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Curas: uma visão moderna da terapia dos Espíritos

No II Entrade, realizado em São José do Rio Preto em 1991, um jovem se
levantou durante o debate e fez a seguinte indagação: “até que ponto o Centro
Espírita deve se preocupar com a cura, ou seja, curar é uma atividade importante
do Centro?”. Respondendo a essa questão, poderíamos repetir simplesmente
Herculano Pires em seu livro “Ciência Espírita”: “curar e educar são funções
conjugadas do homem na luta pela sua transcendência”. Assim, o Centro Espírita
objetiva facilitar a compreensão do homem de sua transcendência e nesta luta a
cura constitui um fator importante, uma prática a ser desenvolvida pelo Centro.

Por quê? Poderiam perguntar. Simplesmente porque o Espiritismo contém um
patrimônio grandioso no campo dos conhecimentos espirituais, o qual leva à
compreensão do homem como um ser cósmico, com passado, presente e futuro, de sua
realidade como ser imortal e da natureza e suas energias, mediante as quais os
males não resolvidos pela medicina convencional podem ser objetivamente tratados
e, em muitos casos, solucionados pelo Centro Espírita.

Não se pode desconhecer que nem todo Centro Espírita está capacitado a
realizar atividades de cura, por algumas razões básicas: pela falta de
conhecimentos doutrinários de seus dirigentes, por causa de preconceitos devidos
à má formação doutrinária e pela ausência de colaboradores devidamente
preparados e de médiuns bem desenvolvidos. Esses fatores têm causado muitas
deficiências em nossas casas doutrinárias, trazendo confusões no momento de
praticar o Espiritismo conforme os preceitos das obras básicas.

Para se criar condições favoráveis ao desenvolvimento de atividades de cura é
preciso reunir uma série de fatores:

– em primeiro lugar, pessoas sérias e humildes, capazes de compreender as
dificuldades do trabalho e os seus perigos. A cura é um dos trabalhos que mais
propiciam a queda moral. Muitos médiuns curadores realizaram maravilhas, mas
foram incapazes de superar as facilidades oferecidas a eles em troca do seu
trabalho. As experiências demonstram que ao deixar-se arrastar por essas
facilidades, o médium tende a ver os Espíritos sérios e bem intencionados
abandonarem-no, sendo então substituídos por Espíritos galhofeiros. Esta
observação é feita por Kardec no Livro dos Médiuns;

– o aparecimento de médiuns conscientes e conhecedores da Doutrina Espírita,
que se disponham a realizar o trabalho de atendimento aos necessitados sem o
orgulho daqueles que, por pura vaidade, prometem curas e soluções aos pacientes.
O médium deve saber que não é ele quem cura, mas os Espíritos;

– uma disciplina séria na organização das reuniões dedicadas ao atendimento
público, de modo a que não faltem nem o esclarecimento aos que procuram a casa,
nem aconteça de pessoas serem iludidas em sua boa fé, imaginando que o centro
espírita tem poderes mágicos e, portanto, irá de fato resolver os problemas de
que são portadoras;

– um estudo constante das obras da Codificação e das subsidiárias, a fim de
penetrar cada vez mais, somando teoria e prática, no conhecimento das
possibilidades que a Doutrina oferece no campo da cura e das limitações dos
Espíritos, dos médiuns intermediários e os próprios pacientes, em relação aos
resultados finais. As Leis Naturais, que governam o Universo, estão acima da
vontade momentânea de cada pessoa ligada ao trabalho em si.

“No centro espírita, – afirma Herculano Pires – o problema das curas não pode
restringir-se a tentativas ocasionais ou aleatórias”. As curas precisam ser
cuidadas de forma permanente, continuada, unindo informação e atitude prática em
benefício dos que procuram o consolo da instituição. Boa parte, talvez, dos
insucessos e dos desvios nas práticas curativas do centro pode ser creditada à
falta desses cuidados: estamos certos de que a ausência de profundidade nas
ações curativas tem levado muita gente idealista a buscar, fora dos parâmetros
doutrinários, processos curativos diversos, a fim de integrá-los nas atividades
da instituição, o que nem sempre é bom.

O estudo do fundamental na prática curativa espírita

Allan Kardec dá a nota principal: no Livro dos Médiuns cuida de informar
sobre a presença específica dos médiuns curadores. É interessante ter presente
que, ao exercer uma participação no processo curativo desenvolvido numa casa
espírita, o indivíduo (mesmo não possuindo mediunidade ostensiva) pode estar
sendo um intermediário entre a ação dos Espíritos e os pacientes. Daí, portanto,
a necessidade de perceber que, ao falar aos médiuns, Kardec se dirige não apenas
aos que possuem mediunidade ostensiva, mas também aqueles que, em determinados
momentos, por força das circunstâncias, se colocam na posição de canalizadores
da ação dos espíritos.

O médium de cura verdadeiro tem uma importância muito grande nas atividades
de cura do centro espírita. O fato de ser portador desta mediunidade determina
que ele deve exercê-la de forma cuidadosa e desinteressada (valor moral), a que
o Espiritismo dá grande destaque. Por isso, não se compreende o comportamento de
alguns dirigentes de casas espíritas, que condenam as curas ao ostracismo, como
se elas não fossem necessárias ainda nos dias de hoje, tanto quanto o eram na
época do Cristo.

O estudo, pois, desta parte doutrinária, encontra no Livro dos Médiuns as
informações sobre os médiuns nos seus aspectos prático e de comportamento moral,
que alia o comprometimento do portador da mediunidade com o seu exercício:
ninguém possui qualquer tipo de mediunidade por acaso.

Sua existência revela algo anterior, acordado entre o indivíduo e as
necessidades de sua trajetória e da evolução de seus semelhantes.

Deixando o Livro dos Médiuns, caímos direto no livro A Gênese, também de
Kardec. Ali, principalmente no capítulo XIV, Os Fluidos, encontramos material
profundo, de estudo constante. O seu conhecimento, que abrange avaliação e
reavaliação permanente, é por si de fundamental importância para aqueles que
estão envolvidos com a cura. A simplicidade com que Kardec coloca a questão pode
parecer a muitos superficial; uns podem entender que o Codificador não foi a
fundo na questão, outros, que faltam informações mais práticas. Essa visão, sem
dúvida, poderá desembocar em dois comportamentos, ambos perniciosos: o dirigente
ir além fronteiras à busca de processos curativos diferentes; o segundo está
relacionado aos poucos resultados práticos que possam estar sendo obtidos no
centro espírita com a cura.

Dizer que o Espiritismo oferece uma possibilidade de exercício da cura de
forma ampla não significa estar envolvido em nenhuma cegueira de raciocínio.
Antes, é uma grande verdade, que pode ser comprovada pela prática continuada e
bem conduzida. Em A Gênese, Kardec analisa tudo aquilo que se encontra
relacionado no campo da cura: a existência da energia cósmica, a que chama
fluidos, a presença fundamental do pensamento (de encarnados e desencarnados,
portanto, de médiuns, espíritos, pacientes e participantes, no caso das curas),
a participação do perispírito e, finalmente, o que tudo isso tem a ver com as
doenças físicas e espirituais e sua influência moral sobre todos nós.

Nas obras subsidiárias, especialmente em André Luiz, vamos encontrar outras
informações, também de grande valia para o aprofundamento da questão: além de
passar em revista toda a teoria da Codificação, demonstrando por exemplos
práticos a sua realidade, este autor espiritual nos coloca em contato com os
mecanismos da mediunidade, oferecendo uma visão até então inexistente do
desenvolvimento do processo nos dois ângulos da vida: o visível e o invisível.
Aqui, porém, é preciso enfatizar que, como qualquer outro autor, André Luiz
precisa ser interpretado, e bem para que não sejam as suas palavras tomadas como
lei; tidas como definitivas. Principalmente, porque no campo da interpretação
cada pessoa pode ter uma visão diferente e julgá-la como a melhor. André Luiz é,
como afirma Emmanuel, um repórter do espaço, o que significa um portador de
notícias e informações e não um condutor de leis.

Com isto, fecha-se o círculo para o estudioso e o praticante, no que diz
respeito à Doutrina Espírita.

No entanto, o conhecimento se estende às conquistas científicas, que podem
ser alcançadas em obras diversas relacionadas com a medicina, como forma de
complementar o saber daqueles que se enveredam pelo campo das curas. Não se
confunda a busca desses conhecimentos com a introdução nas casas espíritas de
métodos e processos que nada têm a ver com a Codificação.

O que é possível curar

Sirvo-me, mais uma vez, da feliz expressão de Herculano Pires para iniciar
este item: “A cura espírita – diz ele – não se efetua, por mais dedicados que
sejamos ao Espiritismo, por mais abnegados no tocante ao próximo, se a doença ou
deficiência que sofrermos for em si mesma o remédio de que de fato precisamos”.
Curas acontecem ou não acontecem. Isso nem sempre depende de quem está entre o
paciente e os espíritos. A doença não é um mal em si; sua função, muitas vezes,
é de fazer progredir as pessoas. Quando essa função é mais importante, a doença
não tem cura; pode ter alívio, mas não solução final. Esta só acontecerá em
momento que desconhecemos.

Isso importa em dizer que a cura não depende exclusivamente da vontade do
intermediário, seja ele médium ou não. Em não poucas ocasiões, dirigentes
espíritas diversos têm se desestimulado em seus trabalhos curativos pela falta
de resultados aparentemente positivos; esquecem-se que no campo da cura, a
persistência, aliada ao estudo e à boa vontade, são fatores decisivos. À falta
da persistência, todo um trabalho promissor pode ruir.

Assim como certas querelas, mal interpretadas e pior ainda assimiladas podem
levar a casa espírita à ruína, também a não assimilação da falta de melhores
resultados em certos períodos, principalmente nos iniciais, das atividades
curativas podem servir para desistência dos praticantes, o que será certamente
prejudicial.

Outro detalhe que precisa ser estudado diz respeito ao lugar comum que se
tornou falar do chamado “merecimento”. Aqui e ali se diz, quando alguém alcança
uma cura, que fulano “mereceu”. Quando não, alega-se que não teve esse
“merecimento”. E fica a situação colocada em termos simplórios e mal
esclarecidos. Muitas vezes a pessoa é curada não por possuir dotes de virtude,
mas exatamente por causa do seu orgulho: a cura vem então como forma de fazê-lo
ver que a sua deficiência moral precisa ser eliminada. Outras vezes, não obter a
cura é sinal de verdadeiro merecimento: a doença prolongada vai levar o
indivíduo inevitavelmente ao processo de eliminação de seus compromissos
passados. Colocadas as coisas desta forma, como se vê, o merecimento encontra
outra interpretação lógica.

Há dois tipos de indivíduos cujo comportamento traz muitos prejuízos ao
Espiritismo: o fanático e o preconceituoso. O primeiro, porque se liga
definitivamente a certas questões, tomando-as como as verdadeiras e únicas e
impossibilitando-se de compreender a situação com amplitude. O fanático é um
convencido. Ninguém o modifica. O segundo assume posições tais diante das
circunstâncias que, por incompreensão, dispensa tudo aquilo que não faz parte de
seu mundo.

Quando o preconceito é prejudicial

No campo doutrinário, deparamos com ambos, o fanático e o preconceituoso. E o
campo das curas é pródigo de sua presença. Alguns dirigentes têm para com as
curas uma visão deformada, anticientífica, de condenação de seu uso. E para
isso, arrolam diversos argumentos, todos eles facilmente destrutíveis. Assim
como em relação a outros tipos de mediunidade, dizem, por exemplo, que o
Espiritismo é doutrina de conhecimento e não de proselitismo, de fantasias.
Outras vezes, afirmam que as curas são ocasiões apenas para demonstrações, que
elas não trazem nada de prático para a doutrina.

Condenam, portanto, os médiuns e todos aqueles que estão ligados às
atividades curativas, como se os médiuns fossem passíveis de condenação
simplesmente por serem portadores da mediunidade de cura. Em sua visão curta,
alegam que todos os médiuns de cura se desviam moralmente e, para isso, apontam
os exemplos do passado. Gostariam de encontrar médiuns perfeitos, mas como sabem
que isso é impossível, tentam destruir a validade da mediunidade.

Alguns, por idiossincrasia, admitem a existência dos médiuns de cura, mas
tentam circunscrevê-los às quatro paredes silenciosas de uma organização. Para
estes, só têm valor os médiuns que trabalham no anonimato completo ou que se
submetem ao controle de certos métodos, que utilizam para escondê-lo e não raro
moldá-lo a seus interesses. Como não podem compreender verdadeiramente o médium
e a mediunidade, em seus diversos aspectos, porque não raro estes médiuns se
mostram independentes e fogem a qualquer limitação de seu exercício, preferem
portanto condená-los.

Finalmente, há os que temem as conseqüências legais do exercício da medicina
curativa no centro espírita e, dessa forma, se postam na periferia desses
conhecimentos, substituindo a sua ausência por outros interesses e
justificativas. Tudo isso, porém, não deve causar surpresa nem espanto. Há
pessoas que não conseguem ver o Espiritismo senão pela ótica acanhada das quatro
paredes a que se confinam a vida inteira.

Conclusão

A visão moderna das curas segundo o Espiritismo, como se observa, é a visão
de Kardec e dos que, tendo estudado a Doutrina, compreendem que as informações
que ela oferece carecem de estudo paciente, constante e continuado, e de uma
prática condizente com suas teorias renovadoras e reformadoras. A doutrina teve
ainda muito pouco tempo para ser praticada em sua profundidade verdadeira. Ela
carece de muitos séculos mais. Portanto, dizê-la moderna é entendê-la em seus
postulados gerais e saber que ela, para ser superada, precisará da evolução dos
homens que habitam nosso planeta.

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