Uma Breve Reflexão
Ao que tudo indica o pensar científico está em crise, perante a cultura cm
geral, conquanto o fazer científico, deslizando nas rodas de sofisticada
tecnologia, continue a avançar celeremente para o domínio cada vez maior das
forças naturais. Esse fenômeno dos tempos modernos, marcado por sérias rupturas
paradigmáticas, tem suma gravidade porque propicia o ressurgimento de velhas
teorias epistemológicas que só serviram para entravar o progresso, em todos os
sentidos. É impressionante como, hoje, em nome de um novo e mais lúcido pensar
científico, pessoas tituladas por centros de saber oficial exploram idéias
medievais, ficcionistas, quase delirantes, e com isso chegam ao sucesso! Umas
simplesmente editando livros, outras vendendo terapias milagrosas baseadas em
inverificáveis poderes dos cristais e das cores, ou comercializando palavrosas
interpretações de signos grafológicos e astrais, quando não inventando
expedientes mais bizarros – todas reivindicando respeitabilidade para suas
teses, a cada dia menos contestadas pelas elites intelectuais.
Tais produtos do pensamento mágico, travestido de científico, antigamente
provinham de gente ignorante e tinham consumo restrito a determinadas parcelas
da sociedade; agora são oferecidos, por doutores disso e daquilo, para a
comunidade, através dos melhores veículos de comunicação de massa. Trata-se da
famosa crise de fragmentação da cultura…
E como ficamos nós, espíritas, nesta questão?
Bem, nossa posição, coerente com a Doutrina, deve ser a de sempre:
equilibrada, razoável, dirigida pelo bom senso, ora para um lado, ora para
outro, porque o problema em tela, infelizmente, tem dois lados, ambos dignos de
cuidadosa consideração. No primeiro deles vemos a inteligência humana,
esbarrando em seus limites, perplexa e desorientada, correr o risco de mergulhar
no descrédito de si mesma, por não poder descobrir as verdades fundamentais da
vida, depois de desvendar tantas verdades menores; ela construiu com o
raciocínio objetivo e binário, com uma visão analítica lógico-causal, essa coisa
maravilhosa chamada ciência, que lhe revelou o modelo mecanicista, reducionista
e determinista de um mundo inteiramente físico, com o qual se encantou,
menosprezando a existência de DEUS, e de repente o dito mundo começou a se
esvanecer em ondas e partículas crescentemente sutis, intocáveis, entrelaçadas
numa teia dinâmica, auto-consistente, sem termo nas interconexões do
espaço-tempo… No segundo deles vemos o coração humano, também esbarrando nos
limites das suas esperanças, correr o risco de afundar em superstições por não
ter tido resposta para os anseios milenares de ventura…
Não podendo contribuir para o descrédito da inteligência, nem para o
fanatismo do coração, resta-nos adotar a postura recomendada na obra de Kardec,
qual seja a de trabalhar para que a Ciência encontre afinal o caminho da
religiosidade, e o sentimento do homem se liberte de vez das ilusões místicas.
(Reformador nº 1976 – Novembro de 1993)