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Em Kardec e em Emmanuel

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Recordamos as duas notáveis personalidades para destacar um dos aspectos mais importantes do pensamento espírita. Como se sabe, o tríplice aspecto da Doutrina Espírita: Ciência, Filosofia e Religião, têm sido, muitas vezes, motivo de polêmicas e discussões inúteis. Especialmente, quando se trata sobre o caráter religioso do Espiritismo. Estão esquecidos os protagonistas de defesas exclusivas do aspecto científico em detrimento do aspecto religioso, da existência desse tríplice aspecto, tão claro para os que estudam o Espiritismo.

Verdadeiramente causaremos enorme prejuízo ao entendimento doutrinário dos postulados espíritas, se desejarmos excluir ou mesmo marginalizar o fundamental aspecto da moral religiosa em nossos estudos, reflexões e esforços para divulgação do Espiritismo.

Kardec abordou a temática muitas vezes e Emmanuel. Espírito, entre outros autores, se postou firme em defesa do aspecto religioso de nossa incomparável Doutrina Espírita. Claro que ela tem embasamento científico, desdobramentos filosóficos e, não há qualquer dúvida, suas inevitáveis consequências religiosas. Como negar isso?

No livro Emmanuel, do Espírito Emmanuel, na psicografia de Chico Xavier, e de edição da FEB. Diz o nobre benfeitor em seu capítulo IV, com o significativo título A Base Religiosa:

“No futuro, viverá a humanidade fora desse ambiente de animosidade entre a ciência e a religião e julgo mesmo que em nenhuma civilização pode a primeira substituir a segunda. Uma e outra se completam no processo de evolução de todas as almas para o Criador (…). As suas aparentes antinomias, que derivam, na atualidade, da compreensão deficiente do homem, em face dos problemas transcendentes da vida, serão eliminadas, dentro do estudo, da análise e do raciocínio. (…)”

Destaco pequenos trechos do valioso capítulo e peço ao leitor consultá-lo na íntegra. Parece que estamos esquecidos de tão importantes reflexões. No subtítulo seguinte O Tóxico do Intelectualismo, pondera o autor espiritual:

 

“Nos tempos modernos, mentalidades existem que pugnam pelo desaparecimento das noções religiosas do coração dos homens, saturadas do cientificismo do século e trabalhadas por ideias excêntricas, sem perceberem as graves responsabilidades dos seus labores intelectuais, porquanto hão de colher o fruto amargo das sementes que plantaram nas almas jovens e indecisas. (…)”.

 

E prossegue no que podemos considerar autêntica advertência:

“Pede-se uma educação sem Deus, o aniquilamento da fé, o afastamento das esperanças numa outra vida, a morte da crença nos poderes de uma providência estranha aos homens. Essa tarefa é inútil. Os que se abalançam a sugerir semelhantes empresas podem ser dignos de respeito e admiração, quando se destacam por seus méritos científicos, mas assemelham-se a alguém que tivesse a fortuna de obter um oásis entre imensos desertos. Confortados e satisfeitos em na sua felicidade ocasional, não vêem as caravanas inumeráveis de infelizes, cheias de sede e fome, transitando sobre as areias ardentes. (…)”

Claro, é fácil descartar o aspecto da moral religiosa, que inclui a fé – ainda que em diferentes manifestações na cultura popular – quando estamos satisfeitos materialmente.

E pondera nos tópicos seguintes, que peço ao leitor consultar na íntegra, face à claridade de suas expressões:

“O sentimento religioso é a base de todas as civilizações. Preconiza-se uma educação pela inteligência, concedendo-se liberdade aos impulsos naturais do homem. A experiência fracassaria. É ocioso acrescentar que me refiro aqui à moral religiosa, que deverá inspirar a formação do caráter e do instituto da família e não ao sectarismo do círculo estreito das igrejas terrestres, que costumam envenenar, aí no mundo, o ambiente das escolas públicas, onde deverá prevalecer sempre o mais largo critério de liberdade do pensamento. (…)

 

Sobre a falibilidade humana, diz o conhecido Espírito:

 

“Em cada século o progresso científico renova a sua concepção acerca dos mais importantes problemas da vida. Raramente os verdadeiros sábios são compreendidos por seus contemporâneos. Se as contradições dos estudiosos são o sinal de que a Ciência evolve sempre, elas atestam, igualmente, a fraqueza e inconsistência dos seus conhecimentos e a falibilidade humana.”

 

E conclui com farto material para nossa reflexão:

 

“Diz-se que o pensamento religioso é uma ilusão. Tal afirmativa carece de fundamento. Nenhuma teoria científica, nenhum sistema político, nenhum programa de reeducação pode roubar do mundo a ideia de Deus e da imortalidade do ser, inatas no coração dos homens. (…) A religião viverá entre as criaturas, instruindo e consolando, como um sublime legado. (…) O que se faz preciso, em vossa época, é estabelecer a diferença entre religião e religiões. A religião é o sentimento divino que prende o homem ao Criador. As religiões são organizações dos homens, falíveis e imperfeitas como eles próprios (…).

 

Mas busquemos Kardec. É na Conclusão de O Livro dos Espíritos, item V, que afirma o Codificador em meio a importantes considerações: “(…) O Espiritismo é forte porque ele se apóia sobre as próprias bases da Religião (…)”. E no item VII, comentando os efeitos sobre os que compreendem o Espiritismo, comenta com muita propriedade: “(…) o primeiro, e o mais geral, é desenvolver o sentimento religioso (…)”.

 

 

Não é preciso continuar. Tais transcrições desdobram estudos amplos e oportunidades valiosas de raciocínio, entre outras tantas disponíveis no pensamento de Kardec e no ensino dos Espíritos. É verdade que a palavra religião sofreu desgastes, mas isso não invalida, de forma alguma, sua extrema utilidade na vida humana, os benefícios que espalha, as lúcidas orientações que oferece a tanta gente, independente de crença. Como vamos desprezar isso, como desconsiderar aspecto tão genuíno tão marcante na própria índole do Espiritismo? Afinal o próprio Kardec afirmou na Revista Espírita, de dezembro de 1868, que “A caridade é a alma do Espiritismo”. Caridade que também é ciência e filosofia, mas essencialmente é originária da moral  religiosa.

 

Estamos perdendo muito tempo com discussões inúteis, que só desviam de foco a proposta viva de renovação moral trazida pelo Espiritismo. Ninguém deverá desprezar a Ciência, como o próprio Kardec propôs, mas igualmente não deveremos desprezar a Religião e a Filosofia, aspectos inseparáveis do magnífico Pentateuco Espírita.

 

Será muito oportuno, para o tema, relermos a Conclusão de O Livro dos Espíritos, na íntegra e com a devida atenção que o assunto requer.

 

 

Nota: os trechos em negrito são de destaque do autor da matéria.