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Observações sobre a dor física

“Por mais admirável que possa parecer à primeira vista, a dor é apenas um
meio de que usa o Poder Infinito para nos chamar a si e, ao mesmo tempo,
tornar-nos mais rapidamente acessíveis à felicidade espiritual, única duradoura.

É, pois, realmente, pelo amor que nos tem, que Deus envia o sofrimento.
Fere-nos, corrige-nos como a mãe corrige o filho para educá-lo e melhorá-lo;
trabalha incessantemente para tornar dóceis, para purificar e embelezar nossas
almas, porque elas não podem ser verdadeiras, completamente felizes, senão na
medida correspondente às suas perfeições.

Para isso pôs Deus, nesta terra de aprendizagem, ao lado das alegrias raras e
fugitivas, dores freqüentes e prolongadas, para nos fazer sentir que o nosso
mundo é um lugar de passagem e não o ponto de chegada. Gozos e sofrimentos,
prazeres e dores, tudo isto Deus distribuiu na existência como um grande artista
que, na tela, combina a sombra e a luz para produzir uma obra-prima”.

(Texto encontrável no livro “O problema do ser, do destino e da dor”, de
autoria de Léon Denis, 15ª edição, FEB, 1989, páginas 380 e 381.)

É impressionante o que a dor física, sobretudo quando aguda e constante,
provoca em termos de reflexão.

Com efeito, em primeiro lugar, mostra-nos com muita clareza que a matéria é
precária e fragilíssima, de maneira que o nosso corpo físico, que é o veículo de
que nos valemos para transitar pelo planeta Terra, de repente, num átimo, fica
travado, dependente de quase tudo e, às vezes, de tudo, à mercê da compreensão,
da benevolência e da boa vontade dos familiares e dos amigos.

Em segundo lugar, mostra-nos que devemos valorizar, e muito, todos os
instantes em que desfrutamos de saúde física plena, que nos permite a livre
movimentação, o trabalho, o estudo, a própria reflexão, etc., uma vez que, em
geral, não nos damos conta de que os ombros, os joelhos, as mãos, por exemplo,
participam de todos ou de quase todos os nossos movimentos, de sorte que se
essas estruturas estão bastante enfermas ou simplesmente não estão bem, mesmo
que isoladamente, o nosso corpo físico passa a estar comprometido para os
mínimos movimentos, para as mínimas coisas, por mais elementares que sejam. E
isto para não citar, propositadamente, o que representam para a nossa existência
física o coração, a visão, a respiração…

Em terceiro lugar, a dor física quando chega altera a nossa escala de
valores, fazendo com que aquilo que muitíssimo valorizávamos há um minuto atrás,
passe a não ter valor ou, pelo menos, a não ter o valor que lhe atribuíamos. Por
outro lado, em geral, passamos a dar enorme valor à saúde física, ao mesmo tempo
que nos recriminamos por não termos enxergado algo tão evidente, evidentíssimo.

Em quarto lugar, de um modo geral, a chegada da dor física torna-nos mais
humildes, na medida em que percebemos a ampla fragilidade de nosso corpo físico,
assim como que estamos aqui de passagem, já que a Terra é verdadeiramente um
educandário, um hospital, de modo que nela não estamos em férias. Ao contrário,
aqui nos encontramos para aprender, muito aprender, inclusive com a dor ou pela
dor.

Por último e por outro ângulo, nessas brevíssimas observações, temos que
convir que a dor física é também uma bênção, embora não pareça, exatamente por
ser o aguilhão que nos recoloca no caminho da evolução, revelando-nos a
importância da busca constante do auto-aperfeiçoamento e, por igual,
servindo-nos de alavanca para o progresso, em suas múltiplas expressões, que
deve ser permanente, de molde a nos conduzir à perfeição relativa e à suprema
felicidade, destino final dos seres humanos e, portanto, nosso verdadeiro ponto
de chegada.

(Jornal Mundo Espírita de Agosto de 1998)