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Ciclos Mediúnicos

Ao deter-se na coleta de informações para tentar compor um estudo sobre a história
da mediunidade, o observador atento vai descobrir que os fenômenos mediúnicos sempre
estiveram presentes na vida religiosa de todos os povos e nações.

Ao longo do tempo, em cada região ou localidade onde essas manifestações eclodiam,
recebiam nomes diferentes. No antigo Egito a mediunidade era reconhecida como ritos
de iniciação. Entre os gregos era chamada de mistérios de Elêusis. Na Pérsia chamava-se
magia, entre os babilônios, adivinhação. Para os antigos hebreus seu nome era dons
da profecia. Entre os cristãos primitivos a mediunidade chamou-se carisma, e recebeu
diversos nomes conforme suas diferentes modalidades de manifestação: dons do espírito,
dons de cura, dons de línguas, profecia. Os ofitas chamaram-na de delírios espirituais.
Entre os druidas seu nome era ritual de magia. Entre os cátaros o transe mediúnico
era chamado de consolamentum. Na Alemanha, na época de Lutero, à eclosão de um “surto
mediúnico”, deram-lhe o nome de epidemia mística. Além destas, muitas outras definições
foram dadas aos fenômenos mediúnicos, registradas pela história religiosa de cada
povo. Finalmente, com Allan Kardec, esses fenômenos consolidaram-se como mediunidade,
e hoje esse termo é aceito, com algumas exceções, quase que universalmente. Os católicos,
na atualidade, reabilitaram a mediunidade de cura em seu meio com o nome de movimento
de renovação carismática, numa referência aos carismas, nome que a identificava
nos tempos apostólicos, e os evangélicos, na atualidade, dão-lhe o nome de descida
do espírito santo.

Mas não somente em movimentos coletivos manifestou-se a mediunidade. Também com
indivíduos, isoladamente, dentro ou fora de ambientes místicos ou religiosos, os
fenômenos mediúnicos nunca deixaram de se manifestar, aqui e ali, com qualquer tipo
de pessoas, em lugares diferentes, em línguas diferentes, e em tempos diferentes.
Naturalmente, as forças espirituais superiores que assistem à humanidade, através
dos processos mediúnicos, sempre mantiveram abertos os canais de intercâmbio entre
seu plano e o nosso, como uma necessidade de se manterem permanentes essas experiências,
visando aos tempos futuros, quando o conceito de religião tivesse transcendido às
velhas concepções de religião organizada, com seus rituais, dogmas, e formalismos
inúteis.

De entremeio a tantas manifestações do espírito, ao longo de milênios, três grandes
ciclos mediúnicos se sobressaíram na história, coincidindo com três importantes
revelações religiosas que a humanidade assistiu, e que os espíritas consagram como
<as três grandes revelações>. Isso nos leva a refletir sobre as informações de André
Luiz segundo as quais religião e mediunidade são intercorrentes, isto é, embora
coisas diferentes, ambas se complementam. Desta maneira, o Mediunismo funciona como
fator coadjuvante na consolidação da cultura religiosa entre os homens, e, conseqüentemente,
como necessário e poderoso instrumento auxiliar para sua ascensão espiritual.

O primeiro grande ciclo mediúnico ocorreu na velha Canaã dos hebreus, ao tempo
de Moisés. O grande profeta (médium) e legislador hebreu pretendeu fazer de seu
povo uma grande nação teocrática, e para preservá-la dentro de princípios teocráticos,
precisaria educar seus irmãos de raça para que assimilassem perfeitamente as “ordens
que seriam ditadas por Jeová”. Povo rude e insubmisso, cercado por todos os lados
por nações belicosas e pagãs, que faziam de seus variados deuses mitológicos seus
objetos de adoração, para Moisés, a crença dos judeus em Jeová, Deus único, precisaria
estar fortemente arraigada num profundo sentimento religioso. Assim como os deuses
mitológicos estavam sempre presentes em cada atividade e costumes dos povos vizinhos,
também Jeová deveria estar presente em cada peripécia da vida dos judeus. Moisés
deu-lhes esse Deus, único e superior. Porém, igualmente aos deuses mitológicos,
Moisés dotou-o de sentimentos humanos, e pela boca do povo (via mediúnica), fê-lo
falar a língua do povo, e expressar os sentimentos desse próprio povo. Ao contrário
do que entenderam os intérpretes dos textos bíblicos, o grande líder hebreu não
proibiu o profetismo (mediunismo), e sim o liberou, e estimulou a sua prática junto
à sua gente. …quem dera que todo o povo de Israel fosse profeta, e que o Senhor
pusesse o seu espírito sobre ele! (Nm. 11,29). Como Moisés sentia- se impotente
para conter a insubmissão de seu povo, pediu socorro aos espíritos, que o mandou
escolher setenta anciãos entre os mais respeitáveis, e de uma só vez torná-los médiuns
…e tirando do espírito que estava sobre ele, o pôs sobre aqueles setenta anciãos;
e aconteceu que, quando o espírito repousou sobre eles, profetizaram. E estes passaram
a colaborar com Moisés na obra de doutrinação de seu povo. Quanto mais perto de
Jeová os judeus se sentissem, mais conscientes estariam de sua missão de <povo escolhido>.
Porém Moisés enganou-se. De posse dos dons espirituais, cada judeu viu nessa prática
uma maneira de subtrair vantagens. A venda de favores espirituais tornou-se atividade
comum entre eles. E a mediunidade, entre aquele povo, breve perverteu-se. As hostes
de espíritos inferiores aproveitaram-se do ambiente favorável que se estabeleceu
a seu favor, para estimularem aquela gente invigilante a reverenciar falsos deuses
e estátuas de animais como o bezerro de ouro, cujo simbolismo compreendia rituais
sensualistas que terminavam em festivais de sexo explícito coletivo. Moisés compreendeu
que errara. Seu povo estava ainda imaturo para assumir responsavelmente as práticas
de tão elevadas revelações, e de conviver com elas, obtendo com esse privilégio
a acumulação de valores morais que o haveriam de tornar uma nação realmente superior
em relação aos outros povos. O grande condutor hebreu voltou atrás em sua decisão,
e só então proibiu o intercâmbio com os espíritos entre sua gente, e reprimiu com
violência o seu uso. Os que ousassem praticá-lo, pagariam com a morte. Encerrava-se
para a história o primeiro grande ciclo mediúnico. O profetismo voltou assim a ser
de uso restrito às escolas de iniciação. Por muitos séculos seguidos, tornou-se
atividade exclusiva dos profetas.

O segundo grande ciclo mediúnico ocorreu cerca de mil e trezentos anos após o
primeiro, também na Palestina, novamente entre o povo judeu, com o advento do Cristianismo.
Na realidade, sua preparação começara cerca de trezentos antes do nascimento de
Cristo. Nessa época surge na Palestina uma nova seita judaica, secreta, onde as
atividades mediúnicas eram amplamente exercitadas e reverenciadas. Os membros dessa
seita, ao tempo de Jesus, ficaram conhecidos como Essênios. Os essênios viviam em
comunidades isoladas, longe das multidões, e levavam vida ascética. Diziam que precisavam
estar santamente preparados para receber o Senhor e para servi-lo, quando ele chegasse.
Após a morte de Jesus eles saem de cena, tão misteriosamente como apareceram. Grande
parte das correntes espiritualistas tentam ligar os essênios à vida de Jesus. Evidências
evangélicas e históricas tornam verossímil essa hipótese. Acredita-se que Jesus
tenha convivido com esse povo durante o período obscuro de sua vida que vai dos
treze aos trinta anos, onde teria organizado sua campanha evangélica e preparado
os essênios, mediunicamente, para darem suporte aos fenômenos psíquicos que ele
iria produzir. O Mestre Nazareno, ao iniciar sua vida pública, fez da mediunidade
uma prática constante. Suas curas, transfigurações, “ressurreições” de mortos, multiplicação
de pães, locomoção sobre as águas, etc., são a mais clara evidência de sua especial
capacidade de provocar fenômenos mediúnicos de efeitos físicos, nos quais, com certeza,
precisaria do apoio de médiuns altamente habilitados para a produção de fluídos
abundantemente suficientes para que aqueles extraordinários fenômenos se produzissem.
Emmanuel, nos dias de hoje, chama a Jesus de médium sublime. Também seus apóstolos
e discípulos, todos foram médiuns que produziram fenômenos abundantes, e eram preparados
para exercitarem essas atividades. Paulo de Tarso, o apóstolo dos gentios, foi um
médium extraordinário, e fez do mediunato um dos seus mais importantes instrumentos
de trabalho. Como ocorre nos centros espíritas de hoje, cada igreja cristã era uma
escola de educação mediúnica, onde se formavam médiuns com as mais variadas modalidades
de manifestação espiritual. Importantes escolas de iniciação à mediunidade floresceram
nos tempos apostólicos, sendo que a mais importante foi a de Antióquia. O serviço
mediúnico ocupava posição destacada entre os primeiros cristãos. Nenhuma decisão
importante se tomava sem consulta prévia aos espíritos. O Cristianismo primitivo
foi um movimento mediúnico por excelência. Foram quase trezentos anos ininterruptos
de atividades mediúnicas. A ninguém era negado o desenvolvimento de suas faculdades.
É claro que cada interessado deveria passar por um noviciado (treinamento mediúnico),
e só após, era batizado pelo Espírito santo (considerado médium), com a imposição
das mãos sobre a cabeça dos neófitos.

Ao assumir integralmente o controle do Cristianismo, o catolicismo romano tratou
de por fim aos serviços mediúnicos. Como nos tempos de Moisés, a Igreja Cristã romana,
menos cristã e mais romana, usou da violência na repressão aos dons do espírito,
e cada médium pagava com a morte, agora na fogueira, a sua ousadia em desafiar as
proibições dos bispos. O intercâmbio com os espíritos definha, e acaba por desaparecer
no seio do Cristianismo. O segundo grande ciclo mediúnico termina.

O terceiro grande ciclo mediúnico, e o mais importante dos três, ocorre em nossos
dias, e teve início em meados do século XIX, tendo sua eclosão começado nos Estados
Unidos com as irmãs Fox, e se espalhado rapidamente pelo mundo. Seu epicentro fixou-se
na França, onde, através de Allan Kardec, os Espíritos Superiores legaram à humanidade
a mais avançada escola religiosa de todos os tempos, tendo como seu mais vigoroso
apoio o uso das práticas mediúnicas. Esse fator diferencia o Espiritismo das demais
escolas religiosas e reflete sua grandeza. Grandeza que os antigos hebreus e cristãos
primitivos também conheceram, mas que a perderam quando viram-se despojados do intercâmbio
com os espíritos.

Os hebreus perderam o seu acesso aos dons da profecia quando passaram a fazer
mau uso deles. Os primeiros cristãos viram suprimidos seus carismas pelos interesses
mesquinhos e particularistas da igreja poderosa que colocou as “- razões do estado”
acima das necessidades espirituais de seus seguidores. E os espíritas modernos?
O que estão fazendo da mediunidade? Para onde a estão levando? Não chegou o momento
de fazer-se uma autocrítica?

É claro que os Espíritos Superiores, responsáveis pela condução e aprimoramento
das faculdades mediúnicas entre os homens estão vigilantes em seus postos. Mas o
fator mediúnico não depende só deles. É uma atividade de duas vias e a única viável
entre os dois planos da vida, conhecida pelos humanos. É uma atividade de duas vias e a única viável
entre os dois planos da vida, conhecida pelos humanos. Sem a participação do médium
o fenômeno não ocorre. Faz-se urgente pois, por parte destes, profundas reflexõ
Os espíritas não podem alhear-se ao que se vê com bastante freqüência em casas espíritas,
algumas até renomadas, onde obras dita mediúnicas, tais como livros, pinturas, músicas,
sem qualquer valor artístico, e sem nenhum conteúdo moral ou doutrinário sendo comercializadas,
fazendo supor-se, infelizmente, sejam obras de mistificação dos próprios médiuns.
Estamos frente a um descalabro mediúnico? Reflitamos pois.

(Publicado no Correio Fraterno do ABC Nº 362 de Março de 2001)

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