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Cartesianismo e Espiritismo

Cartesianismo e Espiritismo

SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Contexto Histórico. 3. Cartesianismo: 3.1. René
Descartes; 3.2. Sonho Premonitório; 3.3. O Discurso do Método: 3.3.1. Título
Original; 3.3.2. A Dúvida Metódica; 3.3.3. As Quatro Célebres Regras; 3.3.4.
Intuição e Dedução. 4. Problemas Tratados por Descartes. 5. Problemas Levantados
Por Descartes À Luz do Espiritismo. 6. Influência de Descartes Em Kardec. 7.
Conclusão. 8. Bibliografia Consultada.

1. INTRODUÇÃO

O objetivo deste estudo é mostrar o grau de influência que o racionalismo de
Descartes exerceu sobre os princípios básicos codificados por Allan Kardec. Para
a compreensão do tema, analisaremos: contexto histórico do método, visão geral
do Cartesianismo, os problemas tratados por Descartes e os problemas tratados
por Descartes à luz do Espiritismo.

2. CONTEXTO HISTÓRICO

Na Grécia antiga, berço da civilização ocidental, o pensamento dos
grandes filósofos estava assentado no método dedutivo, em que o
conhecimento era construído partindo-se do geral para o particular. “Para
Aristóteles, o método da filosofia é a lógica, ou seja, a aplicação das leis do
pensamento racional que nos permite passar de uma posição a outra posição por
meio das ligações que os conceitos mais gerais tem com outros menos gerais até
chegar ao particular”. (Garcia Morente, 1970, p.39)

Na Idade Média, período histórico em que predominava o movimento
filosófico e religioso denominado de Escolástica, o método é ainda dedutivo.
O conhecimento era construído através dos vários silogismos aristotélicos,
partindo-se do geral para o particular.

Na Idade Moderna, o método passa a ser indutivo, sem contudo
desprezar de todo o método dedutivo. Francis Bacon (1561-1626) ao apresentar o
seu Novum Organum, em que enfatiza o empirismo nas ciências, isto é, o
conhecimento passa a ser construído partindo-se do particular para o geral. René
Descartes insere-se nesse novo contexto da ciência.

3. CARTESIANISMO

3.1. RENÉ DESCARTES

René Descartes (1596-1650) nasceu em La Haye, França, pertencendo a uma
família de prósperos burgueses. Estudou no colégio jesuíta de La Fléche, na
época um dos mais conceituados estabelecimentos de ensino europeu. Foi soldado,
esteve sob as ordens de Maurício de Nassau. Participou de várias campanhas
militares. As obras de Descartes são de considerável extensão. As mais
importantes são: Regras para a Direção do Espírito (1628), O Discurso
do Método
(1637) e Meditações Filosóficas (1641). (Jerphagnon, 1982)

3.2. SONHO PREMONITÓRIO

A dez de novembro de 1616, o jovem Descartes teve um sonho premonitório.
Sonhou que o Espírito da Verdade o visitara e, reverente, tal como é
natural à Entidade de sua estirpe, comunicou-lhe que lhe competia a missão de
edificar uma “Ciência Admirável” , cujas coordenadas lhe trouxe em outra
visita onírica. Houve, ainda, uma terceira, concluindo o esclarecimento devido.
Ao acordar, preocupado com a responsabilidade de tão grande missão, pediu a Deus
que o amparasse a fim de que pudesse fielmente cumprir a grande tarefa, tão
acima de suas parcas forças. (São Marcos, 1993, p. 76)

3.3. O DISCURSO DO MÉTODO

3.3.1. TÍTULO ORIGINAL

O Discurso do Método para bem conduzir a razão e procurar a verdade nas
ciências, mais a Dióptrica, os Meteoros e a Geometria que são os ensaios deste
método.
(volume de 527 páginas)

3.3.2. A DÚVIDA METÓDICA

Descartes analisa o conhecimento vigente e conclui que nada se lhe oferece,
de modo indubitável, sobre o que possa fundamentar o seu trabalho. Tem que
buscar alguma coisa fora da tradição, uma idéia, uma única que seja, mas que
resista a todas as dúvidas. Toma como paradigma a geometria que partindo de
algumas proposições certas em si mesmas, descobre outras verdades e esgota todas
as possibilidades; também a filosofia deve, de igual modo, descobrir e
demonstrar as suas verdades, dedutivamente, partindo de algumas proposições
certas, indubitáveis. O edifício filosófico que lhe compete estruturar a de
assentar, sobre uma verdade contra a qual nenhuma dúvida, a mínima que seja,
possa pairar (São Marcos, 1993, p. 77).

3.3.3. AS QUATRO CÉLEBRES REGRAS

1.ª) Só admitir como verdadeiro o que parece evidente, evitar a precipitação
assim como a prevenção;

2.ª) Dividir o problema em tantas partes quantas as possíveis (é o que se
chama regra de análise);

3.ª) Recompor a totalidade subindo como que por degraus (regra da síntese);

4.ª) Rever o todo para se Ter a certeza de que não se esqueceu de nada e que,
portanto, não há erro. (Jerphagnon, 1982)

3.3.4. INTUIÇÃO E DEDUÇÃO

Dois atos fundamentais nos conduzem à verdade: a intuição e a
dedução
.

A intuição é o conceito, fácil e distinto, de um espírito puro e
atento, de que nenhuma dúvida poderá pesar sobre o que nós compreendemos.

A dedução é apenas uma série de intuições – e, como se pode sempre
esquecer um momento da série, será necessário pela imaginação e pela memória
habituarmo-nos a repassar cada vez mais rapidamente no nosso espírito os termos
da dedução, até que leve a uma “quase intuição” (Jerphagnon, 1982).

4. PROBLEMAS TRATADOS POR DESCARTES

1 – PROVA DA EXISTÊNCIA DE DEUS: descubro em mim próprio, ser finito,
a idéia do infinito. Ora, como não posso ser autor dessa idéia, é necessário que
o autor seja Deus e que, portanto, ele exista. Daí surge o famoso cogito ergo
sum
, ou seja, “penso, logo existo”.

2 – RES COGITANS E RES EXTENSA: enquanto a razão se tornava alma,
coisa pensante (res cogitans), o espaço, por seu turno, tornava-se
realidade material, coisa extensa (res extensa). Esta é a dualidade
cartesiana.

3 – UNIÃO DA ALMA E DO CORPO: prova que a alma é distinta do corpo.
Para Descartes, a alma existe e isso deveria ser o suficiente. (Jerphagnon,
1982)

5. PROBLEMAS LEVANTADOS POR DESCARTES À LUZ DO ESPIRITISMO

1 – PROVA DA EXISTENCIA DE DEUS: os Espíritos informam a Allan Kardec
que Deus é inteligência suprema causa primária de todas as coisas. Para o
Espiritismo, não há efeito sem causa. Tudo enquadra-se na lei natural. Ao
“Penso, logo existo” de Descartes, J. H. Pires escreve “sinto Deus em mim, logo
existo”. Quer dizer, Deus não é percebido pelo pensamento, mas pelo sentimento.

2 – RES COGITANS E RES EXTENSA: para Descartes, o Universo é
constituído de dois elementos fundamentais: res cogitans e res extensa.
ssas duas substâncias cartesianas, em termos espíritas, são a inteligência e a
matéria que, juntamente com Deus, formam a trindade universal.

3 – UNIÃO DA ALMA E DO CORPO: partindo-se de que alma e corpo são
distintos Allan Kardec, com o auxílio dos Espíritos, informa-nos que o
perispírito – matéria quintessenciada – é o elemento de ligação entre a alma e o
corpo físico.

6. INFLUÊNCIA DE DESCARTES EM KARDEC

O método cartesiano pode ser vislumbrado nas entrelinhas da Doutrina
Espírita. Allan Kardec, em várias passagens da Codificação, fala-nos que devemos
colocar tudo sobre o crivo da razão; que é preferível rejeitar nove verdades a
aceitar uma única verdade como falsidade; que a fé inabalável somente é aquela
que consegue enfrentar a razão face a face em todas as épocas da humanidade.

7. CONCLUSÃO

Esse estudo do Cartesianismo serve não só para nos chamar a atenção sobre o
tema, como também o de sugerir o desenvolvimento e aprofundamento do mesmo. Se
assim o fizermos, vamos encontrando o verdadeiro encadeamento das idéias e uma
explicação racional da síntese filosófica elaborada por Allan Kardec.

8. BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

  • GARCIA MORENTE, M. Fundamentos de Filosofia – Lições Preliminares.
    4. ed., São Paulo, Mestre Jou, 1970.
  • JERPHAGNON, L. Dicionário das Grandes Filosofias. Lisboa, Edições
    70, 1982.
  • PIRES, J. H. O Espírito e o Tempo: Introdução Antropológica ao
    Espiritismo.
    3. ed., São Paulo, EDICEL, 1979.
  • SANTOS, M. F. dos. Dicionário de Filosofia e Ciências Culturais. 3.
    ed., São Paulo, Matese, 1965.
  • SÃO MARCOS, M. P. Noções de História da Filosofia. São Paulo,
    FEESP, 1993.