Homossexualismo é Pecado?
Ultimamente, temos recebido muitos e-mails, solicitando-nos esclarecimento
acerca de como o Espiritismo encara as questões do homossexualismo e do pecado.
Um deles, em especial, despertou a atenção, porque o amigo remetente,
referindo-se à sua atração física por indivíduos do mesmo sexo, faz-nos as
seguintes indagações:
“É pecado ser homossexual?”; “Por que sou isso?”; “Que pecado cometi para
sê-lo?”; “Até quando serei assim?”; “Se olhar para um rapaz, com carinho,
estarei pecando?”; “Se eu gostar de um rapaz, com amor verdadeiro, serei
pecador?”.
Na missiva eletrônica, ele acrescenta ter sido interno de um seminário, tempo
em que andava sob forte depressão. E que teria abandonado a escola eclesiástica.
Dir-se-ia, pelas suas palavras sinceras e humildade, que o amigo foi um
seminarista bom, mas não muito bom seminarista, porquanto não se fez clérigo nem
sacerdote, e agora tornou-se espírita. Coisas do existir…
Diz-se que o pecado é a transgressão de preceito religioso (leia-se, dogma).
Sendo aquele que o pratica, pecador e ou pecante. O pecador, tem certos defeitos
ou vícios; e o pecante, é aquele que peca habitualmente ou que tem baldas
(manias). Podendo, um e outro, pelo arrependimento e confissão de sua culpa, e
através do ritual da penitência (sacrifícios), conseguir a remissão dos pecados
e a comutação da pena eterna. A julgar por esse catecismo, pelo procedimento das
pessoas atualmente, muitas penitências serão necessárias para a transformação
moral da Humanidade.
Ainda, segundo a “interessante” cartilha cristã, há pecados para todos os
gostos, conquanto haja punições ao gosto de todos os confessores e procuradores
divinos.
Há os pecados veniais, considerados leves, perdoados sem a necessidade da
Santa Comunhão (confissão), bastando, tão somente, que se reze um Ato de
Contrição.
Há os pecados capitais: a soberba, a avareza, a luxúria, a ira, a gula, a
inveja e a preguiça, que têm dado muito suor e trabalho a São Miguel Arcanjo, no
Purgatório, para levar as almas sofredoras para o Céu. Estes, dependendo da
vontade firme do praticante, podem se transformar em pecados mortais, para
alegria do Maligno.
Há, finalmente, os temíveis pecados mortais, aqueles que afastam o pecador da
Graça Divina, sem direito a indulgências. Dando-lhe, de imediato, passaporte
carimbado para o inferno, cujo fogo eterno o queima sem o consumir (?), e
causam-lhe a “morte espiritual”.
Cultuamos o hábito diário de ler a Bíblia há 35 anos. Ficamos impressionados
com os pregadores da Bíblia como sendo a palavra de Deus, que a tudo condenam
sem misericórdia. Parecem-nos molecotes analfabetos apregoando jornais, de cujo
noticiário não se podem inteirar. O amor do próximo e a caridade não lhes
interessam, a não ser como recurso extremo: a salvação.
Há hora em que devíamos ter o prazer pecaminoso de arremeter-nos contra eles
a sapateá-los. Infelizmente, não podemos fazer sempre ao que aspiramos.
Parafraseando o imortal Tenório D’Albuquerque, perguntar não ofende: Em qual
tabelionato foi reconhecida a firma, da assinatura de Deus, na procuração
passada a esses pastores viperinos, para deliberarem sobre o destino das almas?
Onde estarão aqueles religiosos que nos agrediram com gritos proclamadores da
excelência desta ou daquela penitência? Extraordinária, a facilidade com que
proferiram tantas tolices. Uma fertilidade incomparável! Ignorância imaculada.
O nosso estimado confrade, Divaldo Franco, certa feita, asseverou com muita
propriedade: “Proibir e condenar, é sempre uma forma contraproducente de
examinar uma questão existente, que merece orientação, educação e
esclarecimento.”
Para a “Santa Igreja” e “evangélicos”, o pecado mortal do homossexualismo é
um dos “imperdoáveis”, porque profana o corpo, que é o templo de Deus (1Cor,
3:9).
A palavra pecado tem origem no vocábulo grego “imartia”, que significa
afastar-se da meta. Portanto, bem diferente de como é concebida pelas igrejas
ditas cristãs.
Nós, espíritos, somos seres perfectíveis, dotados de inteligência e livre
arbítrio, porém responsáveis diretos pelas conseqüências de nossas atitudes.
Através da pluralidade das existências corpóreas, caminhamos rumo à meta
imutável da lei divina: a perfeição. Quando nos afastamos do caminho,
afastamo-nos dessa meta, gerando o que chamamos de mal. Todavia, quando
retornamos ao caminho, pela mudança de conduta ou reparação das faltas
cometidas, restabelece-se a harmonia e o mal deixa de existir. Onde haja o bem,
o mal desaparece.
Muitos estudiosos afirmam que a homossexualidade é uma opção do ser humano.
Alguns discordam, alegando que nenhuma pessoa se sentiria feliz por ser
perseguida ou discriminada. Uns, asseveram que ela é orgânica, ou seja, a pessoa
não teria outra alternativa. Já outros, apelam para o emocional: o
homossexualismo seria efeito de algum trauma. E o Espiritismo, que diz?
O espírito não tem sexo. O mesmo espírito pode animar ora um corpo masculino,
ora um corpo feminino. Cada sexo, como cada posição social, lhe proporciona o
ensejo de adquirir experiência. O corpo não lhe é mais do que um invólucro
perecível de que se serve para se esclarecer e se purificar. Sempre de modo
progressivo, jamais regressivo. Desde que cessa a vida do corpo, ele o abandona
e retorna à pátria legítima, o mundo invisível, ou mundo espiritual. Em um
desses estágios, como homem ou mulher, o abuso que faça do uso das funções
sexuais, acarretará o seu reingresso na lide carnal, no sexo oposto.
“Quando o homem, em muitas ocasiões, tiraniza a mulher, furtando-lhe os
direitos e cometendo abusos, em nome de sua pretensa superioridade,
desorganiza-se ele próprio a tal ponto que, inconsciente e desequilibrado, é
conduzido pelos agentes da Lei Divina a renascimento doloroso, em corpo
feminino, para que, no extremo desconforto íntimo, aprenda a venerar na mulher
sua irmã e companheira, filha e mãe, diante de Deus. Ocorrendo idêntica situação
à mulher criminosa que, depois de arrastar o homem à devassidão e à
delinqüência, cria para si mesma terrível alienação mental para além do
sepulcro, requisitando, quase sempre, a internação em corpo masculino, a fim de
que, nas teias do infortúnio de sua emotividade, saiba edificar no seu ser o
respeito que deve ao homem, perante o Senhor.”
Aparentemente, esse processo parece uma punição, mas não é. Deus não perdôa
nem castiga. A iluminação dos sentimentos é que o exige. “A Humanidade progride,
por meio dos indivíduos que pouco a pouco se melhoram e instruem”, já dissera
Kardec.
A prática da homossexualidade não transforma o ser em pessoa abominável.
Conhecemos homossexuais que se distinguem pela inteligência apurada, pela
cultura aprimorada, pela educação exemplar, pela fraternidade cristã e,
principalmente, pelo caráter reto. Conhecemos, também, heterossexuais que mais
parecem uma gruta vazia e sombria. Grande e florida por fora, por dentro, um
deserto de qualidades.
O homossexual, de ambos os sexos, tem sido condenado ao esquartejamento moral
e violentado, psicológica e fisicamente, por gente maldosa, sem qualquer
fundamento sério. Para nós, espíritas, serão sempre nossos irmãos amados, tanto
quanto os demais, credores do nosso maior respeito e carinho. Dito isto,
passamos a responder as indagações, do querido amigo:
“É pecado ser homossexual?”
Não. Também não é uma escolha ideal, mas o amigo não deve sujeitar-se ao jugo
dogmático das igrejas.
“Por que sou isso?”
Por livre e espontânea vontade. Da mesma maneira que poderá deixar de ser.
“Que pecado cometi para sê-lo?”
Nenhum. O pecado, ou melhor, o sentimento de culpa só existe na consciência
de quem se sente culpado.
“Até quando serei assim?”
Até quando quiser. Se se dispuser e puder controlar seus impulsos carnais,
transferindo as energias sexuais para um trabalho de auto reeducação, melhor.
Sua indômita força de vontade poderá vencer todos os obstáculos, superar todos
os problemas, possibilitando-lhe uma vida saudável. A felicidade conquistada
será o galardão de seus esforços. Deus instituiu leis que nos favorecem a todos,
já dizia o nosso saudoso Chico Xavier.
“Se olhar para um rapaz, com carinho, estarei pecando?”
Não. Desde que esse olhar não seja de modo lascivo. Um olhar carinhoso, uma
palavra fraterna, um sorriso sincero, uma ação solidária, são ingredientes que
alimentam as verdadeiras amizades, tornando-as indesuníveis.
“Se eu gostar de um rapaz, com amor verdadeiro, serei pecador?”.
Já disséramos, anteriormente, que o pecado está condicionado à atitude mental
de cada um, com base no sentimento de culpa. Quanto ao amor verdadeiro por outro
alguém, requisitamos a palavra autorizada e benevolente do nosso irmão e
Benfeitor Espiritual, cuja orientação bondosa serve para todos nós:
“Recomendar-lhe a castidade quando as pessoas se degradam em ligações
clandestinas, nos braços de amantes, seria temeridade e hipocrisia. Você faria,
dentro em pouco, o que elas fazem. Sobre a ignomínia da culpa, a ignomínia da
mentira. Daí, a audácia do meu conselho. Se puder resistir à sua carne, aos seus
nervos rebeldes, aos seus sentidos alarmados, resista. Será heróico e sublime. A
tranqüilidade de sua velhice será o prêmio dessa renúncia na mocidade.
Se, porém, não encontrar na própria alma energias para vencer o corpo, eleja
um cônjuge. Faça-o, entretanto, publicamente. Nada de subterfúgios, de
mistérios, de clandestinidade. Funde, com ele, um lar. A noção da
responsabilidade assumida em público fa-los-á, a um e a outro, cautelosos na
escolha, assegurando-lhes, assim, a honestidade e a duração da ventura. Amores
escondidos são amores transitórios. Amante que foge, é amante substituído. E
quando alguém adota esse regime, o amor perdeu o seu nome. Chama-se
prostituição.
O meu conselho é, como se vê, prudente e humano. Você é livre e quer ser
feliz. Faltam-lhe as grandes forças interiores, as poderosas energias mentais,
que neutralizam os gritos da carne e dos nervos, e elevam a pessoa acima do seu
sexo, purificada da animalidade comum. Evite, todavia, em quaisquer
circunstâncias, a pessoa que não quiser, em público, assumir os encargos do seu
destino. A casa de família em que se entra escondido, deixa de ser um lar para
ser um prostíbulo. E a pessoa, que vai encontrar-se secretamente com outra,
perde o seu título de honrada para tomar o de meretriz. Aquela pessoa que não
fizer um sacrifício igual ao seu, abandonando tudo, e tudo afrontando, para
viver ao seu lado, deve ser tomada, simplesmente, como sedutora vulgar e
covarde, semelhante aos rufiões que exploram as mulheres na sombra, desfrutando
as vantagens e fugindo às responsabilidades. Repila, em suma, o amante. E aceite
o cônjuge.
Para doença tão grave, era este, o remédio menos venenoso que havia em minha
farmácia.
Humberto de Campos.”
Mais uma vez, parafraseando o grande Tenório: A beleza dos ensinamentos do
Espiritismo é inexata, não se exprime por números, não se calcula
matematicamente. É de tal magnitude que se torna incalculável, apenas a
sentimos.
E, para encerrarmos, recomendamos a todos, permaneçamos no amor de Jesus, sem
nos aventurarmos a discriminar ou denegrir o próximo. Permitir a liberdade plena
é o fundamento maior do amor cristão, haurido na nossa Doutrina Espírita.
Muita paz,
José B. Campos