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Trecho da Introdução do Livro “No Invisível”

Trecho da Introdução do Livro “No Invisível”

Léon Denis

(Trecho da Introdução do livro “No Invisível” de Léon Denis, tradução de
Leopoldo Cirne, FEB(1))

Desde cinqüenta anos (2)
se tem estabelecido uma íntima e freqüente comunicação entre o nosso mundo e o
dos Espíritos. Soergueram-se os véus da morte e, em lugar de uma face lúgubre, o
que nos apareceu foi um risonho e benévolo semblante. Falaram as almas; sua
palavra consolou muitas tristezas, acalmou bastantes dores, fortaleceu muita
coragem vacilante. O destino foi revelado, não já cruel, implacável, como o
pretendiam antigas crenças, mas atraente, eqüitativo, para todos esclarecido
pelas fulgurações da misericórdia divina.

O Espiritismo propagou-se, invadiu o mundo, Desprezado, repelido ao começo,
acabou por atrair a atenção e despertar interesse. Todos quantos se não
imobilizavam na esfera do preconceito e da rotina e o abordaram
desassombradamente, foram por ele conquistados. Agora penetra por toda a parte,
instala-se em todas as mesas, tem ingresso em todos os lares. À sua voz, as
velhas fortalezas seculares – a Ciência e a própria Igreja
(3)
, até aqui hermeticamente
aferrolhadas, arrasam suas muralhas e entreabrem suas portas. Dentro em pouco se
imporá como soberano.

Que traz ele consigo ? Será sempre e por toda a parte a verdade, a luz e a
esperança ? Ao lado das consolações que caem na alma como o orvalho sobre a
flor, de par com o jorro de luz que dissipa as angústias do investigador e
ilumina a rota, não haverá também uma parte de erros e de decepções ?

O Espiritismo será o que o fizerem os homens. Simila similibus ! Ao
contacto da Humanidade as mais altas verdades à vezes se desnaturam e
obscurecem. Podem constituir-se uma fonte de abusos. A gota de chuva, conforme o
lugar onde cai, continua sendo pérola ou se transforma em lodo.

É com desgosto que observamos a tendência de certos adeptos no sentido de
menosprezar a feição elevada do Espiritismo, a fonte dos puros ensinamentos e
das altas inspirações, para se restringirem ao campo da experimentação
terra-a-terra, à investigação exclusiva do fenômeno físico.

Pretender-se-ia acomodar o Espiritismo no acanhado leito da ciência oficial;
mas esta, inteiramente impregnada das teorias materialistas, é refratária a essa
aliança. O estudo da alma, já de si difícil e profundo, lhe tem permanecido
impenetrável. Os seus métodos, por indigentes, não se prestam absolutamente ao
estudo, muito mais vasto, do mundo dos Espíritos. A ciência do invisível há de
sempre ultrapassar os métodos humanos. Há no Espiritismo uma zona – e não a
menor – que escapa à análise, à verificação: é a ação do Espírito livre no
espaço; é a natureza das forças de que ele dispõe.

Com os estudos espíritas uma nova ciência se vai formando lentamente, mas é
preciso aliar ao espírito de investigação científica a elevação de pensamento, o
sentimento, os impulsos do coração, sem o que a comunhão com os seres superiores
se torna irrealizável, e nenhum auxílio de sua parte, nenhuma proteção eficaz se
obterá. Ora, isso é tudo na experimentação. Não há possibilidade de êxito, nem
garantia de resultado sem a assistência e proteção do Alto, que se não obtém
senão mediante a disciplina mental e uma vida pura e digna.

Deve todo adepto saber que a regra por excelência das relações com o
invisível é a lei das afinidades e atrações. Nesse domínio, quem procura baixos
objetivos os encontra, e com eles se rebaixa: aquele que aspira às remontadas
culminâncias, cedo ou tarde as atinge e delas faz pedestal para novas ascensões.
Se desejais manifestações de ordem elevada, fazei esforços por elevar-vos a vós
mesmos. O bom êxito da experimentação, no que ela tem de belo e grandioso – a
comunhão com o mundo superior – não o obtém o mais sábio, mas o mais digno, o
melhor, aquele que tem mais paciência e consciência e mais moralidade.

Com o cercearem o Espiritismo, imprimindo-lhe caráter exclusivamente
experimental, pensam alguns agradar ao espírito positivo do século, atrair os
sábios ao que se denomina de Psiquismo. Desse modo, o que sobretudo se consegue
é pôr-se em relação com os elementos inferiores do Além, com essa multidão de
Espíritos atrasados, cuja nociva influência envolve, oprime os médiuns, os
impele à fraude e espalha sobre os experimentadores eflúvios maléficos e, com
eles, muitas vezes, o erro e a mistificação.

Numa ânsia de proselitismo, sem dúvida louvável quanto ao sentimento que a
inspira, mas excessiva e perigosa em suas conseqüências, desejam-se os fatos a
todo o custo. Na agitação nervosa com que se busca o fenômeno, chega-se a
proclamar verdadeiros os fatos duvidosos ou fictícios. Pela disposição de
espírito mantida nas experiências, atraem-se os Espíritos levianos, que em torno
de nós pululam. Multiplicam-se as manifestações de mau gosto e as obsessões das
energias que supõem dominar. Muitíssimos espíritas e médiuns, em conseqüência da
falta de método e de elevação moral, se tornam instrumentos das forças
inconscientes ou dos maus Espíritos.

São numerosos os abusos, e neles acham os adversários do Espiritismo os
elementos de uma crítica pérfida e de uma fácil difamação.

O interesse e a dignidade de uma causa impõe o dever de reagir contra essa
experimentação banal, contra essa onda avassaladora de fenômenos vulgares que
ameaçam submergir as culminâncias da idéia.


(1) Nota do GEAE – O subtítulo do livro é “Espiritismo e
Mediunidade” e o detalhamento dos temas abordados:

  • Incorporações e materializações de Espíritos;
  • Métodos de Experimentação;
  • Formação e direção dos grupos;
  • Identidade dos Espíritos;
  • A mediunidade através dos tempos;

(2) Nota do GEAE – O Livro “No Invisível” de Léon Denis foi
editado cerca de 50 anos depois das manifestações de Hydesville, EUA, que a
partir de 1848 inauguraram uma nova fase nas comunicações entre o mundo material
e o espiritual.

(3) Notas do Editor do Livro (Lethielleux, Paris, França)-
Veja-se a obra de Monsenhor Choliet, bispo de Verdun, “Contribuição do ocultismo
à antropologia”.

(Publicado no Boletim GEAE Número 346 de 25 de maio de 1999)