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O Espiritismo em Cuba

O Espiritismo em Cuba

O Espiritismo completará seu sesquicentenário (150 anos) em 2007, e
precisamos conhecer suas raízes e desenvolvimento em todos os lugares. Por isso,
vale a pena saber seu histórico num lugar em que pouco se conhece sobre ele, mas
que um dia foi um dos mais destacados e atuantes do Movimento Espírita
internacional. Trata-se de Cuba, 111.OOOkm2, 11 milhões de habitantes,
atualmente com taxa de analfabetismo de 4%, país sem religião oficial, e que foi
uma colônia espanhola até 1898, passando por curta dominação americana até 1902,
quando o país se tornou independente; mas os EUA continuaram por muitos anos a
exercer constante influência política na Ilha. Em 1959, através de um golpe,
assumiu o governo Manuel Urtia, continuando a instabilidade no país, e em
seguida Fidel Castro (1927) assumiu o governo, com o apoio comunista da URSS,
acabando com todos os movimentos religiosos do país, e levando à dissolução da
Confederação Nacional Espírita de Cuba e de todo o Movimento Espírita oficial,
em 1963. Mas antes deste fator político, o país foi um dos mais ativos que
existiram em todo o mundo na adoção e prática do Espiritismo.

Este fato extraímos do registro de um grande trabalhador que lá viveu mais de
cinqüenta anos, o Sr. Luís Guerrero Ovalle (1895-1990), que nasceu em Léon,
Espanha, e em 1906 se transferiu com a família para a Argentina, onde estudou e
seu pai trabalhou como notário público. Em 1909 ele se mudou para Cuba,
continuando os estudos e passando a trabalhar na área bancária, tendo sido
administrador de vários bancos neste país, onde residiu até 1960, quando se
transferiu para Miami/EUA. Aos 21 anos, plenamente adaptado à cultura cubana,
ingressou no Movimento Espírita, pois começou a ler e estudar O Livro dos
Espíritos, quando sua mãe desencarnou. Exerceu cargos em várias instituições
espíritas, colaborou em muitos periódicos e traduziu ao espanhol obras
mediúnicas de Francisco Cândido Xavier (1910-2002), Divaldo Franco (1927-),
Yvonne A. Pereira (1900-1984) e outros. Nos Estados Unidos, o Sr. Ovalle foi
fundador da Ciência Espiritualista Kardeciana e graças a ele pudemos tomar
apontamentos da história do Espiritismo em Cuba, conforme está publicado no
periódico Credo Espírita, fundado em 1981, e editado pela Libreria Kardec (Ano
IV, Num 2, Miami, março de 1985 e ss.).

As fases da história espírita no país

Inicialmente, há notícias de que no período colonial os índio Tamos e
Siboneyes tinham o hábito de produzir vários fenômenos espíritas, mas a partir
de 1856 é que começaram a surgir os primeiros núcleos mediúnicos nas cidades de
Havana, Sagua La Grande, Sancti Spiritus, Manzanillo, Caibarien e Santiago. A
partir de 1870 começaram a se constituir um grande número de periódicos
espíritas, como La Luz de Ultratumba (1874), La Ilustración (1878), Luz de los
Espacios (1881), La Antorcha de los Espírítus (1882), El Buen Desejo (1884), La
Luz del Evangelho (1885), La Buena Nueva (1886; La Alborada (1888), La Nueva
Alianza, de Cienfuegos. As instituições se estruturaram e, em trinta anos, por
ocasião do Primeiro Congresso Internacional Espírita, em 1888, em Barcelona,
três cubanos estiveram presentes e cinco instituições se fizeram representar:
Centro La Reencarnación, Havana, Centro El Salvador, de Sagua La Grande,
Sociedad Espiritista, de Matanzas, Centro Lazo Unión, de Cienfuegos, Centro San
Pablo de Malpáez, Quemado de Güines. Para dar-nos um referencial,
desconsiderando a Espanha, país-sede do Congresso, e a França, berço do
Espiritismo, Cuba foi o país que teve maior representação no evento, juntamente
com o México, pois quase todos tiveram só uma entidade representante, dois
países tiveram dois grupos, a Bélgica teve somente quatro. A admiração pelos
cubanos aumenta se compararmos o número de periódicos espíritas que enviaram
adesão a este primeiro encontro internacional pois, novamente desconsiderando a
França e a Espanha (países dos quais somente quatro e nove periódicos aderiram,
respectivamente), Cuba foi também o país que mais se fez representar, com três
periódicos. Os outros países tiveram somente um ou dois periódicos
representados, e só a Itália teve também três. Estes números demonstram que os
cubanos eram muito conscientes e atuantes na própria organização e na divulgação
espírita.

Federação Espiritista de Cuba

Em 22/7/1890 foi fundada a Federación Espiritista da Ia Isla de Cuba
(Federação Espiritista da Ilha de Cuba), reunindo vinte e três instituições do
país, considerando que não puderam participar as instituições de Matanzas e
Oriente. O objetivo da Federação estava bem claro no artigo primeiro de seu
Regulamento: A Federação tem por objetivo a união de todos os centros
espiritistas de Cuba, para estender a propaganda do Espiritismo por meio da
palavra, escrita ou falada, e a prática de toda virtude pública e privada. A
diretoria da Federação denominava-se Conselho Regional, e nos anos seguintes
aumentou muito o número de instituições e periódicos no país, a tal ponto que,
por ocasião do Primeiro Congresso Nacional Espiritista de Cuba, no Teatro Payret,
em 1920, houve 562 Delegados, 113 Centros Espíritas e 336 representações
pessoais. Neste Congresso lançaram-se as bases para que, em 1922, fosse criada a
Federação Nacional Espiritista da Cuba independente que, em 1941, passou a
denominar-se Confederação.

Os cubanos marcaram presença no Congresso Internacional Espírita de
Barcelona, em 1934, e em 1935 deram início a uma série nunca vista de
Concentrações Espíritas Nacionais, que a partir de 1944 passaram a chamar-se
Congressos, tendo se realizado vinte e seis eventos, de 1935 até 1963, o que
significa que houve praticamente um por ano, abrangendo vários lugares da Ilha
(Santa Clara, Camagüey, Havana, Matanzas, Santiago de Cuba, Villa de Guanajay
Bayamo, Cóton e Pilar del Rio). Na 8ª Concentração, em 1942, decidiu-se criar a
importante instituição social Clínica del Alma, em Camagüey, hospital que
objetivava a cura e recuperação de obsidiados, a qual até 1966 exerceu um
importante papel para a ajuda aos necessitados, quando por Decreto foi
incorporada ao Ministério da Saúde Pública. Destacamos também que Cuba teve
vários programas de rádio em Havana, desde 1941, como O Psiquis e o Doutrina
Espírita, na rádio Alvarez.

Importantes trabalhadores espíritas cubanos

Naturalmente, impossível assinalar todos os grandes trabalhadores de Cuba, em
face da pujança de seu histórico, com muitos periódicos e sociedades. Os nomes
destes valorosos tarefeiros são totalmente desconhecidos dos espíritas de hoje,
e por isso fazemos questão de citar alguns: no século XIX, José
Martí
(1853-1895), líder revolucionário e autonomista da ilha, que
passou por vários países da América Central, EUA e Paris, venerado ainda hoje
pela população cubana, por causa de sua atuação em prol da independência do
país, e que tinha convicções espíritas; os Srs. José A. Perez Carrión,
fundador do periódico La Rustración; o grande conferencista Jose Jimenez
Torres
, que foi um dos criadores da Federação Espiritista de Cuba, em 1890,
a qual teve também a participação de Doroteo Venero, seu primeiro
Presidente, Miguel Muñoz, José R. Montalvo e Francisco Castillo
Catalina de Güines
, todos representando diversas sociedades existentes;
Eulogio Prieto,
que foi o único sul-americano pertencente às Comissões
Organizadoras dos 1º e 2º Congressos Internacionais Espíritas (Barcelona; em
1888, e Paris, em 1889), estando presente nestes eventos com os outros cubanos
Don Tomás de Oña e Don Juan Garayo; Miguel Rubert e Santiago
Cañizares
, fundadores do periódico La Buena Nueva, em 1886, o estudioso do
tema psiquismo filosófico, José Maria Alfonso; Miguel Chomat, Felix
Ríos e José Ferrera
, todos líderes de organizações; o juiz correcional
Marcos Garcia
. A partir de 1895, o país teve que parar suas atividades
espíritas, em face dos conflitos internos para a sua emancipação, mas em 1902,
com a independência de Cuba, lentamente um grupo de idealistas e dez Centros
Espíritas foram retomando as atividades doutrinárias.

Assim, no século XX, destacamos o livro espírita La Filosofia
Penal de los Espírítistas, com edições também na Argentina e no Brasil, do
escritor, antropólogo e criminologista Fernando Ortiz (1881-1969), que
curiosamente se declarava “não-espírita” (!!); Francisco Armenteros,
Francisco M. González Quijano
(1862-1926), que trabalhou com José Martí,
Alberto Peralca, Aquiles Ortega
e o escritor Don Salvador Molina, que
esteve no Congresso de Barcelona, em 1934, todos da Sociedade Espiritista de
Cuba, promotora do 1°Congresso Nacional do país, em 1920, o qual recebeu
felicitações até do Instituto de Metapsíquica de Paris; Fidel de Céspedes,
Francisco M. Gonzáles,
o orador Miguel Santiesteban Barciela
(desencarnado em 1979, foi Presidente da Confederação Espiritista de Cuba, desde
1936, e também da CEPA, de 1953 a 1956) e Leopoldo Lópes, que
participaram da criação da Federação Espírita da Cuba independente, em 1922; o
promotor Manuel Garcia Consuegra, Ramón Garcia Martí, Plácido Julio Gonzalez,
diretor do periódico Rosendo, todos que muito trabalharam para a primeira
Concentração Espírita, em 1935; o escritor, poliglota e articulista Antônio
Soto Paz Basulto
(1889-1943); Ramón Garcia Martí e o advogado
Armando Labrada Canto
, fundador da Clínica del Alma e ambos Presidentes das
1ª e 2ª Concentrações Espíritas (1935 e 1936), que teve Hortênsia Naranjo de
Casas
como secretária correspondente; o Sr. Armando foi Presidente também do
20° Congresso; Benito Carballo y Arnau, Presidente da 4ª Concentração, em
1938, que teve o médium Roberto Carmona y Cuesta como secretário e
Ernesto Prieto Figueroa
, como tesoureiro; o médium do Grupo Rosendo Juan
Francisco Casanova
, onde Carlos Millares era o Presidente; o médium
Angel Manuel Balbona y Pedroso, do Grupo Francisco de Paula; Medardo
Lafuente Rubio
(?-1939), do núcleo de Camagüey, homenageado pelas sociedades
da cidade pelo seu incansável labor espírita; na 6ª Concentração Espírita, em
1940, o Sr. Luís Ovalle fez parte da Comissão Organizadora, e destacamos
neste tempo o profícuo trabalho da União das Mulheres Espíritas, em Havana e
Matanzas, tendo como Secretária-Geral Ofélia Dominguez, servindo de
modelo para criação da Federação Argentina de Mulheres Espíritas, em 1950, pela
Sra. Josefina de Rinaldi (1909-1952); em 1946, no 12° Encontro,
publicou-se um livro com um histórico de todas as Concentrações cubanas; no 14°-
Congresso, em 1948, comemorou-se o Centenário do Espiritismo, no Salon del
Círculo de Bellas Artes e palestra do orador Dr. Ignacio Travieso Figueras,
celebrando o feito das Irmãs Fox, nos EUA; no 20° Congresso, em 1955, enviou
representação o Governador de Camagüey, e o chefe do Regimento Militar, com a
presença da Banda Municipal da cidade. Em 1957, houve uma grande comemoração
pelos cem anos do lançamento de O Livro dos Espíritos, ocasião em que a
Federação Espírita Brasileira e La Editorial Constancia, da Argentina, venderam
exemplares deste livro aos cubanos por preço ínfimo. A Sra. Eva Guevara Arias,
ativa trabalhadora da Federação Provincial do Oriente, até 1963, ano em que se
celebrou um Congresso Espiritista Extraordinário, em Regla, Havana, o qual
dissolveu a Confederação Espiritista, em face da situação política da Ilha.

Conclusão

Devemos registrar que foi aprovada no Congresso de 1920 uma moção pela qual
se estabeleceu o dia 31 de março como o Dia Espírita, por iniciativa do Centro
Espírita Luy y Caballero; em outubro de 1953, realizou-se o Terceiro Congresso
Espiritista Panamericano, em Havana; em 21/4/1957 foi erigido em praça pública o
busto de Allan Kardec, também em Havana, por iniciativa da Associação
Espiritista Enrique Carbonell, mas com a revolução comunista o mesmo foi
retirado da praça. O Sr. Dante Culzoni Soriano, Presidente da CEPA, enviou carta
ao Presidente de Cuba, em 1972, protestando contra a retirada do busto de Allan
Kardec da praça e pedindo sua reinstalação, mas não obteve resposta. Uma pessoa,
o Sr. Alfredo Duran, em Havana, teria conseguido recuperar esta peça, a qual
teria ficado em sua posse. Com dificuldade, conseguimos localizá-lo por telefone
em Havana, e ele confirmou a história, informando que o busto se encontra em sua
residência, guardado com veneração. Tendo em vista uma reportagem saída na
Revista Internacional de Espiritismo, que falava sobre Cuba, contatamos por
telefone Clóvis Portes, brasileiro, residente em Belo Horizonte e Ipatinga/MG,
que informou que nas oito vezes em que esteve em Cuba, nos últimos dez anos, ele
lá encontrou discretas sociedades espíritas, não oficiais, muitas praticando um
tipo de mediunismo caribenho, e nestas viagens ele vem tentando levar uma
vivência do Espiritismo fiel aos princípios de Allan Kardec.

Enfim, pela precocidade com que o Espiritismo surgiu em Cuba, em 1856, antes
do próprio advento da Codificação, pelo número de sociedades e periódicos
espíritas nos séculos XIX e XX, que o colocam como um dos primeiros em nível
internacional; pelas incomparáveis realizações no tocante a Congressos e
Concentrações Espíritas, coisa nunca vista em nenhum país do mundo; por
estabelecer por moção, em 1920, o dia 31 de março como o Dia Espírita, o que só
depois de décadas algumas cidades começaram a fazê-lo; por ter erigido na
Capital um busto de Allan Kardec em praça pública, em 1957; pelos programas
espíritas de rádio na década de 1940; por movimentar até as autoridades civis e
militares em seus eventos, da Europa e América, por estes motivos Cuba possui
uma grande riqueza histórica a ser descoberta e relatada. Contatos estão sendo
estabelecidos com Clóvis Portes e o Sr. Alfredo Duran para se tentar levar
oficialmente grandes oradores espíritas brasileiros a Cuba, ajudando a plantar
as sementes para o ressurgimento dos ideais espíritas nesta Ilha, cujo
histórico, apesar de desconhecido hoje, muito dignifica a Doutrina Espírita…

Washington L. N. Fernandes

(Publicado no Boletim GEAE Número 460 de 29 de julho de 2003 )

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