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Homossexualismo

Eu fiquei a pensar nos colegas espíritas que tive no meu tempo de juventude espírita
que lutavam ardorosamente para vencer suas inclinações homossexuais; fiquei a pensar
nos homossexuais que não se enquadram no perfil pressuposto e atacado teoricamente
pelo Vladimir e fiquei assustado nas implicações que a leitura de um texto como
este poderia provocar nessas pessoas, uma vez que nem todo homossexual tem segundo
ele ” atração compulsiva por pessoas do mesmo sexo…”. Certamente esta não foi
a intenção do Vladimir, mas ele precisa pensar a questão pensando nos seres de carne
e alma que são objetos de sua reflexão, no que diz respeito à recepção e decifração
da mensagem. Por isto eu pergunto como se sentiram as pessoas com tendências homossexuais
ao ler o referido texto, principalmente nas seguintes passagens? Grifos e negritos
são por nossa conta:

  1. “Mas evidentemente o homossexual (como também o heterossexual desregrado)
    não e um ser em equilíbrio espiritual. Ao contrario, tanto um quanto outro quase
    sempre estão sob cerrado ataque fluídico negativo ou em estrito conluio psíquico
    com entidades trevosas.
  2. “O homossexualismo(…)o mais visado pelo vampirismo – desde os íncubos e
    súcubos da Idade Media ate os nossos dias -, que incidem hoje os destemperos criminosos
    dos libertinos diplomados.” (citação de Herculano Pires)

No que diz respeito a primeira afirmativa, o autor incorre na transgressão do
principio básico para discussão de uma temática, qual seja, guardar a sua diversidade,
o seu pluralismo. O autor pressupõe que toda pessoa com inclinação homossexual e
um desregrado nas praticas sexuais. E preciso distinguir o impulso pelo mesmo sexo
da concepção vulgar de exercício da sexualidade; pois o universo da homossexualidade
não se resume ao modelo preconcebido pelo autor de alguém que esta a todo instante
desejando se entrelaçar corporalmente com alguém do mesmo sexo, como alguém que
esta em “estrito conluio psíquico com entidades trevosas”. O homossexual e primeiramente
um espírito encarnado em um corpo que não aceita pelo fato deste ser o oposto da
sexualidade com a qual o espírito mais se ligou em suas reencarnações. A sua moralidade,
a sua concepção de exercício da sexualidade e uma questão moral sim. Não vejo imoralidade,
falta de espiritualidade esta em conflito com sua sexualidade. Naturalmente, vejo
desequilíbrio sim, no cultivo do desejo com alguém do mesmo sexo. Discutir esta
temática com fronteiras tão delgadas pressupõe o domínio bem preciso de conceitos,
a fim de não incorrer em generalismos.

E quanto à segunda questão, creio que o mestre Herculano Pires se refere ao cultivo
do homossexualismo, e não aquilo pressuposto pelo autor, ao afirmar que “em sua
explanação , Herculano Pires considera os homossexuais como pessoas sujeitas ao
fenômeno espiritual do vampirismo, em que uma entidade trevosa liga-se, em simbiose,
ao perispírito de um ser encarnado para compartilhar energias polarizadas negativamente,
no caso as sexuais”.

O texto amplia sua tibieza teórica na medida em que o autor serve-se da corrente
naturalista, como se esta desse conta de explicar um fenômeno que atinge o ser consciente.
O autor, sem perceber, contribui teoricamente na justificação da prática de certa
anomalia sexual ao servir-se de um belo porem ineficaz argumento dito pelo escritor
e pesquisador espírita Carlos Imbassahy para criticar a pratica do homossexualismo:

” O homossexualismo como pratica costumeira em detrimento do hetero (sic) e pernicioso
porque contraria a lei natural dos seres vivos. Só as lesmas e que são bissexuadas;
isso deve ser ponderado para analise. O porque do fato. Se o homossexualismo, em
si, devesse ser adotado, a própria Natureza nos dotaria simultaneamente de ambos
os órgãos, como no caso das flores e dos hermafroditas.”

Pergunto: A prática do hermafroditismo deve ser ou não encarado como transgressão
das leis divinas?

E por fim o autor manifesta uma concepção radicalmente anti-dialética, totalmente
linear da lei de causa e efeito, quando afirma que ” …aquele que se excede nas
praticas sexuais retorna a carne em condição inversiva, ou seja, no sexo oposto
aquele no qual se excedeu…”. E evidente que qualquer transgressão das leis divinas
implica em correções futuras, mas dai afirmar que a condição de homossexual e o
destino comum de todos que hoje adentram na pratica sexual em desajuste com a lei
do amor, e mecanizar o processo evolutivo. Este entendimento nivela de uma forma
radical os vários níveis de desregramentos, alem de desconsiderar o fato de que
a evolução espiritual do ser humano se da sobre a categoria da contraditoriedade.
Não ha evolução linear, senão vejamos os capítulos do Livro dos Espíritos sobre
Lei de Progresso e a Lei de Destruição.

Certamente que Vladimir ao escrever sobre o Homossexualismo estava movido das
suas melhores intenções, no entanto a não observância dos pressupostos abordados
no inicio deste, tornaram seu texto avesso ao seu objetivo. E isto esta expresso
em dois momentos belíssimos de seu texto, os quais transcrevo enquanto encerramento
de minhas observações:

Obviamente, nossos irmãos homossexuais merecem o respeito devido a todos os seres
da criação; não podem ser discriminados, nem rejeitados, pois, como disse meigo
Rabi da Galiléia, “aquele dentre vos que não tiver pecados, atire a primeira pedra”.

Por isto creio que faltou ao autor um maior cuidado como o que ele próprio afirma
no final de seu texto, servindo-se de uma citação de Emmanuel:

“Diante de toda e qualquer desarmonia do mundo afetivo, seja com quem for e como
for, colocai-vos, em pensamento, no lugar dos acusados, analisando as vossas tendências
mais intimas e, apos verificardes se estais em condições de censurar alguém , escutai,
no âmago da consciência, o apelo inolvidável do Cristo: Amai-vos uns aos outros,
como eu vos amei.”

Quanto a questão do homossexual assumir ou não um cargo em uma instituição espírita,
e uma outra discussão , com questões de critérios práticos extremamente complexas.

Deixo este desafio para alguém mais qualificado, com mais experiência na temática.
A complexidade da questão começa com a simples pergunta: Como identificar com cem
por cento de segurança que alguém é homossexual? Pelo andar, pelo falar ou por que
não tem companheiro(a)? O problema e ser homossexual ou exercer o homossexualismo?
Ou tanto faz?

Como ficariam os outros males morais a serem controlados pelas instituições na
escolha de seus dirigentes e trabalhadores em geral? Difícil questão, e preciso
muita prudência para discuti-la, e bem domínio conceitual da questão, a ausência
de um destes elementos pode deflagrar bandeiras perigosas no seio do movimento espírita.
Muita Paz!

Luciano Bomfim, Kassel/Alemanha

(Retirado do Boletim GEAE Número 263 de 21 de outubro de 1997)