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Ainda sob este aspecto, ela é um poderoso incentivo, pois tem ensinado os
homens a se humilharem e a sofrerem. Pervertida pelo espírito de domínio, ela
tem sido a causa de muitos crimes , mas, em suas conseqüências funestas , também
deixa transparecer as suas grandes vantagens.

Ora, se a fé cega pôde produzir tais efeitos, o que não fará a fé esclarecida
pela razão, a fé que julga, discerne e compreende? Certos teólogos nos exortam a
desprezar a razão, a renegá-la, a rebatê-la.

Deveremos por isso repudiá-la, mesmo quando ela nos mostra o bem e o belo?
Esses teólogos alegam os erros em que a razão caiu e parecem esquecer
lastimosamente que a razão foi quem descobriu esses erros e nos ajudou a
corrigi-los.

A razão é uma faculdade superior, destinada a esclarecer-nos sobre todas as
coisas e que, como todas as outras faculdades, se desenvolve e se aumenta pelo
exercício. A razão humana é um reflexo da Razão eterna. E, Deus em nos. disse S.
Paulo. Desconhecer-lhe o valor e a utilidade é menosprezar a natureza humana, é
ultrajar a própria Divindade. Querer substituir a razão pela fé é ignorar que
ambas são solidárias e inseparáveis, que se consolidam e se vivificam uma à
outra. A união de ambas abre ao pensamento um campo mais vasto: harmoniza as
nossas faculdades e nos traz a paz interna.

A fé é mãe dos nobres sentimentos e dos grandes feitos. O homem profundamente
firme e convicto é imperturbável diante do perigo, do mesmo modo que nas
tribulações. Superior às lisonjas, às seduções, às ameaças, ao bramir das
paixões, ele ouve uma voz ressoar nas profundezas da sua consciência,
instigando-o à luta, encorajando-o nos momentos perigosos.

Para produzir tais resultados, a fé precisa repousar na base sólida que lhe
oferecem o livre exame e a liberdade de pensamento. Em vez de dogmas e
mistérios, cumpre que ela só reconheça princípios decorrentes da observação
direta, do estudo das leis naturais. Tal é o caráter da fé espírita.

(de “Depois da Morte”)