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O Ensino Espírita e o Estímulo à Leitura

O Ensino Espírita e o Estímulo à Leitura

Para que o homem se aproprie de modo mais completo do patrimônio cultural
constituído coletiva e historicamente necessita se instrumentalizar para
proceder àquela apropriação. O domínio das diversas linguagens culturais é
fundamental ao processo de socialização/ humanização/ iluminação humana,
alargando vistas e descerrando possibilidades de integração/ ação/ crescimento
no contexto em que o homem – ser imortal opera seu processo de aperfeiçoamento
intelecto-moral.

 

Longe de invalidar o valor da oralidade no processo de transmissão/
assimilação do conteúdo doutrinário, o Espiritismo requer, para ser melhor
conhecido e criticado, que o adepto ou estudioso se torne o leitor crítico.
E isto a distingue de qualquer outra proposta de caráter religioso cuja
característica primordial em sua quase totalidade tem sido a não aceitação da
crítica racional.

 

Nesse sentido é que o Movimento Espírita através de suas bases, as casas
espíritas, preocupa-se com o estudo e a divulgação doutrinária em especial
através do livro, fato este registrado pela última pesquisa do IBGE que aponta
como o maior leitor brasileiro, o espírita, em sua maioria quantitativa.

 

Ler não é apenas decodificar mas criar, produzir sentidos a partir da
interação do leitor com o texto. O que faz o leitor no ato de ler? Que
dispositivos e estratégias coloca em ação para atribuir sentido(s) ao texto? Ao
ler de forma dinâmica – e não mecânica – o leitor de forma íntima
e silenciosa, se orienta, imagina, cria, dialoga, recorda, projeta, evoca,
conclui, numa atitude de interação com o texto.

 

Reconhecendo a excelência da afirmativa do Espírito de Verdade:
“Espíritas, amai-vos, eis o primeiro ensinamento. Instruí-vos, eis o segundo”,
nós, os espíritas, temos atuado de modo significativo no estímulo à leitura
e no estudo bem como no acesso à alfabetização e ao letramento daqueles a quem
foi retirado o direito à escola e, conseqüentemente, ao domínio dos processos de
leitura e escrita, essenciais para o acesso à cultura simbólica-escrita onde
também se encontra a mensagem espiritista.

ATIVIDADES ESPÍRITAS DE APOIO AO ESTUDO E À ESCOLARIZAÇÃO

Atividades inúmeras são desenvolvidas pelas Casas Espíritas no estímulo à
leitura e à alfabetização e abaixo citamos algumas delas:

  • Núcleos de EJA (educação de jovens e adultos) visando a alfabetização.
  • Criação de escolas de ensino fundamental e médio em menor número.
  • Cursos profissionalizantes.
  • Funcionamento de bibliotecas infanto-juvenis e para adultos (contendo
    obras espíritas e outras didáticas, paradidáticas…).
  • Funcionamento de Clube de Livros de grande circulação entre espíritas e
    simpatizantes.
  • Realização de Feiras de Livros e Feiras Culturais.

 

Não podemos deixar de registrar que no interior das Instituições Espíritas
desenvolvem-se atividades de estudo e leitura através da evangelização
infanto-juvenil, do estudo sistematizado e do estudo da mediunidade, aqui
citadas como atividades específicas do ensino espírita.

 

A LEITURA NOS TEXTOS BÍBLICOS

Na tradição dos grandes profetas hebreus já encontramos o estímulo à leitura
como podemos identificar nas passagens abaixo:

“Buscai no livro do senhor, e lede…”, afirma o profeta Isaías (34:16)
exortando a leitura como fonte de esclarecimento.

Jeremias, quando proibido de entrar no Templo orienta a Baruque a penetrar na
“Casa do Senhor” e proceder à leitura do rolo que escreveu por
inspiração do Senhor, a fim de elucidar o povo quanto às verdades divinas:

“… lê as palavras do Senhor aos ouvidos do povo, na casa do Senhor, no dia de
jejum; e também as lerás aos ouvidos de todos os de Judá que vêm das suas
cidades”. (Jer. 36:6).

E Habacuque registra curiosa orientação de caráter divino quanto à
necessidade de se registrar as verdades por escrito a fim de poder
serem lidas e de longe – nas palavras: “Então o Senhor me
respondeu e disse: ‘Escreve a visão, e torna-a bem legível sobre tábuas, para
que a possa ler quem passa correndo.” (Hab. 2:2)

 

Jesus, nosso modelo e Mestre, revela-nos a necessidade da leitura atenta e
crítica como nos atestam os relatos que seguem:

“Acaso não lestes o que fez Davi, quando teve fome, ele e seus companheiros?”
(Mt. 12:3), indagou o Mestre lembrando aos interlocutores fariseus que já
havia informações registradas nos textos sagrados no que se referia a
“guardar o Sábado”.

 

Falando no Sermão Profético sobre a Grande Tribulação, Marcos registra com
destaque Jesus intercalando na sua fala: “… (quem lê, entenda) …” (Mc.13:14).

Significativa passagem encontramos em Lucas antes da narrativa da parábola do
Bom Samaritano, quando o Mestre dialoga com um fariseu que O indaga sobre a
conquista sobre a vida eterna e pergunta: “Que está escrito? Como lês
tu?” (Lc. 10:26). É a leitura enquanto busca de sentido…

 

Paulo, o apóstolo dos gentios que inspirado pelo Alto preocupou-se em
utilizar a escrita como registro, como material de reflexão, instiga os
tessalonicences à leitura crítica quando afirma.

“Examinai tudo. Retende o bem”. (1Ts. 5:21).

 

Culminamos esse tópico com a mensagem contida no Apocalipse quando João
afirma:

“Bem-aventurado aquele que lê e bem-aventurados os que ouvem as palavras
desta profecia e guardam as coisas que nela estão escritas; porque o tempo está
próximo”. (Apoc. 1:3).

 

O ESTÍMULO À LEITURA COMO RESPONSABILIDADE DE TODOS OS ORIENTADORES DO
ENSINO ESPÍRITA

Com base nas considerações acima é que consideramos que a casa espírita
deve, pois, investir em tornar seus freqüentadores e trabalhadores em leitores
eficazes que compreendam a utilidade da leitura para que se apropriem das idéias
enriquecedoras e consoladoras da Doutrina Espírita. Precisa, ainda, desenvolver
estratégias diversificadas de leitura para compreender textos espíritas,
atribuindo
“sentidos” à própria vida, pelo
entendimento da
visão espírita de vida, mundo, sociedade…

 

Vale a pena ainda que a sociedade espírita proceda a uma caracterização do
seu público freqüentador das atividades do ensino espírita, identificando os
diversos sujeitos-leitores efetivamente presentes no dia-a-dia das suas
atividades doutrinárias para evitar certos equívocos, principalmente por não
levar em consideração a bagagem de leitura acumulada pelo leitor, sem esquecer
que os indivíduos possuem também uma “leitura” prévia de si mesmos, do outro, da
vida, de Deus., etc. Essa compreensão nos auxiliará bastante no desenvolvimento
das ações educativas nos setores do ensino espírita.

 

É preciso que os núcleos de estudo espírita percebam a existência da produção
e circulação de sentidos no interior das instituições em torno da literatura
espírita (Obras da Codificação, clássicas, ou outras) tornando-se indispensável
reuniões de estudo sérias, coordenadores, evangelizadores ou monitores
estudiosos e hábeis na condução dos grupos para que não se perca de vista o
duplo objetivo da Doutrina Espírita: esclarecer e consolar, sem
que esqueçamos do suporte das bibliotecas, livrarias, apostilas de estudo,
reuniões de planejamento, cursos, reciclagem de recursos humanos, etc. Por fim,
é preciso estimular, sem espírito sectarista mas com
bom senso
a formação de sólida
base doutrinária para que o leitor encontre
aí um “aporte” para desenvolver uma leitura verdadeiramente crítica,
afastando-se do fanatismo, da ingenuidade, da superficialidade.

 

Conscientes do projeto de iluminação que a Doutrina Espírita encerra,
busquemos na leitura e no estudo sério e contínuo o alimento para as nossas
almas necessitadas de luz.

NECESSIDADE DO ESTUDO

A Doutrina Espírita exposta em suas bases nas obras da Codificação
Kardequiana é doutrina que requer o estudo e a reflexão de todo aquele que a
conhecer no seu tríplice aspecto de ciência, filosofia e religião.

Qualquer ciência requisita da parte daquele que pretenda dominar seus
fundamentos um estudo sério, contínuo e aprofundado para que de fato haja a
apropriação/ assimilação do conteúdo que lhe constitui o estatuto
epistemológico.

Se isso ocorre em todas as áreas do conhecimento humano por que seria
diferente com a Doutrina Espírita, doutrina eminentemente educativa que pretende
proporcionar aos homens um novo olhar sobre a Vida, sua origem e destinação, as
leis que a regem tanto no plano físico como no plano moral, sua vinculação com o
chamado mundo dos mortos. “Instruí-vos…”, recomenda o Espírito de Verdade
corroborando o caráter educativo do Espiritismo.

(Jornal Mundo Espírita de Dezembro de 1999)