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Evolução ou retrocesso?

Evolução ou retrocesso?

Ao classificar o Espiritismo como Ciência e Filosofia, com conseqüências
morais, Allan Kardec tinha por objetivo chamar à atenção da sociedade, porque
mais uma religião, nos conceitos clássicos, não provocaria  interesse em
ninguém. Estas já foram definidas como o ópio do povo, o que não está longe da
verdade, porque são praticadas com a manifesta intenção de manter o crente no
medo e na ignorância, atrelado ao cabresto dos que se dizem pastores das almas.

Quase seis anos depois da publicação de O Livro dos Espíritos, o Espírito de
Verdade alertou o Codificador que era a hora de o Espiritismo ser divulgado como
única doutrina verdadeiramente cristã. Foi a preparação para que em 1864
surgisse O Evangelho Segundo o Espiritismo.

Com o Consolador, os conceitos de religião se alteraram e a fé cega deu lugar
à razão, quando as seitas passaram a não mais se enquadrar no entendimento maior
de religião, a ligação com Deus. Essa é a religião ensinada por Jesus, tão
científica quanto o que se pretende atribuir ao Espiritismo. O perdão das
ofensas e o amor ao próximo são enunciados de lei que mostram os mecanismos das
ações e reações. Jesus ao propor que amássemos não aconselhou simplesmente, mas
alertou que o amor é o natural antídoto para o ódio e o recurso que nos mantém
em equilíbrio. O grande problema é a insistência em misturar Jesus ao
cristianismo interesseiro e perseguidor, praticado pelas igrejas ao longo dos
anos. As igrejas da inquisição, das cruzadas, das indulgências, dos dogmas, das
penitências, das promessas, dos dízimos. Não foram essas as lições de Jesus.
Cumpre analisar ainda um outro problema, a dificuldade do ser humano para viver
a simplicidade. Parece-lhe muito comum e facilmente acessível aos analfabetos,
mas não é. O amor ao próximo que deveria ser tarefa simples, é  impossível ao
homem moderno, esse pseudo-sábio. É o cientista que vai à lua, mas que é
ciumento e melindroso; é o homem que domina a informática, mas é incapaz de
vencer a vaidade; é o chefe que governa nações, mas que ulcera, enfarta,
torna-se hipertenso, porque não tem capacidade para administrar a si mesmo.

Por esta razão, está nascendo mais um movimento “espírita”  na América
Latina, para banir do Espiritismo a sua faceta religiosa. Já não mais precisam
do Cristo porque têm soluções modernas para orientar o homem do terceiro
milênio, oferecendo-lhe a doutrina da felicidade. Já não são necessários o amor,
a caridade e a aproximação entre as pessoas, porque o importante são os
encontros, onde psicólogos, engenheiros, médicos, psicanalistas, filósofos se
reúnem e onde gente simples não cabe, porque ali a simplicidade é confundida com
a ignorância.

É direito de cada um buscar o seu caminho. O Espiritismo chama a isto
livre-arbítrio. Mas que não misturem a nossa doutrina às suas ideias tidas como
científicas e modernas.  Criem estudo próprio, com nome adequado, e excluam de
sua sigla o vocábulo Espírita. Deixem que o Espiritismo continue na sua proposta
de libertador de consciências com seus postulados simples, os mesmos que ainda
não aprendemos a viver. Querem contestar, contestem. Mas esses homens não devem
confundir a cabeça das pessoas com teorias que divulgam sem verificar da sua
aplicabilidade. Criam coisas novas e nem sabem para que servem, a não ser chamar
para si a atenção.

Quem desejar entender Kardec basta estudar Jesus. O Jesus que orientou
Nicodemus e que proferiu o Sermão do Monte, entre tantas outras lições
extraordinárias, e não o Jesus da cruz, lânguido, desfigurado pelos homens
equivocados do seu tempo, que geraram descendentes até os nossos dias. O Jesus
cientista que conhece as necessidades de cada ser humano, que curou alguns e
aconselhou outros; que amparou este e censurou aquele, mas que permaneceu como o
imortal guia da humanidade, a despeito de alguns homens modernos insistirem em
sepultá-lo novamente.

Há correntes “espíritas” querendo abolir a prece das reuniões; há “espíritas”
descartando Jesus do seu “espiritismo”. A desordem busca desorganizar a Doutrina
dos Espíritos, Centros a dentro, e é preciso vigilância ainda maior. Cuidar do
que se lê, porque muito do que se está editando é preocupante e contrário às
orientações espíritas, sejam jornais, livros, boletins, “mensagens”. Cuidar do
que se ouve, nos palanques, nas rádios ou TVs, porque o momento é dos
oportunistas, aqueles que tipicamente se aproveitam do misticismo e da
insatisfação das pessoas para dar seus conselhos eruditos e salvadores, mas que
não conseguem ilustrar nem salvar a eles próprios. E mesmo que o façam cheios de
boa intenção, nem por isso são menos nocivos.

Cuidado, gente, porque o perigo está no próprio movimento espírita, não dos
inimigos, que nada podem contra a Verdade !

(Publicado no Jornal A Voz do Espírito – Edição 87: Setembro-Outubro de 1997)