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A Didaxis do Natal

A Didaxis do Natal

Os grandes mestres já trazem a vocação de ensinar ao nascer. E por isso
costumam ensinar desde cedo. Jesus, ainda menino, quando os outros estão
aprendendo, ensinava aos doutores do Templo em Jerusalém. Fatos semelhantes
ocorreram com muitas criaturas geniais em todo mundo. Mas não há registro
positivo de alguém que fizesse de toda a sua vida, desde o ato de nascer até a
morte, uma didaxis contínua, uma lição incessante. Este é um dos fatos que
destacam o Mestre Supremo entre todos os mestres, que caracterizam o Gênio dos
gênios.

Gautama Buda era príncipe e nasceu num palácio. Viveu nos esplendores da
corte até descobrir as dores do mundo. Mas Jesus escolher para berço a
manjedoura. Nasceu na pobreza e na humildade. E assim viveu, para depois morrer
na ignonímia. Aquele que devia salvar o mundo e redimir os homens fez-se o menor
e o mais desprezado de todos. Seu nascimento foi a primeira lição que ele dava
aos orgulhosos e poderosos da Terra. Depois ensinaria que não se necessita de
títulos, de posições, de riqueza e de poder temporal para remover o mundo da
órbita da ignorância. E por fim nos deu duas espantosas lições finais: a morte
na cruz e o túmulo vazio, mostrando-nos que a injustiça eleva o justo e que a
morte desaparece à luz da ressurreição.

Mas o didaxis do Natal tem a sua simbologia. Foi a sua primeira parábola, não
falada, mas vivida. O fato de Maria dar à luz em um estábulo não era estranho na
Judéia do tempo. Os estábulos eram dependências da casa que podiam também servir
às criaturas humanas, particularmente no inverno, quando o calor dos animais
domésticos ajudava a aquecer o ambiente. Os estábulos de inverno eram geralmente
montados em uma gruta, para que os animais ficassem mais defendidos nas noites
gélidas. Os rigores do inverno obrigavam os homens a se fraternizarem com seus
irmãos e servidores mais humildes, os animais domésticos.

Nascendo assim em um estábulo Jesus não incidia em nenhuma excentricidade,
mas dentro dos próprios costumes do povo, como faria em toda a sua vida,
transmitiria aos homens a mais bela parábola. A criança entre as palhas da
manjedoura era como a mônada celeste lançada no seio da matéria. Os animais que
a cercavam ajudavam Maria a dar-lhe o calor do sangue e da carne. A centelha
celeste era assim envolvida na ganga da encarnação terrestre, com os instintos
animais da carne a prendê-la ao chão do mundo, mas com a ternura espiritual de
Maria a fortalecê-la para a vitória do espírito.

A visita dos Magos, relatada por Mateus, mostra-nos a sabedoria terrena
curvando-se, reverente ante o saber celeste e prestando-lhe a sua homenagem.

A fúria de Herodes o grande e de Jerusalém com ele revela-nos a hostilidade
ciumenta dos grandes da Terra contra os verdadeiros emissários do Alto. A
convocação dos principais sacerdotes e dos escribas do povo pelo rei alarmado é
o incitamento dos poderes humanos contra os poderes divinos.

Temos assim na didaxis do Natal, a primeira prova da legitimidade da missão
de Jesus. Quando o Buda nasceu os jardins do palácio rebentaram em flores e
perfume. Mas quando Jesus nasceu os anjos cantaram na fímbria do horizonte e os
pastores se ajoelharam nos campos nevados, trêmulos de emoção, sem sentirem o
frio do inverno. Não queremos desmerecer a grandeza espiritual do Buda e de
outros grandes missionários espirituais, mas a didaxis do Natal nos lembra que o
Messias judeu era realmente o Mestre dos Mestres, o professor por excelência.

O Espiritismo encara os Evangelhos na sua realidade histórica, como textos
inspirados mas de redação humana, sujeitos às influências culturais da época e
do meio em que foram redigidos e também às condições pessoais de cada
evangelista. Mas reconhece a legitimidade dos seus ensinos espirituais e morais
e tem o mais profundo respeito pelo sentido alegórico de episódios como o do
Natal. Por isso o Natal espírita não se reveste de formalidades exteriores, mas
não deixa de considerar o sentido espiritual do grande evento cristão.

Extraído do livro “O Infinito e o Finito”.