Allan Kardec foi, com justiça, considerado um homem ponderado. Logo de cara, no início do regulamento da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, deixou clara a proibição da discussão de temas que poderiam suscitar paixões avassaladoras e brigas como as que vemos hoje em nosso movimento espírita. Diria que nos “odiamos” fraternalmente, tudo regado aos clichês de muita paz e beijos de luz.
Quais temas: política, economia e religião.
Abro um parêntese aqui para alguns comentários. Depois retornaremos ao assunto principal do texto.
Penso que podemos e devemos debater qualquer assunto, contudo ainda não estamos acostumados a sermos contrariados.
Quando divergem de nós logo consideramos tratar-se de um inimigo, de alguém que quer nos abater.
Em ambientes educados as pessoas divergem, mas respeitam-se, não se adjetivam de maneira pejorativa e utilizam da empatia, fórmula “mágica” que possibilita a convivência com civilidade.
É interessante ressaltar que ao concordar com o autor de um texto, uma ideia, artigo ou seja lá o que for, estamos, em realidade, prestando um tributo à nossa forma de pensar e enxergar as coisas. Talvez seja este um dos motivos pelos quais temos repugnância ao diferente, ele não bate “continência” para nossas ideias.
Voltemos, porém, a Kardec.
Kardec não queria afastar-se do objetivo de estudar os fenômenos espíritas. A ideia dele era ter um grupo fechado, sem discussões infrutíferas que poderiam gerar animosidades e atrapalhar o bom andamento das coisas. Conhecedor da alma humana, sabia que temas deste quilate dão gigantescas dores de cabeça.
Melhor, por prudência, evitar os temas acima mencionados. Nada de palanque para impropérios. O objetivo do Espiritismo tinha uma amplitude muito maior do que guerra de egos, luta para ter razão e etc.
Entretanto, Kardec deixa uma sugestão fabulosa caso ainda os espíritas arrumem confusão por questões políticas.
Se houver ruídos na comunicação e desentendimentos ameaçarem a segurança e estabilidade do grupo, Kardec propõe uma ideia muito interessante baseada nas concessões.
Em realidade, Kardec utiliza o termo “mútuas concessões” para que cessem os desentendimentos… Eu sei, é necessário uma boa dose de humildade para descer do pedestal e crer, mesmo que de forma pálida, a possibilidade de existir vida inteligente fora da nossa esfera de raciocínio.
Não há, para Kardec, o passo de apenas um indivíduo em direção ao outro, mas o passo de ambos a fim de que a paz seja restabelecida.
Por isso ele diz: mútuas concessões.
Parece-me que nunca Kardec foi tão atual.
Nunca os temas por ele propostos foram tão importantes de serem estudados pelos espíritas.
Fica uma sugestão para pensarmos a respeito.
Autor: Wellington Balbo