Amilcar Del Chiaro
No último domingo de janeiro uma expressiva parcela da humanidade estará comemorando o Dia Mundial do Hanseniano, e isto nos faz reportar ao longínquo 1954, quando os esforços do jornalista francês, Raoul Follerreau, motivou a ONU – Organização das Nações Unidas, a criar esse dia, para que, como dizia o próprio Raoul, um dia ele não seja mais necessário. Raoul Folerreau morreu sem ver o seu sonho realizado, pois ainda existem alguns milhões de hansenianos no mundo. Ele fez um trabalho itinerante, visitando todos hospitais, asilos ou localidades onde se aglomeravam doentes de Hansen, naquela época chamados de leprosos. Hoje, com a associação de alguns medicamentos a cura é rápida, e já não mais existem as Colônias, onde os doentes eram isolados da sociedade sadia. Eram verdadeiramente prisioneiros, condenados, sem culpa formada, apenas por trazer em seus corpos um bacilo insidioso, capaz de destruir-lhes os tecidos, músculos, e ossos, causando sofrimentos atrozes. Para isto, a medicina recebeu “poderes de polícia” e muitos médicos usaram esses poderes com arbitrariedade.Médicos e pacientes de hoje não conhecem a história terrível vivida pelos pacientes de outrora.
O preconceito e a discriminação vem de tempos pré-bíblicos e no Brasil tem mais de 400 anos, porque os colonizadores trouxeram a doença para o Novo Mundo. Contudo, por que estamos falando sobre este assunto num espaço espírita? Porque muitos hansenianos foram e são espíritas, e alguns tiveram grande liderança dentro dos hospitais, constituindo-se em fachos de luz, semeadores de estrelas e verdadeiros discípulos de Allan Kardec. São muitos e não teríamos condições de falar de todos, mas vamos destacar alguns, começando lá do norte do país, onde um jovem chamado Aurelino Gurjão, escreveu um livro, com o título: Expiação, que foi publicado pela Federação Espírita Brasileira.
Na época não havia medicamentos e Aurelino sofreu a ação terrível do bacilo que destruiu seu corpo, iluminando-lhe a alma. Ele morreu sem ver o seu livro publicado, pois o livro foi editado uma semana após a desencarnação do jovem. Ainda do norte do Brasil, mas tendo vivido no Rio de Janeiro, um homem que ultrapassou os noventa anos — Amazonas Hércules — alma intimorata, iluminada, trabalhador incansável, que, como a floresta amazônica enfrenta as queimadas da vida e continua sorrindo a oferecer amor. Ele teve seus membros inferiores e superiores mutilados, sua pele marcada, sua visão deficiente, (10% de visão), como a terra arroteada após a queimada, e ali, a boa semente produz muito mais que cem por uma. No Estado de São Paulo pontificaram o poeta e conferencista Vírgilio Quaglio em Santo Ângelo e o também poeta Jésus Gonçalves, em Pirapitingui, cuja lira chorou sua desdita e sua descrença, enquanto foi ateu, depois cantou a luz do Espiritismo, e também, o amor imortal de um maravilhoso Rabi que nasceu na Judéia para elevar o mundo a um patamar nunca antes alcançado. Num soneto maravilhoso Jésus cantou sua desdita terminando num terceto que é um grito lancinante de quem sofre; Da palhoça passei para os salões ||| Onde nasceram novas ilusões ||| Que foram sucumbir num leprosário. Três versos que nos faz voltar ao passado e ver o exército visigodo de Alarico assediando cidades indefesas – Amílcar Barca e Aníbal destruindo e matando. Átila, apelidado O Flagelo de Deus. Gengis Kahn, Tarmelão – Alexandre – Pizzarro que construíram suas dores pela violência e o desamor. Da mesma forma, os marginais de hoje, que violentam, seqüestram, estupram, aterrorizam, matam, estão espalhando sementes malditas que lhes obrigarão a uma colheita amarga para a redenção. Ou a trabalhos ingentes, em favor da vida e do amor.