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Reciclagem Mediúnica

No caminhar dos dias, o interesse por assuntos relacionados ao Espiritismo,
desperta mais e mais atenção. Muitos que procuram o Centro Espírita na busca de
consolo e entendimento para suas dores.

Nesse sentido, cresce a responsabilidade dos espíritas, daqueles que
colaboram na difusão da doutrina.

No atender, receber pessoas, não pode a casa espírita oferecer enganos,
leviandades, resoluções imediatistas ou simplórias.

“O Espiritismo é ao mesmo tempo, ciência experimental e doutrina filosófica
que trata da natureza, origem e destino dos Espíritos bem como de suas relações
com o mundo corporal”.

Como tal, requer muita leitura, estudo, reflexão, requisitos insubstituíveis,
imprescindíveis à sua compreensão e vivência. Dedicação a esses aspectos há que
representar disciplina permanente, que, mantendo a atualização, coloca
frente-a-frente a outros códigos do conhecimento.

O que muitas vezes acontece, é acomodação aos princípios doutrinários, sem
preocupação do estudo global e sistemático. Não é possível conhecer doutrina
Espírita só no saber, que se transmite oralmente. Esse “ouvir dizer” é
responsável pela transformação dos conceitos em preconceitos ou nas práticas
infundadas, desligadas do entendimento doutrinário. É um comodismo que favorece
as inovações e fugas para o sincretismo.

No fecho dessa série, consegue-se perceber que a Mediunidade se enquadra
nesses modelos. Basta lembrar que grande número de companheiros chegam ao Centro
devido a um ‘(…) problema de mediunidade” (O problema mediúnico – Verdade e
Luz n.° 173, junho/2000). Alguém lhe disse que, aquela dor de cabeça, insônia,
irritabilidade, etc., seria devido a influência de desencarnados, que se
“encostam”, provocando as determinadas mazelas.

Se, pode até ser aceitável, que o desconhecedor do Espiritismo pense assim,
desolador é encontrar Centros que também interpretam dessa forma, assegurando
que a situação, o “problema” é de mediunidade, e como tal precisa
“desenvolvê-la”. Acresça-se os “diagnósticos” da obsessão onde se encaminha a
referida pessoa para as sessões de desobsessão.

Acomodados nessa leviandade, afirma-se a visão passiva de uma potencialidade,
como se o encarnado fosse a perpétua vítima indefesa de desencarnados hábeis,
esquecidos de que, os encarnados é que propiciam, ofertam campo à influência
mediúnica.

Em “O Livro dos Espíritos” – q. 466 – ensinam os Espíritos: “(…) nossa
missão é a de te pôr no bom caminho, e quando más influências agem sobre ti, és
tu que as chamas pelo desejo do mal, porque os Espíritos inferiores vêm em teu
auxílio no mal, quando tens a vontade de o cometer; eles não podem ajudar-te no
mal, se não quando tu desejas o mal”.

Na questão seguinte perguntando se é possível afastar a influência desses
Espíritos, respondem: “Sim, porque eles só se ligam aos que os solicitam por
seus desejos ou os atraem por seus pensamentos”.

Por superficial que possa ser o estudo desses itens, ressalta, percebe-se ser
a vontade do encarnado que estabelece os vínculos. Nesse campo o ser humano é
totalmente ativo; é o agente. Se assim não fosse, qual o significado do
livre-arbítrio?

De que adiantaria submeter alguém às sessões de desobsessão, se não estiver
ela sensibilizada para se modificar, autoconhecer-se, auto-educar-se. A maioria
desses “problemas mediunidade” são situações de caráter pessoal, de educação.

Entenda-se educação, como processo que englobando a instrução, ilustra sim a
mente sobre um ou vários ramos da ciência, mas liga-se ao caráter, fala de
feitio moral, distingue a criatura pela firmeza da vontade, e desenvolvimento
dos poderes do Espírito “(…) o poder e a formação intelectual sem integridade
de caráter constituem-se em ameaça para o próprio homem e para o meio com que
convive”. “(…) Educar é transformar o homem dando-lhe uma concepção de vida
fundamentada na supremacia do Espírito e dos valores morais”.

Daí ser injustiça ligar Mediunidade a problemas e por decorrência culpar o
Espiritismo pela existência deles.

Ao contrário, é a Doutrina Espírita que apreendida leva à compreensão do
fenômeno através dos tempos. Esclarece o envolvido a que exerça, use sua
faculdade de modo ordenado, tranqüilo, perfeitamente compatível com qualquer
atividade que exerça ou meio em que viva. Quando as manifestações expontâneas
ocorram, não haverá pânico, desorientação, mas respeito e satisfação, por
entender que está se preparando para servir, intermediando planos, em tarefa
nobre que exige sim preparo, doação, mas que reserva alegrias inesperadas e
duradouras advindas da oportunidade de doar-se no Bem, para que o outro fique
melhor.

A Mediunidade generalizada, que todos possuem, geralmente permanecendo
estagnada, sem ser percebida, trabalhada, sem que se dê importância ou valor
passa a ser compreendida e usada, como disposição natural do Espírito para
expandir-se, projetar-se entrar em relação com outras mentes, como ativo centro
emissor e receptor de pensamentos. Configura-se como talento divino a ser
utilizado na própria renovação que liberta. Propicia afloramento das percepções
íntimas do ser, constituindo-se por isso em instrumento de evolução, uma vez que
o uso responsável, o estado moral será a determinante da maior ou menor
abrangência.

Vida e mediunidade, constituir-se-ão como único processo. “O ato de viver
passa a ser um ato mediúnico, Somos Espíritos que se manifestam através de
corpos materiais. A vida é comunicação entre planos”. Nesse entender
relaciona-se o homem com os demais Espíritos sem medo ou desconfianças
infundadas, sem pretensão vaidosa ou interesses mesquinhos; confiante nas leis
da vida estrutura mente aberta, lúcida, seletiva o que proporciona? Intuição
clara da realidade antes confusa; captação fácil das sugestões amigas, percepção
direta e profunda dos rumos a seguir em todas as situações.

“Mediunidade é isso: afloramento na consciência das forças e vetores que
formam a riqueza insuspeitada do nosso inconsciente; será inspiração a guiar no
momento certo”.

Nessa dinâmica, vozes internas começam a ser percebidas e a existência a se
revelar em múltiplas e ricas perspectivas.

Quando se atingir essa compreensão. Mediunidade não será mais apenas meios de
comunicação com desencarnados, mas campo aberto para as relações sociais e
espirituais na busca consciente e prazerosa do Bem.

Quanto mais essas relações forem aprimoradas, equilibradas, dirigidas na
busca desse melhor, essa mediunidade interior aflora e a essência divina do
homem se comunica através de sua realidade humana. “É esse o mais belo ato
mediúnico, o fenômeno mais significativo da Mediunidade, aquele que
distintamente nos revela a imortalidade pessoal.

A “divindade de Jesus” não se revelava “por parte de Deus”, mas como
“criatura de Deus” que no exercício da sua conduta moral interligava-se,
mantinha-se unido às elevadas mentes voltadas para o Amor.

“Sois deuses”, referenciando lembrar ao homem que nele repousa a divindade do
Criador com a qual pode participar dos poderes da Criação alcançando valores,
desenvolvendo para a luz essa natureza divina.

“Viver mediunicamente, não é viver envolvido por um Espírito estranho, mas
viver essa plenitude de possibilidades”. A tranqüilidade, a segurança, o saber,
o equilíbrio que se busca está em cada um. Podemos ser médiuns dessa natureza
divina desconhecida ou soterrada pelo apego aos formalismos, à magia e à
idolatria. O pensamento, o sentimento moral, a vida buscando o melhor
exterioriza-se em atos, a divindade interna.

Como atualizar essa divindade?

No dia-a-dia, no afastar das exterioridades procurando a verdade de modo
sincero no coração e na mente. Essa busca, esse trabalho pessoal coloca acima
das ilusões, desgasta vaidades, orgulho vazio. É o manter-se alerta frente o
momento, que passa carregado de convites, de exercícios para as percepções
espirituais. Esse estado não será nunca forçado mas vai fluindo espontaneamente
à medida que o ser entende e se dispõe a lidar ao mesmo tempo com a realidade
interna e com as idéias que despontam na mente. Sabendo distinguí-las faz a
melhor opção na aplicação dos princípios cristãos. Para isso há que despertar e
incorporar os princípios da vigilância.

“Vigiai e orai” significando precaver, cuidar, trabalhar, defender-se sem
cansaço no Bem. “Vibra com a vida que estua, sublime, ao redor de ti, e trabalha
infatigavelmente dilatando as fronteiras do bem, aprendendo e ajudando aos
outros em teu próprio favor. Essa é a mais alta fórmula de vigiar e orar para
não cairmos em tentação”.

Reafirme-se: esse viver mediúnico não é específico ao médium de mediunato,
mas a todos, onde a vida diária se apresentará como contribuição da faculdade
mediúnica no trabalho pessoal que livrando de perturbações e obsessão de toda
espécie, liberta-o dele próprio. O uso permanente da faculdade na percepção da
realidade dupla, a interna e a externa, espiritual e material combinadas no
perceber global do todo.

Nesse viver mediúnico, quer se encontre o homem no mediunato ou na
mediunidade generalizada, Albino Teixeira sintetiza em “Decálogo para médiuns”:

  • Não afastar-se dos deveres e compromissos que abraçou na vida,
    reconhecendo que é impossível manter intercâmbio espiritual claro e constante
    com o Plano Superior, sem base na consciência tranqüila.
  • Não descuidar-se do autodomínio, a fim de controlar as próprias
    faculdades.
  • Não ignorar que desenvolvimento mediúnico, antes de tudo significa
    educar-se o médium a si mesmo para ser mais útil.
  • Não desejar “fazer tudo”, mas fazer o que deve e possa no auxílio aos
    outros.
  • Não recusar críticas ou discussões e sim aceitá-las de boa vontade por
    teste de melhoria e aperfeiçoamento dos próprios recursos.
  • Não guardar ressentimentos.
  • Não fugir do estudo, nem da disciplina para discernir e agir com
    segurança.
  • Não relaxar a pontualidade das tarefas que lhe cabem, a não ser por
    motivos de reconhecida necessidade.
  • Não olvidar pessoas nos benefícios que preste.
  • Não olvidar que o melhor médium para o Mundo Espiritual, em qualquer tempo
    e em qualquer circunstância, será sempre aquele que estiver resolvido a
    burilar-se, decidido a instruir-se disposto a esquecer-se e pronto a servir.

Livros consultados:

  • Kardec, Allan – O principiante espírita
  • Kardec, Allan – O Livro dos Espíritos – 466, 467
  • Camargo, Pedro – O Mestre na Educação – 12
  • Lobo, Ney – Espiritismo e Educação
  • Miranda, H. C. – Crônicas de um e de outro – 74
  • Pires, J. Herculano – Mediunidade
  • Peralva, Martins – Mediunidade e Evolução – 5 – 27
  • Novo Testamento – 14:38
  • Emmanuel – Palavras de Vida Eterna – 3
  • Emmanuel – O Consolador – pág. 177

(Jornal Verdade e Luz Nº 170 de Março de 2000)