então, que dois outros animais, que lhe ficavam à esquerda e à direita,
dele, passaram a cuidar, retirando o feno da manjedoura e colocando- lhe à frente,
depois de mastigado. O mesmo faziam com a aveia, depois de bem triturada. Esse curioso
trabalho prolongouse por dois meses, e mais duraria, se lá ficasse o velho companheiro.
Aí têm – acrescenta o narrador – o testemunho de toda uma companhia – oficiais e
soldados.”
Tudo que ficou aí dito são testemunhos insuspeitáveis de pesquisadores espiritualistas.
E o que dizem pesquisadores materialistas? É sempre bom a gente dar uma comparada
entre os estudos daqueles e destes.
Pois bem, encontrei na FOLHA CIÊNCIA, – caderno do jornal Folha de S. Paulo -,
página 10, de 29 de setembro o artigo Evolução Suricata, mamífero africano, ajuda
a alimentar prole alheia; comportamento que aumenta chance de sobrevivência “Solidariedade
animal também dá lucro, do jornalista Salvador Nogueira. Ei-lo:
“Solidariedade pode não ser uma questão moral, mas meramente um mecanismo criado
pela seleção natural. Essa visão pouco romântica do que seria um dos mais nobres
traços de comportamento voltou à pauta na semana passada, com um estudo de animais
feito na África do Sul.
Um grupo de cientistas das universidades de Cambridge, no reino Unido, e de Stellenbosch,
na África do Sul, passou vários anos investigando o comportamento de suricatas (Suricata
suricata). Eles descobriram não só que esses bichos apresentam um comportamento
solidário para alimentar os filhotes da comunidade, que se beneficiam da generosidade
de suas “babás” (seria uma creche?), como também que essa atividade supostamente
altruística oferece vantagens aos que a realizam.
Os suricatas, tornados populares pelo personagem Timão do desenho animado da
Disney “O Rei Leão”, são animais sociais, ou seja, vivem em bandos. Os grupos chegam
a ter 30 integrantes. Em geral, compõem-se de um macho e de uma fêmea dominantes,
que são os pais de cerca de 80% de toda a prole da comunidade, mais os filhotes
e alguns agregados – chamados de ajudantes (em inglês, “Helpers”).
Esses membros da comunidade passam as primeiras 10 a 12 semanas de vida dos recémnascidos
ajudando-os na sua alimentação. Algumas vezes, os ajudantes guardam parentesco com
os filhotes; em outras não.
“Já mostramos que não há associação forte entre quão aparentados são os ajudantes
dos filhotes e quanto trabalho eles fazem”, disse à Folha Timothy Clutton-Brock,
o líder da equipe.
A conclusão não apóia a idéia de que o comportamento altruísta seja uma tentativa
de promover a propagação de genes para as futuras gerações – já que os suricatas
observados não fazem distinção entre filhotes com que tenham parentesco, e portanto
genes em comum, e filhotes não-relacionados.
Bondade lucrativa
Outra conclusão do estudo, cujos resultados saíram na edição de 28 de outubro
da revista “Sience” é a de que não só os filhotes se beneficiem da generosidade
dos ajudantes, mas que os próprios benfeitores se saem melhor com isso. Ou seja,
dá lucro ser bonzinho.
Primeiro, eles aprimoram sua habilidade para coletar alimentos (os suricatas
se alimentam de insetos, pequenos vertebrados e ovos) ao ajudar os filhotes.
Segundo, ajudar os filhotes a sobreviver significa aumentar o tamanho do grupo.
Quanto maior o número de indivíduos, maior é a chance de detectar predadores em
tempo para a fuga. “A sobrevivência e o sucesso reprodutivo de todos declina rapidamente
quando o tamanho do grupo diminiu”, diz Clutton Brock.
O cientista também não descarta a possibilidade de outras vantagens não observadas.
“O que é preciso agora são testes de diferentes idéias sobre os benefícios para
os ajudantes”, afirma.
Solidariedade animal
Ao que tudo indica, a generosidade para com a prole alheia não é exclusividade
de suricatas e humanos. Os pesquisadores já estão buscando resultados similares
em outras espécies. “Estamos também trabalhando com outras fuinhas (pequenos animais
carnívoros da Europa e da Ásia) e esperamos colaborar com pessoas que estudam toupeiras.
Outros membros do meu grupo de pesquisa também trabalham com pássaros cooperativos”,
diz.
Esses trabalhos, entretanto, demandarão muito tempo para serem concluídos. As
observações de Clutton Brock já duram oito anos. “Leva um ano apenas para acostumar
um grupo com a observação próxima”. – disse o pesquisador.
(Publicado no Correio Fraterno do ABC Nº 370 de Novembro de 2001)