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Um Jeito De Fazer Oração

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Enéas Canhadas

“O essencial não é orar muito, mas orar bem.” Questão 660-a do Livro dos Espíritos

Aconteceu comigo, podem crer. Vocês hão de convir, que não acontece sempre de uma pessoa vir trabalhar na sua casa como doméstica, e ao perguntar qual era a sua religião, ouvir a resposta: “sou budista”.

Você pode dizer que não se trata de um fato muito corriqueiro, mas pensando bem é perfeitamente normal. Até porque, vivemos num país onde a liberdade de crenças é um fato. Cada um professa a religião com a qual sente maior afinidade e é livre para isso. A religião que uma pessoa pratica, deve ser prática e útil, além de preencher outros significados na vida de uma pessoa. Uma religião tem que permitir um acesso ao plano Divino de maneira muito simples. Chegar a Deus nos momentos mais inusitados. Outras vezes chegar a Deus até mesmo em momentos orgulhosos em que nos sentimos apenas o máximo. E para chegar a Deus, creio eu, tem que ser com naturalidade. É vital que isso aconteça, e não se trata apenas de força de expressão. Se não perdemos a fé e a esperança.

No primeiro dia em que a nossa nova empregada doméstica chegou em casa para trabalhar, precisava enfrentar um primeiro obstáculo, depois de ser aprovada na entrevista feita pela minha esposa. Tratava-se de fazer amizade com o nosso cão labrador para que ela pudesse realizar o seu trabalho em paz. E o mais importante, sem deixar que ele se intrometa em tudo que alguém está fazendo. Ela disse ter medo de cachorros e estava preocupada que ele pulasse ou avançasse nela. Quando alguém diz para você que tem medo de cachorro, trata-se de um problema de foro íntimo. Ou a pessoa não tem medo e enfrenta com serenidade mesmo um cão desconhecido ou então, a pessoa tem medo. Nesse caso, tanto faz que seja um mini poodle ou um pastor alemão. O efeito sobre ela será o mesmo. Pânico e impedimento suficiente para o convívio mínimo necessário. Tentamos encorajá-la explicando que ele era muito amigável e todas aquelas coisas que todo mundo que tem um cão em casa dizem para as outras pessoas. Foi preciso ir até o quintal e trazer-lhe as ferramentas de trabalho como a vassoura e o rodo e mais panos e mais baldes para o início do seu trabalho.

No dia seguinte pensamos que seria necessário repetir tudo. Ela, no entanto, mais do que depressa, foi dizendo: “Não se preocupem porque eu fiz uma oração, e hoje tenho certeza que ele não vai pular em mim e nem eu vou ficar com medo dele”. “Está bem! consentimos”. E não é que isso de fato aconteceu mesmo? Ele ficou tranqüilo para que ela entrasse e saísse pelo quintal sem incomodá-la. Também não brincou pulando para fazer suas estripulias de costume. Ficou dócil e, pela primeira vez que eu tenha visto, ficou olhando enquanto ela jogava água no quintal sem correr para frente do balde como os cães gostam de fazer, sem morder o rodo e a vassoura. Como se diz, parecia gente, entendendo-se com uma pessoa recém conhecida.

Quis saber qual tinha sido a oração. Ela me explicou que a oração era: “ Nam-Myoho-Rengue-Kyo” e que, fazendo aquela oração ele se comportou muito bem sem dar trabalho. Perguntei que oração era esta que ela fez para que o cachorro não pulasse nela e nem causasse medo. Ela me explicou: “a oração não foi para ele não pular em mim, essa oração a gente faz para que, o que é bom para nós, nos aconteça, que tudo nos vá bem do jeito que precisamos e que seja tudo que a gente precisa”. Isso nas explicações da sua simplicidade. Procurei pesquisar um pouco a respeito e consegui, num suplemento de uma publicação budista, que a evocação Não trata da relação perfeita da vida da pessoa com a verdade eterna e acumular energia vital e esforçar-se para aliviar os sofrimentos dos outros. Se praticada essa evocação da verdade, não haverá beco sem saída na vida. Uma vez que nos basearmos na prática da fé com forte convicção, poderemos definitivamente transformar nossas vidas para melhor e ultrapassarmos qualquer impasse.

Percebi então que eu estava muito enganado. Pensei de uma maneira pequena e até mesmo egoísta, supondo uma oração, como se fosse uma fórmula mágica para fazer um desejo acontecer, mais ou menos como aquele desejo que pedimos para o gênio da lâmpada de Aladim, ou como nos ensinam cheios de bom humor e ingenuidade, olhar para uma estrela cadente e fazer um pedido. Acredito que, muitas vezes, já tenha feito a minha oração com a expectativa de pedir algo muito específico para Deus. Apenas abrir as mãos para que Ele me conceda o pedido e preencha a minha esperança. Como os Espíritos nos respondem a questão 663 do Livro dos Espíritos: “Não obstante, os vossos justos pedidos são em geral mais escutados do que julgais. Pensais que Deus não vos ouviu, porque não fez um milagre em vosso favor, quando entretanto vos assiste por meios tão naturais que vos parecem o efeito do acaso ou da força das coisas. Freqüentemente, ou o mais freqüentemente, ele vos suscita o pensamento necessário para sairdes por vós mesmos do embaraço.”

Curiosamente, fatos do nosso dia-a-dia, estão sempre nos lembrando da nossa própria fé e de como a oração nos conecta ao poder Divino. Para mim, foi uma lição.