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O Orador e o Símbolo

O Orador e o Símbolo

 

A maior parte dos aspectos do simbolismo do fogo está resumida na doutrina
hindu, que lhe confere fundamental importância. O fogo é o símbolo divino
essencial do Masdeísmo. O Buda substitui o fogo sacrificial do hinduísmo pelo
fogo interior, que é, ao mesmo tempo, conhecimento penetrante, iluminação e
destruição do invólucro. O aspecto destruidor do fogo implica também,
evidentemente, um lado negativo; e o domínio do fogo é igualmente uma
função diabólica. A propósito da forja, deve-se observar que seu fogo é a um só
tempo celeste e subterrâneo, instrumento de demiurgo e de demônio. A queda de
nível é representada por Lúcifer, portador da luz celeste, no
momento em que é precipitado nas chamas do inferno: fogo que queima sem
consumir, embora exclua para sempre a possibilidade de regeneração (AVAS, BHAB,
COOH, GOVM, HERS, SAIR) O fogo, na qualidade de elemento que queima e consome, é
também símbolo de purificação e de regenerescência. Reencontra-se, pois, o
aspecto positivo da destruição: nova inversão do símbolo. Todavia, a água é
também purificadora e regeneradora. Mas o fogo distingue-se da água porquanto
ele simboliza a purificação pela compreensão, até a mais espiritual de suas
formas, pela luz e pela verdade; ao passo que a água simboliza a purificação do
desejo, até a mais sublime de suas formas — a bondade
(DIES, 37-38)
(1)

GNOMOS

Gênios de pequeno tamanho, que, segundo a Cabala, habitariam debaixo da terra
e seriam donos dos tesouros de pedras e metais preciosos. A lenda dos gnomos
passou do Oriente para a Escandinávia e para a América Central. Simbolizariam o
ser invisível, que, por inspiração, intuição, imaginação e sonho, faz visíveis
os objetos invisíveis. Na alma do homem eles são como que lampejos de
consciência, de iluminação e de revelação. São como que a alma oculta das
coisas, orgânicas ou não; e quando eles se retiram, as coisas morrem ou ficam
inertes e tenebrosas. O gnomo pode amar e odiar sucessivamente o mesmo ser.
Pouco a pouco, na imaginação popular, assumiu a figura de um anão feio e
disforme, malicioso e perverso. Em troca, sua mulher, ainda menor que ele, era
de extraordinária beleza e trazia babuchas nos pés: uma de rubis, outra de
esmeralda. O casal, ou gnomo desdobrado em complexo masculino e feminino,
simboliza a aliança em todo ser de um lado feio e um lado belo, de um lado mau e
um lado bom, de um lado terroso e outro cheio de luz. Trata-se, sem dúvida, de
uma imagem dos estados de consciência, complexos e fugidios, em que coexistem
ignorância e conhecimentos, riqueza e pobreza morais: exemplos da coincidência
dos contrários, de conhecimento mantido em segredo ou ocultado.
(1)

INFERNO (Hades)

Sobre esse tema, as crenças antigas — egípcias, gregas, romanas — variavam
muito; e mesmo na Antigüidade já eram numerosas; por isso, aqui mencionaremos
apenas o que julgamos essencial. Entre os gregos, Hades, o Invisível —
segundo etimologia duvidosa — é o deus dos mortos. Como ninguém ousasse
pronunciar-lhe o nome, por temor de lhe excitar a cólera, ele recebeu o apodo de
Plutão (o Rico), nome que implica um terrível sarcasmo, mais do que um
eufemismo, para designar as riquezas subterrâneas da terra, entre as quais se
encontra o império dos mortos. E esse sarcasmo torna-se macabro quando se coloca
uma cornucópia entre os braços de Plutão. Na simbologia, entretanto, o
subterrâneo é o local das ricas jazidas, o lugar das metamorfoses, das passagens
da morte à vida, da germinação. Após a vitória do Olimpo sobre os Titãs, foi
feita a partilha do universo entre os três irmãos, filhos de Cronos e de Réia: a
Zeus coube o Céu; a Poseidon (Netuno), o Mar; a Hades, o mundo subterrâneo,
os Infernos ou o Tártaro
. Senhor impiedoso, tão cruel quanto Perséfona, sua
sobrinha e esposa, ele não dá trégua a nenhum de seus súditos (ou vítimas). Seu
nome foi dado ao lugar por ele dominado; Hades tornou-se símbolo dos
Infernos. E, ainda nesse caso, as características são as mesmas por toda parte:
lugar invisível, eternamente sem saída (salvo para os que acreditavam nas
reencarnações), perdido nas trevas e no frio, assombrado por monstros e
demônios, que atormentam os defuntos (GRID). Na tradição cristã, a conjunção
luz-trevas simbolizaria os dois opostos: o céu e o inferno. Plutarco já
descrevia o Tártaro como privado de sol. se a luz se identifica com a vida e com
Deus, o inferno significa a privação de Deus e da vida. A essência íntima do
inferno é o próprio pecado mortal, em que os danados morreram
(ENCF, 470). É
a perda da presença de Deus; e, como já nenhum outro bem poderá jamais iludir a
alma do defunto, separada do corpo e das realidades sensíveis, o inferno é a
desventura absoluta, a privação radical, tormento misterioso e insondável
de uma existência humana. A conversão do danado já não é mais possível;
empedernido em seu pecado, ele está para sempre cravado na sua dor.
(1)

O JUGO

Jugo – do
hebreu môt , ôl – significa peça de madeira que serve para
emparelhar dois animais para o mesmo trabalho. Era proibido prender sob um
mesmo jugo dois animais de espécies diferentes.

Dava-se esse nome a uma medida agrária equivalente à superfície que um par de
bois podia lavrar num dia. O jugo usado na Antiga Palestina era igual ao
que ainda hoje se usa. Consistia em uma pesada barra de madeira posta nos ombros
dos animais de tiro (bois ou burros), presa ao animal por uma cravelha, corda e
correias, que passavam em redor dos chifres e debaixo do pescoço. Uma correia
maior juntava o jugo com o cabo. (MACKENZIE, 1984) O jugo, por um motivo
perfeitamente evidente, é símbolo de servidão, de opressão, de constrangimento.
A passagem dos vencidos sob o jugo romano é suficientemente explícita.
Mas o jugo assume sentido completamente diverso no pensamento hindu. A raiz
indo-européia yug, de que deriva, é objeto de uma aplicação muito
conhecida do sânscrito yoga, que tem efetivamente, o sentido de unir,
juntar, por debaixo do jugo. É, por definição, uma
disciplina de meditação, cujo objetivo é a harmonização, a unificação do
ser, a tomada de consciência e, finalmente, a realização da única União
verdadeira, a da alma com Deus, da manifestação com o Princípio. O inventor do
jugo, que permite dominar e atrelar os bois, Buziges, foi também um dos
primeiros legisladores. O jugo simboliza a disciplina de duas maneiras: ou ela é
sofrida de modo humilhante, e é o aspecto sombrio do símbolo (cf. o famoso
exemplo das forcas caudinas, jugum ignominiosum, lança posta sobre duas
outras fincadas na terra e sob a qual passou o exército romano vencido pelos
samnitas); ou a disciplina é escolhida voluntariamente e conduz ao domínio de
si, à unidade interior à união com Deus. Existia em Roma um lugar, dito
sororium tigillum
, onde estava instalada uma trave em asna debaixo da
qual passavam os assassinos para expiar seu crime. Depois de matar sua irmã
Camila, que saíra, impudica dos apartamentos das mulheres para declarar em altos
brados seu amor pelo inimigo do irmão, Horácio foi forçado a passar sob o jugo.
Essa prática expiatória e purificadora era indispensável para recuperar o seu
lugar na coletividade. Cumpria passar sob o jugo. Mas essa disposição ancestral
do jugo significava mais que um ato de submissão às leis da cidade. Era, sem
dúvida, escreve Jean Beaujeu, um vestígio das portas secretas ou arficiais
pelas quais o moço, uma vez iniciado, passava de volta, do mundo sobrenatural
onde vivera seu período de prova, ao mundo ordinário dos homens. Era, então, o
símbolo da
reintegração na sociedade. (1)

LUZ

Em numerosos casos, as fronteiras ficam indecisas entre a luz-símbolo e a
luz-metáfora. Por exemplo, pode-se perguntar se a luz, aspecto final da
matéria que se desloca com uma velocidade limitada, e a luz de que falam os
místicos têm alguma coisa em comum, a não ser o fato de serem um
limite
ideal de um resultado
(VIRI, 259). Vai-se na direção do símbolo, por outro
lado, quando se considera a luz como um primeiro aspecto do mundo informe.
Embrenhando-se na sua direção, entra-se num caminho que parece poder levar
além da luz, isto é, além de toda forma, mas, igualmente, além de toda a
sensação e de todo conceito
(VIRI, 265 s.: a saída do Imaginário e a
experiência da luz). A luz é relacionada com a obscuridade para simbolizar os
valores complementares ou alternantes de uma evolução. Essa lei se verifica nas
imagens da China arcaica, bem como nas de numerosas civilizações. Sua
significação é que, assim como acontece na vida humana em todos os seus níveis,
uma época sombria é seguida, em todos os planos cósmicos, de uma época
luminosa, pura, regenerada. Expressões como luz divina ou
luz espiritual deixam transparecer o conteúdo de um simbolismo muito rico
no Extremo Oriente. A luz é o conhecimento: a dupla acepção existe
igualmente na China para o caráter ming, que sintetiza as luzes do Sol e
da Lua; ele tem, para os budistas chineses, o sentido de iluminação; no
Islão, En-Nur, a Luz, é essencialmente o mesmo que Er-Ruh, o
Espírito. A luz simboliza constantemente a vida, a salvação, a felicidade
dadas por Deus (Salmos 4, 7: 36, 10; 97, 11; Isaías 9, 1) que é
ele próprio a luz (Salmos 27, 1; Isaías 60, 19-20). A lei de Deus
é uma luz sobre o caminho dos homens (Salmos, 119, 105); assim também sua
palavra (Isaías 2, 3-5). O Messias também traz a luz (Isaías 42,
6, Lucas 2, 32). As trevas são por corolário, símbolo do mal, da
infelicidade, do castigo, da perdição e da morte
( 18, 6, 18;
Amos
5, 18). Os símbolos cristãos não fazem mais do que prolongar essas
linhas. Jesus é a luz do mundo (João 8, 12; 9, 5); os crentes devem ser
assim também (Mateus 5, 14), tornando-se os reflexos da luz de Cristo (II
Coríntios 4, 6) e agindo de acordo com ela (Mateus 5, 16).

MONTANHA

O simbolismo da montanha é múltiplo: prende-se à altura e ao centro. Na
medida em que ela é alta, vertical, elevada, próxima do céu, ela participa do
simbolismo da transcendência; na medida em que é o centro das hierofanias
atmosféricas e de numerosas teofanias, participa do simbolismo da manifestação.
Ela é assim o encontro do céu e da terra, morada dos deuses e objetivo da
ascensão humana. Vista do alto, ela surge como a ponta de uma vertical, é o
centro do mundo; vista de baixo, do horizonte, surge como a linha de uma
vertical, o eixo do mundo, mas também a escada, a inclinação a escalar. A
montanha exprime ainda as noções de estabilidade, de imutabilidade, às vezes,
até mesmo de pureza. Na mitologia taoísta, os Imortais iam viver sobre uma
montanha, que era chamada A Montanha do Meio Mundo, em torno do qual
giravam o Sol e a Lua. O simbolismo mitológico da montanha primordial ou cósmica
encontra certo eco no Antigo Testamento. As altas montanhas, lembrando
fortalezas, são símbolos de segurança (Salmos 30, 8). Deve-se lembrar o
sermão sobre a montanha (Mateus 5, 1 s.) que, sem dúvida, na nova
aliança, responde à lei do Sinai na antiga. Observemos ainda a descrição da
transfiguração de Jesus sobre uma alta montanha (Marcos 9, 2) e a
da ascensão sobre o monte das Oliveiras (Lucas 24, 50; Atos 1,
12). Resumindo as tradições bíblicas e as da arte cristã, que ilustram com
diversos exemplos, de Champeaux e dom Sterckx extraem três
significações simbólicas principais da montanha: 1. A montanha faz a junção
da terra ao céu
; 2. A montanha santa se situa no centro do mundo; 3.
O templo é associado a essa montanha (CHAS, 164-199).
(1)

MUNDO

O simbolismo do mundo, com os seus três níveis, celeste, terrestre e
infernal, corresponde a três níveis de existência ou a três modos da atividade
espiritual. A vida interior é assim projetada no espaço, seguindo o processo
geral de formação de mitos. Esses mundos situados em espaços imaginários
definem-se uns em relação aos outros: o mundo de baixo sob o mundo de cima,
passando pelo mundo intermediário. Apenas essa linguagem e essa localização
segundo um eixo vertical bastam para inscrever tais mundos em um movimento e uma
dialética de ascensão, que acentuam sua significação psíquica e espiritual. Do
mundo de cima, o mundo intermediário recebe a luz, que pára nele e não desce ao
mundo de baixo; mas ele não a recebe a não ser na medida de seu desejo, de sua
abertura ou de sua orientação. Ele conhece caminhos de sombras, essa fissuras
morais, simbolizadas pelas fendas nas rochas, através das quais ele escorrega
para o inferno. Segundo as concepções gregas e romanas, numerosos caminhos
ligavam os mundos terrestres e infernais, os dos vivos e os dos mortos: crateras
vulcânicas, fendas nas rochas, onde se perdem as águas, extremidades de terra.
Em contrapartida, as montanhas elevadas faziam a comunicação com o céu. Mas eles
imaginavam diversos estágios celestes e diversos abismos infernais, até o
Tártaro, que servia de prisão para os deuses destronados. Trevas, frio,
terrores, tormentos, vida empobrecida e fantasmagórica, caracterizavam os
infernos; luz, calor, alegria, liberdade, reinavam nos céus. As Ilhas
afortunadas, as moradas dos bem-aventurados, as Terras hiperbóreas eram
reservadas para os heróis e para os sábios, imagens de um céu inferior àquele
das beatitudes olímpicas, consagrado aos deuses e aos heróis divinizados. De
Homero a Aristófanes e a Virgílio e Plutarco, diversas são as descrições de
descidas aos Infernos, que testemunham com estranha fecundidade de imaginação
dos horrores e, como que com complacência, essa loucura de criações aterradoras.
(1)

PORTA

A porta simboliza o local de passagem entre dois estados, entre dois mundos,
entre o conhecido e o desconhecido, a luz e as trevas, o tesouro e a pobreza
extrema. A porta se abre sobre um mistério. Mas ela tem um valor dinâmico,
psicológico; pois não somente indica uma passagem, mas convida a atravessá-la. É
o convite à viagem rumo a um além… A passagem à qual ela convida é, na maioria
das vezes, na acepção simbólica, do domínio profano ao domínio sagrado. Assim
são os portais das catedrais, os torana hindus, as portas dos templos ou
das cidades khmers, os torii japoneses etc. Nas tradições judaicas e
cristãs, a importância da porta é imensa, porquanto é ela que dá acesso à
revelação
; sobre ela vêm se refletir as harmonias do universo. As portas
do Antigo Testamento e do Apocalipse, ou seja, o Cristo em sua majestade e o
último Julgamento, acolhem o peregrino e os fiéis. Suger dizia aos visitantes de
Saint-Denis que convinha admirar a beleza da obra realizada, e não a matéria de
que havia sido feita a porta. Ele acrescentava que a beleza que ilumina as almas
deve dirigi-las no sentido da luz, cuja porta verdadeira é Cristo. Se Cristo em
glória é representado no alto dos frontispícios das catedrais, é porque ele
próprio é, de acordo com o mistério da redenção, a porta pela qual se
chega ao Reino dos Céus: Eu sou a porta, quem entrar por Mim, será salvo
(João
10,9). (1)

BIBLIOGRAFIA

(1) CHEVALIER, J. e GHEERBRANT, A. Dicionário de Símbolos (mitos, sonhos,
costumes, gestos, formas, figuras, cores, números
). 12. ed., Rio de Janeiro,
José Olympio, 1998.

(2) MACKENZIE, J. L. (S. J.) Dicionário Bíblico. São Paulo, Edições
Paulinas, 1984.

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