Auta de Souza
Nasceu em Macaíba, então Arraial, depois cidade do Rio Grande do Norte a 12
de setembro de 1876, era magrinha, calada, de pele clara, um moreno doce à vista
como veludo ao tato. Era filha de ELOI CASTRICIANO DE SOUZA, desencarnado aos 38
anos de idade e de Dona HENRIQUETA RODRIGUES DE SOUZA, desencarnada aos 27 anos,
ambos tuberculosos. Antes dela ter completado 3 anos ficou órfã de mãe e aos 4
anos de pai. A sua existência, na terra foi assinalada por sofrimentos acerbos.
Muito cedo conheceu a orfandade e ainda menina, aos dez anos, assistiu a morte
de seu querido irmão IRINEU LEÃO RODRIGUES DE SOUZA, vitimado pelo fogo
produzido pela explosão de um lampião de querosene, na noite de 16 de fevereiro
de 1887.
Auta de Souza e seus quatro irmãos foram criados em Recife no velho sobrado
do Arraial, na grande chácara, pela avó materna Dona SILVINA MARIA DA CONCEIÇÃO
DE PAULA RODRIGUES, vulgarmente chamada Dindinha e seu esposo FRANCISCO DE PAULA
RODRIGUES, que desencarnou quando Auta tinha 6 anos.
Antes dos 12 anos, foi matriculada no Colégio São Vicente de Paulo, no bairro
da Estância, onde recebeu carinhosa acolhida por parte das religiosas francesas
que o dirigiam e lhe ofereceram primorosa educação: Literatura, Inglês, Música,
Desenho e aprendeu a dominar também o Francês, o que lhe permitiu ler no
original: Lamartine, Victor Hugo, chateubriand, Fénelon.
De 1888 a 1890, a jovem Auta estuda, recita, verseja, ajuda as irmãs do
Colégio, aprimora a beleza de sua fé, na leitura constante do Evangelho.
Aos 14 anos, ainda no Educandário Estância, em 1890, manifestaram-se os
primeiros sintomas da enfermidade que lhe roubou, em plena juventude, o viço e
foi a causa de sua morte, ocorrida na madrugada de 7 de fevereiro de 1901 –
Quinta-feira à uma hora e quinze minutos, na cidade de Natal, exatamente com 24
anos, 4 meses e 26 dias de idade. Os médicos nada puderam fazer e Dindinha
retornou com todos para a terra Norte-Rio Grandense. Ei-los todos em Macaíba.
Foi sepultada no cemitério do Alecrim e em 1906, seus restos mortais foram
transladados para o jazigo da família, na Igreja de Nossa Senhora da Conceição,
em Macaíba, sua terra natal.
O forte sentimento religioso e mesmo a doença não impediram de ter uma vida
absolutamente normal em sociedade.
Era católica, mas não submissa ao clero. Ela não se macerou, não sarjou de
cilícios a pele, não jejuou e jamais se enclastou. Era comunicativa, alegre,
social. A religiosidade dela era profunda, sincera, medular, mas não ascética,
mortificante, mística. Seu amor por Jesus Cristo, ao Anjo da Guarda, não a
distanciaram de todos os sonhos das donzelas: Amor, lar, missão maternal. Com 16
anos, ao revelar o seu invulgar talento poético, enamorou-se do jovem Promotor
Público de Macaíba, João Leopoldo da Silva Loureiro, com a duração apenas de um
ano e poucos meses.
Dotada de aguda sensibilidade e imaginação ardente dedicava
ao namorado amor profundo, mas a tuberculose progredia e seus irmãos
convenceram-na a renunciar. A separação foi cruel, mas apenas para Auta. O
Promotor não demonstrou a menor reação…. É verdade que gostava de ouvi-la nas
festas caseiras a declamar com sua belíssima voz envolvente, aveludada e com ela
dançar quadrilhas, polcas e valsas, mas não era o homem indicado para amar uma
alma tão delicada e sonhadora como Auta de Souza. Faltava-lhe o refinamento
espiritual para perceber o sentimento que extravasava através dos olhos meigos
da grande Poetisa.
Essa sucessão de golpes dolorosos, marcou profundamente sua alma de mulher,
caracterizada por uma pureza cristalina, uma fé ardente e um profundo sentimento
de compaixão pelos humildes, cuja miséria tanto a comovia. Era vista lendo para
as crianças pobres, para humildes mulheres do povo ou velhos escravos, as
páginas simples e ingênuas da “História de Carlos Mágno”, brochura que corria os
sertões, escrita ao gosto popular da época.
A orfandade da Poetisa ainda criança, o desencarne trágico de seu irmão, a
moléstia contagiosa e a frustração no amor, esses quatro fatores amalgamados à
forte religiosidade de Auta, levaram-na a compor uma obra poética singular na
História da Literatura Brasileira “Horto”, seu único livro, é um cântico de dor,
mas, também, de fé cristã. A primeira edição do Horto saiu do prelo em 20 de
Junho de 1900.
O sofrimento veio burilar a sua inata sensibilidade, que transbordou em
versos comovidos e ternos, ora ardentes, ora tristes, lavrados à sombra da
enfermidade, no cenário desolador do sertão de sua terra.
Em 14 de novembro de 1936, houve a instalação da Academia Norte-Rio Grandense
de Letras, com a poltrona XX, dedicada a Auta de Souza.
Livre do corpo, totalmente desgastado pela enfermidade, Auta de Souza,
irradiando luz própria, lúcida e gloriosa alçou vôo em direção à Espiritualidade
Maior. Mas a compaixão que sempre sentira pêlos sofredores fez com que a poetisa
em companhia de outros Espíritos caridosos, visitasse, constantemente a crosta
da terra. Foi através de Chico Xavier, que ela, pela primeira vez revelou sua
identidade, transmitindo suas poesias enfeixadas em 1932, na primeira edição do
“PARNASO DE ALÉM TÚMULO”, lançado pela Federação Espírita Brasileira.
Em sua existência física, Auta de Souza foi a AVE CATIVA que cantou seu
anseio de liberdade; o coração resignado que buscou no Cristo o consolo das
bem-aventuranças prometidas aos aflitos da terra. Além do túmulo, é o pássaro
liberto e feliz que, tornado ao ninho dos antigos infortúnios, vem trazer aos
homens a mensagem de bondade e esperança, o apelo à FÉ e a CARIDADE, indicando o
rumo certo para a conquista da verdadeira vida.
A Campanha de Fraternidade Auta de Souza, idealizada pelo companheiro Nympho
de Paula Corrêa e aprovada em 3 de fevereiro de 1953, pelo Departamento de
Assistência Social da Federação Espírita do Estado de São Paulo, então dirigido
pelo saudoso confrade José Gonçalves Pereira, é uma bela homenagem à nossa
querida Poetisa, AUTA DE SOUZA.