Diante da Vida
Milhões de vidas passaram antes de ti e consumiram-se na voragem do tempo.
Passaram sem se encontrarem a si mesmas, porque passaram correndo atrás de
outras vidas.
Não te iludas, buscando-a fora de ti, no prazer, no dinheiro, na fama,
na glória, porque o prazer, o dinheiro, a fama e a glória passarão no trânsito
de todas as coisas e deixar-te-ão de mãos e coração vazios. Evita, pois, renovar
o suplício constante de cada dia.
Jamais permitas que as convenções mundanas oponham embargos ao surto criativo
da Vida. Deixa que ela se exprima em ti, na plenitude e espontaneidade de suas
forças, se realmente queres libertar-te da ilusão e escravidão dos sentidos.
Não procures caminhos para um encontro com a Vida. Quem procura um caminho
para vê-la, arrisca-se a não encontrá-la jamais. Entre ti e ela não há
caminhos, simplesmente porque entre ti e ela não há espaço, nem distâncias. Tu a
desconheces, porque te desconheces a ti mesmo.
O segredo de tua felicidade está em conheceres a identidade da Vida que está
em ti com a que está em teu semelhante. Não pode haver conflito entre duas
ou mais formas dela, quando elas descobrem a identidade de sua essência.
Não te aflijas com a perda dos teus haveres. Lembra-te sempre de que não há
pobreza para aquele que compreendeu o espírito da vida.
Diante da Vida, não tenhas medo ou coragem, porque medo ou coragem são
atitudes incompatíveis com o espírito da Vida. Tem simplesmente compreensão,
porque compreensão é o que ela te pede, para franquear-te seus imensos tesouros.
Não pretendas fazer de tua uma cópia ou arremedo de outras. Cada
qual deve ser a expressão de seu próprio destino, naquilo que este tem de mais
nobre e sublime. Sê, pois, tu mesmo, sem imitações, nem simulações.
Recorda-te, a cada instante, de que tua vida se acha entrosada na complexa e
misteriosa urdidura do Universo. Nada, pois, do que existe te deve ser alheio ou
indiferente.
Ama a tua vida, mas ama-a com aquele puro e desinteressado amor com que o
artista ama a obra em que ele busca realizar-se. Dignifica-te nela, para que em
ti se dignifique a própria humanidade.
A Vida é feita de luta, mas, na luta pela mesma, nunca assumas uma posição
agressiva ou destrutiva, para que não agridas ou destruas a ti mesmo. Diante do
mal, pratica o bem; diante da treva, faze a luz; diante do ódio, difunde o amor;
diante da mentira, proclama a verdade.
Não penses que poderás evadir-te dela, pela porta da morte, ou que, pela
porta da morte, poderás ingressar na Vida. Nunca estiveste ou estarás fora da
dela, nem ela esteve ou estará jamais fora de ti. Toma, pois, consciência da
Vida que jaz oculta na profundeza de ti mesmo, se queres tomar consciência de
tua eternidade.
Do livro “Primado do Espírito” Capítulo 5
(Jornal Mundo Espírita de Setembro de 98)