Como você sairia desta saia justa?
Você está tranqüilo, relaxado, sem a mínima preocupação de que possa ser envolvido em situações embaraçosas. De repente, sem mais nem menos, lá está você num beco sem saída, vestindo uma belíssima saia justa novinha em folha.
Por mais que sejamos precavidos, por melhor que possamos planejar as nossas ações não tem como evitar – um belo dia o anjo da guarda dos Kennedy resolve nos amparar e a desgraça está feita.
Calma, não fique desesperado, pois sempre tem uma saída para essas armadilhas, por pior que possam parecer à primeira vista.
Vamos analisar algumas situações que podem nos surpreender e nos deixar em posição desconfortável.
- Toca um celular
Quase todo mundo tem um celular. Dê uma olhadinha na mesa dos boys que fica na salinha do fundo da empresa, sempre encontrará uns dois ou três celulares ligados na tomada para carregar.
Ora, se todo mundo tem, a chance de que um deles comece a tocar no meio da apresentação é muito grande.
Eu me lembro quando começou essa história do celular e as pessoas o usavam como sinal de status, só para mostrar que estavam na ponta da tecnologia.
Nessa época tive um aluno no nosso curso de expressão verbal que freqüentava as turmas das terças-feiras.
Não falhava uma semana, todas as terças lá pelas dez e vinte, dez e vinte e cinco da noite tocava o celular do cidadão e ele prontamente atendia no meio da aula, sempre com a mesma informação:
— Sim querida, estou aqui sim no curso do Polito.
Na semana seguinte na mesma bat hora a cena se repetia como se fosse um videoteipe. Ocorre que também participava desta turma o Ricardo, aquele que fazia o papel do marido naquela propaganda de margarina, em que a mulher fazia caretas na rua para mostrar a ele que ainda era paquerada. O Ricardo é uma pessoa carismática, tem presença de espírito pronta, alegre, é um tremendo gozador e se sentava bem atrás do homem do celular. Toca uma semana, toca duas, toca três, até que o Ricardo não agüentou e numa terça-feira, quando o colega dava a informação habitual de que estava no curso do Polito, por trás, ele enfiou a cabeça por cima do ombro do aluno que falava com a esposa e disse em voz bem alta:
— Por favor, fecha a mesa doze para mim.
A partir daquele dia nunca mais tocou o celular do colega – a esposa passou a esperá-lo na recepção da escola.
No meu caso essa é a minha saída. Quando estou fazendo uma palestra e toca um celular na platéia conto a história do Ricardo e se mais algum tocar vou brincando com o auditório, como se fosse o Ricardo falando – fecha a mesa doze para mim. O importante é não demonstrar contrariedade se o fato ocorrer. Nada de agir como alguns que chegam a parar a apresentação para censurar a pessoa que deixou tocar o celular. Estragam o desenvolvimento da mensagem, fazem papel antipático e só agravam a situação.
Pegue leve, brinque com os ouvintes. Assim, sem humilhar ninguém você demonstra simpatia, presença de espírito, bom humor e sutilmente dá o recado para que os outros desliguem seus aparelhos. - Falar de improviso? Eu?
O meu querido amigo Antonio Carlos de Souza Ramos conta que certa vez, numa cidadezinha do sul de Minas Gerais, foi convidado por um parente para ir a uma solenidade. Durante o evento, como não estava envolvido com os assuntos tratados, desligou-se do ambiente e passou a pensar nos seus compromissos do dia seguinte. Sem que nada tivesse sido combinado, o presidente da reunião foi para o microfone e disse:
— É com muito prazer que convidamos para vir à nossa tribuna e deixar a sua mensagem o Dr. Antonio Carlos de Souza Ramos.
Como estava com o pensamento meio distante falou consigo mesmo:
— Engraçado, esse cara que vai falar tem o mesmo nome que eu. Só então é que saltou da cadeira e se deu conta de que se tratava dele mesmo.
Por mais remota que possa ser a possibilidade de sermos chamados para falar durante um evento, sempre devemos nos preparar para essa eventualidade. Se mesmo assim o apanharem desprevenido, a saída para discorrer sobre um tema de improviso é começar a falar antes sobre assuntos que domina com profundidade, como os que estão relacionados à sua atividade profissional, ao seu hobby, àquela notícia que está acompanhando atentamente, ao fato que presenciou, a um trecho do livro ou à cena de um filme que o tocou.
Assim, enquanto discorre sobre as informações que conhece bem, conseguirá planejar melhor a seqüência da exposição. Como os ouvintes recebem a apresentação como sendo uma só desde o princípio até o final, ao demonstrar desenvoltura e convicção sobre a parte do discurso que tem domínio, a platéia terá a impressão de que conhece o assunto todo, quando na verdade poderá ter muitas informações do que falou no início e talvez poucas do tema para o qual foi convidado a falar. - Cai a bandeja
Os oradores mais experimentes ao invés de se aborrecerem quando um acidente ocorre enquanto estão falando, até torcem para que esses fatos aconteçam.
Ficou famoso o episódio em que o ex-presidente americano Ronald Reagan estava fazendo uma palestra e a sua esposa Nancy, toda saltitante foi se sentar numa cadeira que estava na frente da platéia. Sem tomar cuidado, meio desastrada, sentou-se de mau jeito, a cadeira virou e ela se estatelou no chão, com as pernas para o ar.
Já imaginou a cena? Você falando numa solenidade importante e a sua esposa ali no chão com as pernas expostas para os fotógrafos?
Reagan não se abalou, percebendo que não tinha ocorrido nada grave e que depois de acudida a esposa estava sorrido, aproveitou-se da desgraça e a transformou num fato bem humorado. Disse mais ou menos assim:
— Combinei com a minha mulher que se eu não estivesse agradando ela usaria esse recurso para motivar a platéia, mas não pensei que fosse acontecer tão cedo assim. A platéia explodiu em gargalhadas e a situação foi muito bem contornada.
Se uma tragédia dessa natureza ocorrer durante a sua apresentação não entre em pânico, brinque com a platéia, procure fazer uma autogozação e conquistará a simpatia e a solidariedade dos ouvintes. Com o tempo você também estará torcendo para que um garçom desajeitado entre na sala derrubando a bandeja com os copos. - Deu o branco
Tudo está indo muito bem. As idéias estão concatenadas, o vocabulário fluente, os pensamentos organizados e num determinado momento, sem motivos aparentes, a palavra não aparece e o raciocínio não consegue prosseguir – deu o branco na comunicação. Ninguém está livre desse embaraço. Até os oradores mais traquejados, vez ou outra são surpreendidos por esse terrível adversário.
Se ocorrer o branco procure manter a tranqüilidade e haja da seguinte maneira: - Insista apenas uma vez para tentar descobrir qual é a palavra ou informação de que está precisando, se não encontrar nessa primeira tentativa não persista, pois poderá começar a se pressionar e ficará ainda mais nervoso.
- A tática é repetir a última frase, de preferência com palavras diferentes, falando com mais energia, como se quisesse dar ênfase àquela mensagem. Ao chegar no ponto onde o branco tinha ocorrido provavelmente a informação aparecerá.
- Se mesmo assim não conseguir se lembrar do que deveria dizer, continue calmo e diga aos ouvintes que mais à frente voltará a comentar sobre o assunto. É quase certo que sem a pressão do momento do branco e mais tranqüilo irá se lembrar da informação. Caso não se lembre, nada de mau ocorrerá, pois a platéia não irá cobrar essa mensagem dizendo – “Você disse que voltaria a falar sobre esse tema e não voltou”. Na verdade, os ouvintes imaginarão que eles é que não entenderam bem a informação.
- Finalmente, você poderá usar uma expressão que quase sempre dá excelente resultado – se der o branco diga: “na verdade o que eu quero dizer é que”. Faça o teste e verifique como a necessidade de explicar a informação de outra maneira acaba trazendo a mensagem à tona novamente.
- Se você sempre se preocupa em esquecer a seqüência da apresentação faça um roteiro com todas as etapas que pretende cumprir, assim, se não se lembrar de alguma poderá consultar os tópicos relacionados. Só o fato de saber que poderá contar com o roteiro provavelmente não se esquecerá de nada.
- Por esta pergunta eu não esperava
Cuidado com essa filosofia de sinceridade que recomenda ao orador confessar que não sabe a resposta para as perguntas que não souber responder. Essa atitude, em algumas circunstâncias, poderá comprometer a imagem do orador e pior, desmotivar os ouvintes que teriam muito a ganhar se continuassem acompanhando a exposição.
É evidente que você jamais deverá inventar respostas, pois se for apanhado na mentira jogará por terra sua credibilidade. Mas antes de usar o último recurso, que é o de dizer que não sabe a resposta, alguns procedimentos poderão ser adotados:- Descubra o motivo da pergunta
Um ouvinte formula uma pergunta por alguns motivos: - Por dúvida – quando não compreende perfeitamente o que está sendo transmitido;
- Por vontade de aprender – quando assimila as informações fornecidas, mas deseja saber mais sobre o assunto;
- Por necessidade de se destacar no ambiente – quando deseja ser notado pelas outras pessoas, não importando o fato de ter entendido ou não a mensagem;
- Para provocar – quando deseja atrapalhar a apresentação por causa da hostilidade que nutre contra o tema ou contra o orador;
- Para testar os conhecimentos de quem fala – quando deseja certificar-se da segurança do orador sobre a matéria.
- Se concluir que o motivo da pergunta é para demonstrar conhecimento, destacar-se no ambiente, provocar ou testar seus conhecimentos, uma boa saída é devolver a questão ao interlocutor.
Por exemplo: O que você pensa a respeito? Existe boa possibilidade de receber a resposta da própria pessoa que formulou a pergunta. Se ela não souber use a alternativa seguinte. - Se verificar que a pergunta foi formulada por dúvida ou vontade de aprender, poderá devolvê-la ao grupo.
Por exemplo: O que vocês pensam a respeito desta questão? Haverá boa chance de que alguém ajude com a resposta. Pelo fato do tema ser familiar, qualquer dica poderá ser suficiente para que você encontre uma saída para o problema. Se mesmo assim ninguém conseguir responder, você dividirá a responsabilidade com o grupo e se colocará à disposição para pesquisar a resposta, preservando assim a sua imagem.
Mas atenção, se julgar que o momento é desfavorável para adotar essas táticas e que durante a exposição poderá encontrar a resposta, diga ao grupo que mais à frente voltará ao assunto. Dificilmente alguém iria discordar e você ganharia tempo para dar uma resposta mais apropriada, ou até para no final, a sós com quem fez a pergunta dizer que irá procurar a resposta. Agora, se concluir que esse caminho não será apropriado para a circunstância, use o último recurso – confesse que não sabe a resposta.
- Descubra o motivo da pergunta
- Essa pergunta foi provocativa
Se um ouvinte tentar agredi-lo com uma pergunta provocativa, não perca a calma e muito menos reaja emocionalmente.
Ao fazer a pergunta agressiva ele estará fazendo o papel do bandido e você será a vítima. Essa sua condição de agredido conquistará a solidariedade dos ouvintes. Se você reagir com agressão os papéis se inverterão. O ouvinte passará a ser a vítima e você o bandido.
Por isso, por mais agressiva que tenha sido a atitude do ouvinte, não demonstre aborrecimento ou contrariedade, para continuar tendo a vantagem da situação.
Assim que perceber que se trata de uma provocação sorria para o ouvinte. Esse comportamento demonstrará que você percebeu a intenção do ouvinte, mas que está tranqüilo, sem se abalar, pois os ataques são gratuitos e sem fundamento.
Em seguida agradeça a oportunidade que ele está proporcionando para que você esclareça o assunto que é tão relevante. Ao demonstrar que está satisfeito com a chance de falar sobre o tema deixará claro que não tem nada a temer.
Finalmente, antes de iniciar a resposta, procure parafrasear a pergunta, eliminando, ou pelo menos reduzindo a sua agressividade.
Por exemplo, se alguém perguntar porque as vendas caíram tanto depois que você assumiu a direção comercial da empresa, poderá parafrasear a pergunta dirigindo-se à platéia, e não à pessoa que a formulou, dizendo: — O que está sendo perguntado é como se deu a minha promoção como diretor comercial e qual o comportamento do mercado consumidor para o nosso segmento de produtos. Desta forma a provocação da pergunta teria sido afastada e você poderia falar sobre cada uma das partes da questão como se fossem independentes. - Bateu o nervosismo
Se você ficar nervoso no momento de falar comece a desconfiar que pertence ao clube dos seres humanos. É perfeitamente normal que você sinta o nervosismo no momento de falar. Por isso, se ficar nervoso saiba que é natural e não entre em pânico. Algumas pessoas ficam desesperadas quando percebem que estão nervosas, como se o fato fosse anormal.
O nervosismo é maior no início quando ocorre a descarga de adrenalina provocada pelo medo. Com o transcorrer do tempo a adrenalina vai sendo metabolizada e o nervosismo diminui. Se você se surpreender e se assustar com o nervosismo irá se pressionar ainda mais e realimentar o medo.
Procure se movimentar na sala para se dirigir à frente do grupo. O movimento do corpo ajudará a queimar a adrenalina.
Não tenha pressa de iniciar, respire com a maior calma que puder, ajeite as folhas com as anotações que pretende usar e acerte a altura do microfone. Esses instantes iniciais são preciosos para conquistar um pouco de tranqüilidade.
Comece falando um pouco mais baixo e devagar, para que a instabilidade provocada pelo nervosismo não seja percebida pela platéia. Cumprimente as pessoas devagar, pausadamente, para regular a respiração e se acostumar com o som da própria voz.
Esses cuidados aliados a um bom conhecimento do assunto e a correta ordenação das informações ajudarão a combater o nervosismo inicial. - Desculpe a nossa falha
Se eventualmente cometer um engano, deve corrigir o erro ou continuar falando?
Depende do tipo de erro cometido.
Se transmitir uma informação incorretamente e este fato prejudicar a compreensão do auditório, deverá corrigir o erro.
Se pronunciar de maneira equivocada uma determinada palavra e essa falha não provocar prejuízo no entendimento da platéia deverá continuar falando sem se interromper.
Mais uma vez é preciso dedicar cuidado especial à sua imagem. Embora não ocorra prejuízo na compreensão da platéia, os ouvintes poderão acreditar que a palavra foi pronunciada incorretamente por desconhecimento do orador; assim, é recomendado encontrar uma forma de encaixar a mesma palavra em uma das frases seguintes, para demonstrar que se tratou mesmo de um engano. - Deu problema no equipamento
Mesmo testando tudo com bastante antecedência, os problemas com equipamentos podem surgir. Às vezes é o microfone que não funciona, em outra oportunidade é a lâmpada do projetor que queimou, ou a configuração do computador que não é compatível com o sistema de multimídia.
Primeiro conselho – não fique zangado com o responsável pelo som. Se quebrar essa regra passará uma imagem antipática, desagradável, não ajudará a resolver o problema e ainda provocará a má vontade do profissional que se sentirá ferido no seu orgulho.
Planeje sua apresentação também com outros recursos e até sem nenhum deles. Por exemplo, se você pretende usar o power point, não custa nada reproduzir as telas do programa também em transparência e deixá-las de reserva para uma eventualidade. Sempre poderá contar com um aparelho de retroprojeção para contornar o transtorno de uma falha no equipamento.
Além de transparência procure planejar também a apresentação sem nenhum visual. É difícil acontecer que nada funcione, mas não é impossível – aí você contará só com você mesmo.
Se o microfone estiver falhando ou tiver qualidade muito ruim, e a platéia não for muito numerosa, com até cem pessoas, e a exposição não for muito longa, menos de uma hora, não hesite, abandone o microfone e use os pulmões. Se a sua voz for forte agüentará bem e será mais vantajoso. - Esse eu não posso esquecer
Principalmente quando uma reunião se reveste de caráter político, o objetivo das pessoas que comparecem à solenidade quase sempre é o de ouvir o próprio nome ser mencionado. Se essa expectativa for frustrada poderá produzir ressentimentos. Será muito pior ainda se alguns forem mencionados e outros não.
Nessas situações certifique-se mais de uma vez de que todos estão na sua lista e se os nomes foram escritos corretamente.
Se o número de pessoas for muito elevado você poderá usar uma técnica semelhante a que foi utilizada pelo meu amigo Nei Gonçalves Dias.
Ele era o mestre de cerimônia no evento em que estava sendo homenageado o empresário Guilherme Afif Domingos, numa reunião bastante concorrida. Mais de duas mil pessoas compareceram ao Hotel Maksoud Plaza em São Paulo, representando a nata da sociedade.
O risco de que alguém importante fosse esquecido era muito grande, e para evitar qualquer constrangimento Nei Gonçalves Dias usou uma estratégia genial: – Disse que mais de setenta por cento do produto interno do país estavam reunidos naquela solenidade e que, portanto, todas as suas excelências deveriam se considerar cumprimentadas. O público riu, suas excelências consideraram-se cumprimentadas e, quem não era excelência também gostou de ter recebido o tratamento.
Reinaldo Polito
Revista Vencer nº 10
Esses e outros conceitos são desenvolvidos no curso de expressão verbal ministrado pelo Professor Reinaldo Polito.
“Permitida a reprodução desde que citada a fonte – www.polito.com.br”