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A Síndrome de Carolina

A Síndrome de Carolina

Não provei e não gostei!

Essa a tácita informação de minha filha Carolina, que já aos três anos
revelava a espantosa autodeterminação das crianças de nosso tempo, recusando-se
terminantemente a ingerir determinados alimentos, ainda que dotados de um visual
dos mais convidativos.

Eventualmente, após muita insistência, dignava-se a oferecer uma “colher de
chá” aos coroas.

Então, adorava, empanturrando-se.

Penso nessa tendência infantil quando alguém sugere uma atividade nova no
Centro Espírita “Amor e Caridade”, em Bauru, do qual participo.

Não raro a idéia sofre séria ameaça de rejeição no nascedouro, simplesmente
na base do “não provei e não gostei”, que eu chamaria uma “síndrome de
Carolina”.

Por que não oferecer um voto de confiança, com a disposição de implementá-la?
Afinal, se não lograrmos sucesso ficará a experiência, igualmente valiosa em
relação a empreendimentos futuros. E haverá o grande mérito de não sufocarmos a
iniciativa e a criatividade dos companheiros.

Mesmo as melhores idéias são, em princípio, plantinhas frágeis, facilmente
esmagadas por objeções e dúvidas que geralmente nada mais exprimem senão
desinteresse e má vontade.

Sofri a “síndrome de Carolina” antes da instalação do Clube do Livro Espírita
de Bauru, há dois decênios.

No início dos anos setenta, em contato com José Reis, de Marília, e Leopoldo
Zanardi, que residia em Tupã, ouvi referências entusiasmadas quanto à eficiência
do CLE, trabalho pioneiro naquelas cidades.

Diretor do Departamento do Livro, órgão da União Municipal Espírita de Bauru,
a UMEB, refuguei por bom tempo a idéia sem sequer apresentar uma justificativa
consistente. Desaprovei antes de provar.

A insistência de ambos acabou por convencer-me a fazer a experiência. Em 1973
era fundado o CLE de Bauru, patrocinado pela UMEB. O primeiro livro foi “Chico
Xavier Pede Licença”, uma coletânea de mensagens psicografadas pelo querido
médium, com comentários de Herculano Pires, edição GEEM, de São Bernardo do
Campo.

Começamos com 200 associados. Em breve eram mais de 1.000. Um espanto! Jamais
se vendera tantos exemplares de um livro em Bauru. E isto vem ocorrendo todos os
meses, desde aquele recuado janeiro de 1973.

O CLE tem aspectos marcantes:

Aumenta o movimento em bancas, feiras, livrarias, na medida em que desperta
interesse pela literatura espírita.

Com entregas em domicílio, o livro entra na casa de pessoas que nunca
entraram em instituição espírita.

Amplia tiragens e edições de obras publicadas, reduzindo o preço.

E, sobretudo, vende muito. Venda certa, mensal, constante, a distribuir
livros e mais livros a mão-cheia, convidando o povo a pensar o Espiritismo, como
diria Castro Alves.

Em 1976, em face do sucesso estrondoso do CLE em Bauru, preparamos a campanha
“O Ovo de Colombo”, patrocinada pela UMEB. Consistia na distribuição gratuita de
um livrete com instruções para instalação desse serviço em outras cidades.

O título passava a idéia de que a divulgação do livro espírita,
empreendimento que muitos consideram complicado e dispendioso, pode ser
facilmente colocado em pé, lembrando a experiência de Cristóvão Colombo, que fez
o mesmo com um ovo, algo aparentemente impossível, simplesmente quebrando com
ligeiro toque a extremidade que serviria de base.

Um pequeno esforço para “quebrar” a “síndrome de Carolina” e eis o CLE a
exercitar seu incomparável potencial em favor do livro espírita.

Com a colaboração de Merhy Seba, ligado à área de publicidade, foram
preparados anúncios distribuídos a vários jornais e revistas espíritas. Tinham
sugestivos slogans:

“Você ainda não instalou o CLE em sua cidade? Não sabe o que está perdendo!”

“Sua cidade já colocou este ovo em pé?”

“A maior caridade que praticamos em relação à Doutrina Espírita é a sua
própria divulgação.”

Este último, dotado de extraordinária força de comunicação, foi retirado de
uma mensagem de Emmanuel, conforme era citado no anúncio. Desde então é usado
pela imprensa espírita sempre que se destaca a importância do livro espírita.

A campanha teve ampla repercussão. Foram distribuídos 1.200 livretes e
tivemos notícia da instalação de 115 clubes em todo o Brasil, particularmente no
Estado de São Paulo.

O movimento de divulgação CLE continua, hoje, com a coordenação do
“Divulgador do Livro Espírita” organização que estimula a formação de equipes
interessadas em favorecer a disseminação do livro espírita com a instalação de
bancas, livrarias, feiras e clubes. A secretaria funciona atualmente em
Sertãozinho (SP), Caixa Postal, 262.

Em Bauru, comemorando os vinte anos de CLE, em que mais de duzentos mil
livros foram distribuídos, acalentamos o sonho de ver chegar o dia em que,
vencida a “síndrome de Carolina”, todas as cidades brasileiras tenham o seu
clube, gloriosa referência de um movimento espírita atuante e empreendedor.

Reformador nº 1976 – Novembro/1993