congressos – simpósios – encontros – seminários
Ney Lobo
1ª – DISCREPÂNCIA
1. COMO COSTUMAM SER
- Verifica-se uma desconjunção entre a idéia central e a temática ( conteúdo ) desenvolvida. Títulos pomposos, ornamentais e líricos. São poéticos, fascinantes, até praticáveis se os temas lhes dessem objetividade, a qual, por si sós, esses emblemas não manifestam. São epígrafes que engalanam os nobres ideais imaginados pelos patrocinadores. Infelizmente, não são sequer lembrados pelos expositores durante o desenvolvimento do encontro; e, muito menos, por eles focalizados. E deviam ser.- Eis aí a discrepância !
2. RESULTADOS
- A perda da perspectiva. A dispersão da atenção e dos interesses do público. Os participantes se vêem atraídos para várias direções divergentes. Não se sentem arrebatados a um centro de concentração comum. E ainda se conscientizam de que os expositores afastam-se do epicentro, do motivo principal do encontro.
3. COMO PODERIAM SER
- Todos os temas poderiam manter o sentido da convergência para a elevada idéia central, num tropismo desejável e indescartável. Tal procedimento incutiria no evento estrutura orgânica:as partes ( temas ) formando um conjunto e dele dependentes; o todo ( idéia central ) organizando a integração dos assuntos entre si, formando um mosaico significativo e ordenado.
2ª – HETEROGENEIDADE
1. COMO COSTUMAM SER
- É o hibridismo temático – para não dizer, miscelânea – de temas desconexos, sem nenhuma ligação entre eles. Uma colcha de retalhos não-alinhavados.
- Exemplo: a reunião desconjuntada de mediunidade, serviço social, educação, medicina e saúde, obsessão, terapia de vidas passadas, transcomunicação instrumental, sexualidade, etc.
2. RESULTADOS
- Os mesmos já alinhados na 1a idéia.
3. COMO PODERIAM SER
- Se o centro de interesse é, por exemplo, educação espírita, todos os assuntos deveriam girar em torno dela: educação no lar, educação escolar, evangelização, o mestre espírita; os fins da educação espírita, etc.
3ª – TERMINALIDADE
1. COMO COSTUMAM SER
- Ausência de um fecho, de uma possível conclusão ( avaliação, mas não um julgamento ), ainda que um resumido relatório final como a culminância de todo o evento. Essa providência concorreria para o melhor aproveitamento dos esforços dispendidos.
- Todavia, o que visualizamos no final é um enorme sinal de interrogação ( ? ) estampado em nossa tela mental, como a bradar: E daí…? Ou desconcertantes reticências (…), apontando para algo que faltou, que não se completou.
2. RESULTADOS
- A idéia invencível, do público, da incompletude do trabalho, da inconclusividade do evento;
- Um certo sentimento de frustração;
- O encerramento por uma brilhante peça oratória a cargo de consumado tribuno, cujo conteúdo não guarda relação com o motivo do evento.
3. COMO DEVERIAM SER
- Designação de comissões de 2 ou 3 relatores, uma para cada tema;
- Eles acompanhariam a exposição e tomariam notas para elaboração do relatório parcial;
- Os relatórios seriam lidos no final do encontro, não implicando em julgamento dos temas expostos: nem aprovação, nem rejeição.
4ª – SINCRETISMO
1. COMO COSTUMAM SER
- O acolhimento de linhas espiritualistas à margem da Doutrina Espírita, como yoga, hinduísmo, esoterismo, africanismo, etc.
2. RESULTADOS
- O encolhimento do tempo disponível, já tão escasso para as intenções dos programadores;
- A confusão doutrinária dos assistentes.
- O prestigiamento do dispensável universalismo, que desponta aqui e ali no movimento espírita. A Doutrina é universal, sim; mas não universalista.
3. COMO PODERIAM SER
- Toda a temática poderia perfeitamente situar-se dentro dos limites doutrinários;
- Isso não implica em rejeição da temática de ponta, como transcomunicação instrumental e regressão de memória para efeitos terapêuticos, como exemplos.
- Apesar de ainda um tanto polêmicas, essas questões poderão, se bem conduzidas, tenderem para o “status” doutrinário e, por isso, devem ser acolhidas para estudos mais aprofundados.
5ª – SIMULTANEIDADE
1. COMO COSTUMAM SER
- É a realização concomitante de várias exposições em salas separadas, chegando até ao exagero de seis simultâneas.
2. RESULTADOS
- A quebra de unidade; o obscurecimento do foco de atenção; a dispersão que desorienta os interessados na procura dos locais através de corredores e salas;
- A assistência em cada compartimento volatiliza-se no vai-e-vem dos participantes.
3. COMO PODERIAM SER
- Limitação do número de expositores a um máximo de 4 ou, excepcionalmente, 6;
- A substituição da simultaneidade pela sucessividade;
- Os participantes assistiriam a todas as exposições, garantida assim a continuidade do desenvolvimento temático central.
6ª – OBJETIVIDADE
1. COMO COSTUMAM SER
- Omissão, na programação, dos objetivos a serem atingidos;
- Alguém já deparou, nos “folders” dos eventos, a formulação de algum fim visado ?
- É universal e incontestável que em toda ação humana – individual ou coletiva – existe sempre um objetivo: ” Todo agente age segundo um fim” ( ARISTÓTELES ); ” é próprio do homem agir em busca de um fim” ( TOMÁS DE AQUINO ); ” quem não sabe a que porto se dirige, nenhum vento lhe será favorável” ( SÊNECA );
- Ora, a Doutrina Espírita é decisivamente finalista: o desenvolvimento da espiritualidade dos homens;
- Dessa meta última e geral seriam deduzidos os objetivos intermediários, que a ela conduzem, e que deveriam ser almejados e formulados pelos eventos espíritas.
2. RESULTADOS
- No lugar dos objetivos, verifica-se o desfile inconseqüente de meras exposições de conhecimentos;
- O encontro se transmuda em espetáculo a ser assistido, ouvido, quando deveria ser um processo objetivo de desenvolvimento espiritual.
3. COMO PODERIAM SER
- Da meta geral da Doutrina e do movimento espírita, poderiam ser deduzidos os objetivos intermediários e mais concretos que poderiam conduzir àquela meta;
- Esses objetivos mais concretos, próximos e as vezes imediatos, é que deveriam ser incorporados pelos congressos e encontros, e de acordo com a natureza da idéia central;
- Exemplo: Área Escolhida: serviço social. Idéia central emblemática: a ação social na rota da espiritualização do homem. Objetivo do Evento: motivar os participantes para o desenvolvimento do seu espírito através de sua participação nas obras sociais.
7ª – HISTÓRICO
1. COMO COSTUMAM SER
- É outra indesculpável carência. Em geral, nada fica registrado;
- Após o encerramento do encontro, o vento da deslembrança tudo varre (organização, esforços, dedicação, anseios, ideais, informações, conhecimentos, temas, etc.). Tudo é apagado por Letes, a força mitológica do esquecimento e do silêncio, oposta à Memória e à Verdade. E o que o vento não leva e essa força não apaga fica escrito na areia… Se algo fica, fica no Limbo, ou no túmulo dos Capuletos.
2. RESULTADOS
- As informações que foram ouvidas, em curto prazo, são olvidadas pelos participantes;
- E os que não participaram do evento – a grande comunidade espírita – ficam totalmente marginalizados e na ignorância do que foi divulgado;
- O esforço intelectual dos expositores resta inaproveitado para a grande maioria dos espíritas.
3. COMO PODERIAM SER
- Cada expositor que foi convidado e aceitou seria solicitado a apresentar previamente um resumo do seu tema.
- Esses resumos seriam capeados, posteriormente publicados e colocados à venda.
- Assim tem procedido a Associação Médico-Espírita de São Paulo ( AME/SP ). Essa entidade tem patrocinado congressos e ciclos de conferências, cujos temas expostos vêm sendo publicados através do “Boletim Médico-Espírita”, desde o ano de 1984.
- Louvável nesse mesmo sentido é a iniciativa de gravação, em fitas magnéticas e vídeos-cassetes, das palestras e temas desenvolvidos em alguns eventos espíritas. Iniciativas essas já em franca expansão, felizmente.
- Ressalte-se, não obstante, que a singularidade dessas gravações desacompanhadas da memória escrita não atende à plena necessidade do estudo mais demorado e profundo dos temas.
- O registro tipográfico é indispensável por ser mais acessível ao estudo, à reflexão crítica. A AME/SP edita os seus eventos nas três formas: fita, vídeo-cassete e boletim.
8ª – POSTERIORIDADE
- Assim denominamos a possível e almejada aplicação pós-evento do que foi, talvez, captado pelos participantes.
1. COMO COSTUMAM SER
- Encerrado o encontro, aplica-se-lhe o selo do hermético fechamento, descendo sobre ele e sobre todos o manto do silêncio. Nada além da baliza derradeira.
- E “o depois de …? E daí…?” Pergunta-se. Qual a influência exercida pelo evento no ânimo e na alma dos participantes? E no movimento espírita ? Nos centros espíritas e nas entidades federativas ? Ninguém sabe. Ninguém viu.
2. RESULTADOS
- O futuro pós-evento, parece-nos, tem sido melancólico. Os entusiasmos despertados são efêmeros e fenecem nos primeiros embates dos que participaram, com os problemas e dificuldades da dura realidade da vida cotidiana;
- Não se efetiva o aproveitamento posterior de tudo que foi explanado e só ouvido;
- Os novos conhecimentos não são aplicados pelos condutores e dirigentes do movimento espírita;
- Verifica-se um incrível e enorme desperdício dos árduos e diuturnos estudos dos expositores, que se debruçaram com tanta dedicação e sacrifício pessoal na consulta a livros, revistas e demais fontes de esclarecimento; que preparam com tanto zelo e senso de responsabilidade as suas palestras. E tudo isso para captarem alguns momentos de atenção do auditório ( simples reunião de pessoas ouvintes );
- E o mesmo desproveito e mesma dissipação dos ingentes trabalhos e canseiras dos promotores do evento e de sua condução habilidosa e exaustiva.
3. COMO PODERIAM SER
- Poderia ser assegurado um mínimo de aproveitamento pós-evento, pela colaboração abnegada dos dirigentes espíritas que participaram do encontro, porque dispõem de estrutura de poder dentro do movimento, para aplicação em suas entidades do que julgarem conveniente e oportuno;
- Esses voluntários seriam devidamente cadastrados pelo nome, função exercida, entidade, endereço, telefone, cidade e CEP. Essa lista corresponderia apenas a uma declaração informal de intenção, que seria efetivada ou não, e jamais como um compromisso a ser-lhes cobrado;
- Em havendo essa disposição, poderia ser constituída uma pequena Agência de Intercâmbio Pós-Evento, formada por 2 membros também voluntários. Essa agência funcionaria na cidade em que se deu o encontro, e teria prazo fixo de atuação por 2 meses após o encerramento. Os seus componentes poderiam ser revezados de 20 em 20 dias para evitar sobrecarga de trabalho;
- Objetivo da agência: colher das casas espíritas informações sobre possíveis aplicações do que foi captado durante a realização do encontro, mas sem cobranças, imposições ou qualquer compromisso dos dirigentes, que apenas demonstraram a intenção de participar do intercâmbio; todavia, sem compromisso.
FINALIZAÇÃO
- Com as idéias acima expostas, não estamos condenando os eventos congressuais do movimento espírita do Brasil;
- Essas reuniões tão fraternais têm tido inestimável valor dentro da época em que passaram a acontecer;
- Em período anterior a esse acima referido, poucos encontros foram realizados, e fortes correntes condenavam a sua realização. Essa etapa obscura já foi vencida pelo próprio movimento espírita.
- Atualmente, todas as federações, muitos centros espíritas e associações especializadas patrocinam esses eventos. Vários deles têm sido primorosamente organizados, mas segundo os valores até agora cultuados, procurados e dentro dos objetivos relativos a esta etapa de desenvolvimento do movimento espírita.
- Entre a 1a etapa ( a obscura ) e a atual ( aberta ) que já conta com algumas décadas, houve inegável progresso e aperfeiçoamento;
- Foi de tal ordem esse avanço que já se pode cogitar da 3a etapa – que podemos chamar de Etapa do Salto de Qualidade;
- Por isso, podemos considerar que o presente trabalho possa constituir uma inicial e modesta contribuição a esse salto. Foi o nosso propósito;
- Acreditamos que outras contribuições possam surgir, mais consistentes, práticas e inteligentes, se é que já não estejam despontando.
(Jornal Mundo Espírita de Julho de 1998)