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Relatório Preliminar do I Fórum Nacional Antidrogas

Relatório Preliminar do I Fórum Nacional Antidrogas

Outro aspecto que tem sido motivo de reflexão é a tendência mundial que
aponta em direção à iniciação cada vez mais precoce e de forma mais pesada no
uso abusivo de drogas. No Brasil, são referência os estudos realizados, desde
1987, pelo Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (CEBRID)
sobre o uso indevido de drogas por estudantes de 1º e 2º graus e crianças e
adolescentes em situação de rua. Os resultados desses levantamentos confirmam
que, no país, também há um consumo cada vez mais elevado de substâncias
psicoativas entre crianças e adolescentes. O último levantamento do CEBRID,
realizado em 1997, revela que o percentual de adolescentes que já consumiram
drogas (uso na vida) entre os 10 e 12 anos de idade é altíssimo: 51.2% usaram
álcool; 11% usaram tabaco; 7.8% solventes; 2% ansiolíticos e 1.8% já se
utilizaram de anfetamínicos nessa faixa etária. Nas 10 capitais pesquisadas,
cresceu a tendência para o uso freqüente de maconha entre crianças e
adolescentes. O uso freqüente de cocaína e de álcool também aumentou em seis
capitais. Quanto ao uso pesado de drogas, isto é, 20 vezes ou mais no mês,
também experimentou um aumento nas 10 capitais para a maconha e, para o álcool,
em oito capitais.

A situação agrava-se entre as crianças e adolescentes em situação de rua.
Segundo levantamento de 1993, o uso na vida de drogas por esta população
apresentava os seguintes percentuais: 82.5% em São Paulo, 71.5% em Porto Alegre,
64.5% em Fortaleza, 57% no Rio de Janeiro e 90.5% em Recife (Noto et.al., 1993).
As drogas mais comumente usadas por crianças e adolescentes em situação de rua
são: o tabaco, com um uso diário de 71% em São Paulo e 68.5% em Recife; os
inalantes, com 42% em Recife e 24.5% em São Paulo; a maconha – 25% em Recife e
13.5% em Fortaleza; e o álcool (29% em Recife e 6.5% em São Paulo). Cocaína e
derivados são mais consumidos nas capitais do Sudeste do país (6% em São Paulo e
4.5% no Rio de Janeiro) e anticolinérgicos nas capitais nordestinas (18.5% em
Recife e 8% em Fortaleza).

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Drogas e violência

É corriqueira a associação entre drogas e violência, especialmente no que diz
respeito ao tráfico de substâncias ilícitas. No entanto, as dimensões sociais e
econômicas subjacentes são usualmente obviadas, dando-se ênfase a aspectos
sensacionalistas que limitam a compreensão do problema e legitimam atitudes
repressivas. O aumento da violência e da criminalidade, especialmente nos
centros urbanos, está diretamente vinculado a fatores como o desemprego e a
distribuição desigual da riqueza, e nesse sentido deve entender-se, também, a
violência relacionada com o tráfico de substâncias ilícitas.

A relação entre desemprego, tráfico e consumo de drogas, aliás, já foi
comprovada por vários estudos nos EUA e Europa. Recentemente, o jornal Folha de
São Paulo publicou pesquisa realizada pelo Departamento de Investigações sobre
Narcóticos (DENARC) nesse estado, com 981 traficantes, usuários e dependentes de
drogas. O estudo revela que, de cada 100 traficantes, 75 estão desempregados, e
de cada 100 usuários e dependentes, 76 estão igualmente desempregados. Quanto à
escolaridade, do total de traficantes presos pelo DENARC no ano de 1997, 87.4%
estudaram até o primeiro grau completo. Além disso, a pesquisa mostra que a
grande maioria dos usuários e dependentes detidos têm entre 15 e 30 anos. Assim,
o perfil que este estudo apresenta é o de uma população na faixa etária mais
afetada pelo desemprego e que, em decorrência da baixa escolaridade, encontra-se
impossibilitada para a inserção e a competição no mercado de trabalho.

No outro lado da moeda, estudos no Brasil e alhures mostram a relação entre o
consumo de psicotrópicos e os atos de violência. Segundo pesquisa realizada pelo
Instituto Nacional de Abuso de Álcool e Alcoolismo dos EUA, o uso excessivo de
bebida é um fator verificado em 68% dos homicídios culposos, 62% dos assaltos,
54% dos assassinatos e 44% dos roubos ocorridos no país (In: ALCOHOLALERT,1997).
O mesmo estudo chama à atenção sobre o uso de álcool em casos de violência
doméstica: cerca de dois terços dos casos de espancamento de crianças ocorrem
quando os pais agressores estão embriagados. O mesmo ocorre nas agressões entre
marido e mulher.

No Brasil, pesquisadores do CEBRID analisaram em 1996 mais de 19.000 laudos
cadavéricos feitos entre 1986 e 1993 no IML central de São Paulo e constataram
que, de cada 100 corpos que entraram no Instituto Médico Legal neste período,
vítimas de morte não natural, 95 tinham álcool no sangue.

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Drogas e trânsito

Embora os acidentes de trânsito estejam entre as principais causas externas
de morte no Brasil, só recentemente tem sido objeto de estudo a relação entre
estes e o uso de drogas. Em 1997, pesquisa realizada nas cidades de Recife,
Brasília, Curitiba e Salvador, mostrou a alta presença do uso de drogas,
especialmente álcool, nas situações de violência no trânsito. A média para as
quatro cidades é de 61% de casos de alcoolemia positiva entre as pessoas
envolvidas em acidentes (Melcop et. al., 1997).

A mesma pesquisa também verificou o uso de outras substâncias psicoativas
pelas pessoas envolvidas em acidentes de trânsito, em diferentes proporções para
cada cidade. No Recife, uma em cada 10 vítimas de acidentes havia feito uso de
maconha (10%), o dobro do percentual detectado em Brasília (4.5%). Com relação à
cocaína, não houve detecção entre os acidentados de Recife, mas nas outras três
cidades os valores variaram entre 3.8% em Salvador, 3.4% em Brasília e 3% em
Curitiba. Foi constatado ainda o uso de outras substâncias como os
Benzodiazepínicos (3.4%), Barbitúricos (1.5%), Anfetamínicos (0.6%) e Opióides
(0.3%).

Números ainda mais altos foram encontrados em outra pesquisa, desta vez
realizada no período de Carnaval, na cidade de Recife: 88.2% das vítimas fatais
de acidentes de trânsito tinham consumido álcool (MELCOP et.al. 1997).

O novo Código Nacional de Trânsito vai ao encontro desta preocupação e
estabelece que dirigir sob influência do álcool (níveis de alcoolemia iguais ou
acima de 0,6g/l) é crime. Estão previstas multa e prisão para aqueles que
infringirem a norma.

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Drogas e trabalho

Igualmente, é preciso chamar a atenção para os problemas relativos ao uso de
drogas e sua influência no trabalho, tanto no que diz à segurança do
trabalhador, física e social, quanto à produtividade das empresas.

No Brasil, estudo realizado no ano de 1993 pela Federação das Indústrias do
Estado de São Paulo – FIESP (Waismann, 1995) aponta que de 10 a 15% dos
empregados tem problemas de dependência, e que este abuso:

  • é responsável por três vezes mais Licenças Médicas que outras doenças;
  • aumenta cinco vezes as chances de Acidentes de Trabalho;
  • está relacionado com 15 a 30% de Todos os Acidentes no trabalho;
  • é responsável por 50% de Absenteísmo e Licenças Médicas;
  • leva à utilização de oito vezes mais Diárias Hospitalares;
  • leva a família a utilizar três vezes mais Assistência Médica e Social.

Esses dados são confirmados por outras pesquisas (Dias et.al. 1997, Campana,
1997).

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Drogas e AIDS

Com a expansão da epidemia da AIDS, o consumo de drogas requer uma atenção
ainda maior. Desde 1982, quando se registrou o primeiro caso de AIDS entre
usuários de drogas injetáveis no país e, principalmente, a partir de 1985, o
curso dos casos de AIDS entre esta população vem tendo um aumento expressivo. Em
1985 este número representava 2,7% do total (14 casos), já em 1990 chegou a
18,2% (736 casos). Atualmente, cerca de 25% dos casos de AIDS notificados ao
Ministério da Saúde estão relacionados com o uso de drogas injetáveis.

Dados do “Projeto Brasil” indicam que em cidades como Santos (SP) e Itajaí
(SC) a prevalência de HIV entre usuários de drogas injetáveis alcança o índice
de mais de 60%, dos casos identificados. Nas quatro cidades pesquisadas (Santos,
Salvador, Rio de Janeiro e Itajaí), o índice de compartilhamento de seringas
varia de 56% na região centro-oeste a 85% no Sul. A transmissão através do
compartilhamento de seringas é, também, um dos fatores responsável pelo
crescimento do número de casos de AIDS entre as mulheres, parceiras sexuais dos
usuários e, conseqüentemente, da AIDS pediátrica.

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Conclusões

Sem dúvida, os dados apresentados justificam o apelo aos diversos setores –
governamental e não governamental – para que estes possam responder à demanda
gerada pelo uso indevido de substâncias psicoativas. A assistência aos
transtornos relativos decorrentes do consumo de drogas deve espelhar a realidade
nacional e caminhar no sentido de propiciar a atenção integral a saúde do
indivíduo, em ambientes alternativos à internação hospitalar, através da atuação
interdisciplinar das equipes técnicas, e com a participação comunitária,
possibilitando não somente a recuperação clínica do dependente, mas
principalmente sua reabilitação e reinserção social.

As discussões e propostas apresentadas neste documento mostram uma visão
panorâmica das alternativas de alguns dos agentes envolvidos nesta problemática
no nosso país.

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