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Crer em Tudo

Crer em Tudo

Paulo de Tarso, em uma das mais completas definições de que até hoje se tem
conhecimento, diz, entre outras coisas; que a Caridade em tudo crê.

Ao espírita, ou ao homem afeito ao uso sistemático do raciocínio, isto parece
uma farsa, uma afirmação intolerável. Apenas aparência. Na realidade, ou,
melhor, do ponto-de-vista espiritual, a afirmação do Apóstolo dos Gentios é das
mais justas, das mais verdadeiras, das mais evangélicas.

A caridade em tudo crê. Tomemos um exemplo. Um homem esfarrapado e sujo nos
aborda na rua; pede-nos ajuda. E, como todo pedinte, esse homem acompanha seu
pedido de uma explicação. Me dá uma ajuda para comprar pão para meu filhinho e
remédio para minha mulher doente”.

Suponhamos que esse homem já tenha abordado, num dia, dez indivíduos. Oito
lhe deram alguma coisa, mas nem sequer ouviram sua arenga, a sua explicação.
Isto é, oito deram para se ver livres. Duas outras pessoas, entretanto, nada
deram: não tinham recursos ou não acreditaram na história que o homem ia contar.
Sim, ia contar, porque geralmente abanamos a cabeça negativamente a qualquer
gesto de súplica.

Pois bem! Suponhamos agora que esse homem – o pedinte – encontre a Caridade
descrita por Paulo de Tarso. É claro que a Caridade neste caso será o dom de um
Espírito encarnado. A Caridade ouvirá a história contada pelo homem e nela
crerá. Dará o auxílio que estiver a seu alcance, e uma palavra de conforto. Sim,
uma palavra de conforto, porque a Caridade acreditou naquilo que o homem lhe
disse. E, se acreditou, se achou realmente verossímil o drama exposto, será
lógico que ofereça uma vibração de estímulo à pessoa necessitada.

“Foi no conto do mendigo”, dirá muita gente. Acreditamos mesmo que na maioria
das vezes, a Caridade seja levada a aceitar o “conto do mendigo”. E daí? Não
sabemos nós – pela palavra de Emmânuel, André Luiz e outros instrutores – o
valor da caridade ? Vejam o que acontecerá ao mendigo mistificador após o
desencarne:

Depois de sofrer nas zonas purgatoriais em que será atirado pela própria
consciência culpada, um dia será socorrido por benfeitores do Espaço. Será,
contudo, um espírito rebelde, trazendo consigo o amargor do desprezo e do
descrédito que os homens lhe votaram. Indentificará os benfeitores espirituais
como homens que irão tripudiar sobre sua desgraça, como aqueles que na Terra lhe
atiravam a moeda sem se quer lhe tocar as mãos. Os abnegados amigos espirituais
usarão então do recurso da regressão de memória: diante do infeliz começarão a
surgir quadros de sua desgraça – homens escarnecendo de sua mistificação, em sua
grande maioria. Mas, oh! Caridade, luz imorredoura na Eternidade de um espírito!
aparecerá o quadro daquela pessoa que um dia ouviu o seu drama mentiroso,
acreditou em sua triste história.

Apenas este quadro será Diante dos olhos enfurecidos suficiente para que o
infeliz Espírito, reconheça a própria mistificação. O pranto convulsivo será o
sinal deste reconhecimento; será o início de uma longa caminhada que o levará à
regeneração. Pobre Espírito infeliz; pensava que toda a Humanidade era credora
de seu ódio, mas encontrou alguém que lhe quebrou a cadeia de rebeldia:
encontrou um elo – um único que não era feito de ódio: era só Amor. Esse elo
chama-se: Caridade. E, com esse elo, o Espírito infeliz reencetará a formação da
grande corrente que o levará à Perfeição.

Perguntamos: existe maior caridade do que aquela que indica ao filho perdido
o caminho de volta à casa paterna? Meditemos, sobre o crédito incondicional que
a Caridade dá a todos.

Paulo de Tarso, entretanto, limita esse crédito incondicional apenas à
Caridade; ele não o atribui também à Fé. Pois, em matéria de Fé ou de crença
religiosa, aprendamos com Kardec: “É preferível rejeitarmos 99 verdades do que
aceitarmos uma mentira”.

(O Clarim – Outubro – 1971)