A Bicicleta e o Ciclista
Não há controvérsia em expressões assim:
— Fulano tem espírito — é inteligente.
— Beltrano é espirituoso — possui senso de humor.
— Ciclano é espiritualizado.
— Cultiva valores morais.
A dificuldade surge quando empregamos a palavra espiritualista para designar
pessoas que admitem a existência da Alma, a individualidade eterna que sustenta
o corpo físico e o situa como um ser pensante.
Para muitos trata-se de mera fantasia religiosa, sem base científica.
Concebem que capacidade de pensar é mero resultado da organização e do
funcionamento de células cerebrais, que produzem o pensamento, assim como o
fígado produz bile ou as glândulas de secreção interna produzem os hormônios.
Afirma jocosamente o patologista:
— Dissequei centenas de cérebros. Jamais encontrei o Espírito.
Interessante frase de efeito que não diz nada.
Porventura teria ele desvendado misterioso mecanismo a gerar o pensamento no
interior das células?
Alguma pesquisa teria surpreendido idéias sendo produzidas pelos neurônios,
da mesma forma que o pâncreas secreta a insulina?
A matéria não pensa.
Situemos, a título de ilustração, algo bem simples:
A bicicleta.
Trata-se de um veículo de transporte muito eficiente que, para movimentar-se,
não prescinde da força motriz gerada pelo ciclista.
O corpo é a bicicleta que o Espírito usa para a jornada humana.
A bicicleta sem o ciclista é um objeto inanimado.
O corpo sem o Espírito é mero aglomerado de células em desagregação.
A união do Espírito com o corpo intelectualizou a matéria, transformando o
ancestral símio antropóide num ser pensante, da mesma forma que a presença do
ciclista torna a bicicleta um veículo andante.
Em defesa da tese materialista, que nega a individualidade espiritual que
anima o ser humano, fala-se em paralelismo psicofisiológico.
Trocando em miúdos:
O homem é um produto de seu próprio cérebro.
Por isso, o que lhe afeta os miolos repercute em sua atividade motora,
sensorial, intelectual, mental…
Proclama o materialista:
— A prova de que a inteligência independe da suposta presença do Espírito
está no fato de que se ocorrer um problema qualquer com o tecido cerebral
teremos dificuldade para exercitar as funções intelectivas e fisiológicas.
Raciocínio simplista.
Sendo o cérebro o instrumento de sua manifestação no plano material,
obviamente o Espírito estará na dependência dele.
O ser imortal pode ser muito inteligente, muito culto, mas se a caixa
craniana apresentar grave disfunção teremos um deficiente mental.
Algo semelhante a um ciclista que ficará impossibilitado de transportar-se em
sua bicicleta se um pneu furar ou romper-se a corrente que traciona as rodas.
Um exemplo mais ilustrativo:
Quando falo ao telefone, seria o cúmulo da ingenuidade meu interlocutor
imaginar que conversa com meu aparelho. O telefone é apenas o instrumento de
nosso contato. Se apresentar defeito a comunicação ficará prejudicada.
Devemos atentar, ainda, para outro aspecto que liquida a tese materialista.
Há doentes mentais submetidos aos mais sofisticados exames que não revelam
nenhuma disfunção orgânica, nem mesmo nos circuitos cerebrais. Enigmas para os
médicos, que se limitam a prescrever lhes tranqüilizantes.
A Doutrina Espírita explica que o problema é decorrente de uma obsessão. O
paciente tem comprometida sua integridade mental pela influência de inimigos
espirituais.
O tratamento em hospitais psiquiátricos espíritas — passe magnético, água
fluída, sessões de desobsessão, reuniões evangélicas — opera prodígios,
afastando os obsessores e promovendo a cura do paciente.
Isso não ocorre apenas com problemas mentais.
Há casos em que a ação do obsessor provoca males físicos que desafiam a
Medicina.
Durante meses um homem sofreu dores intensas nas pernas.
Os médicos não conseguiam um diagnóstico. Exames clínicos e laboratoriais
nada revelavam.
O paciente irritava-se quando lhe diziam que se tratava de um problema
psicológico. Esbravejava:
— Dor não tem psicologia!
Mesmo assim, em desespero, submeteu-se à Psicanálise.
Resultado nulo.
Saturado de tanto sofrer pedia que lhe amputassem as pernas. Um amigo o
convenceu a procurar o Centro Espírita.
Lá explicaram-lhe que estava sendo assediado por um Espírito que, a pretexto
de vingar-se de passadas ofensas, impunha-lhe aquela tortura.
Ficou sabendo que em vida passada assassinara aquele que hoje o martirizava.
Quebrara suas pernas, abandonando-o em região deserta, atormentado por dores
intensas.
Durante alguns meses submeteu-se ao tratamento com passes magnéticos e água
fluída. Recebeu orientações quanto ao estudo, a reforma íntima, a prática do
bem…
Seu empenho, aliado às reuniões de desobsessão e à interferência de
benfeitores do além, modificaram as disposições de seu perseguidor.
Sensibilizado, disposto também à renovação, ele se afastou.
Em breve, como por encanto, as dores desapareceram.
No livro “O Que é a Morte” Carlos Imbassahy vai mais longe:
“Há um fato desconcertante para a Fisiologia e sobretudo para os
fisiologistas, no caso das lesões cerebrais, isto é, quando há operações em
partes essenciais do cérebro sem que a consciência e a inteligência fossem
suprimidas ou mesmo alteradas.”
Dentre inúmeras citações que ilustram sua afirmação, reporta-se a um
suboficial da guarnição de Antuérpia, na Primeira Guerra Mundial, que durante
anos sofreu persistente dor de cabeça. Não obstante, cumpria normalmente suas
obrigações.
Morto repentinamente, foi submetido à autópsia.
O patologista constatou, surpreso, que ele tivera um tumor na cabeça.
O cérebro estava reduzido a uma pasta purulenta.
Incrível que tenha conservado a sanidade mental e motora, sobrevivendo à
desintegração da massa encefálica!
Comenta Imbassahy:
“Em suma, o que a Fisiologia descobriu é que, normalmente, comumente, o
cérebro é necessário à manifestação do Espírito. O estudo de determinados fatos
fisiológicos, psíquicos ou metapsíquicos, provam, entretanto, que a dependência
não é constante, absoluta. O Espírito faz-nos, por vezes, o efeito de certos
mágicos a quem se amarra ou acorrenta com laços e cadeias irremovíveis; ei-los,
porém, que se desembaraçam, não se sabe como, e se apresentam em cena,
sorridentes, completamente livres. O mecanismo cerebral é inútil como prova a
favor das doutrinas materialistas.”
Mais cedo ou mais tarde a Ciência admitirá o fundamental:
O homo sapiens que há muito domina a Terra é apenas uma manifestação
do Espírito eterno que intelectualiza a matéria em favor de suas experiências
evolutivas nos domínios da carne.
Sem o binômio corpo-espírito jamais se operaria o desenvolvimento mental que
retirou o Homem do fundo das cavernas para elevá-lo às culminâncias da
civilização tecnológica.
Reformador nº 2000 – Novembro/1995