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O Espírito de Unificação

O Espírito de Unificação

Ao contrário do que por vezes chega a ser insinuado, a Unificação (do
Movimento Espírita e de união das Sociedades e dos próprios espíritas) não visa
a colocação de cabrestos nem em instituições nem em pessoas, como também não se
propôs a delimitar terrenos ou áreas de ação aos que se engajam em seu roldão
unificador, apesar de nem todos os instrumentos estarem tão aperfeiçoados quanto
seria de se esperar. Conforme propõe a própria FEB, o trabalho de unificação
(…) é uma atividade-meio que tem como objetivo fortalecer e facilitar a ação
do Movimento Espírita na sua atividade-fim de promover o estudo a difusão e a
prática da Doutrina” (31). Nesse documento (32) – que julgamos dever ser do
conhecimento de todos os espíritas engajados nos trabalhos unificadores -, estão
destacadas as diretrizes relativas à filosofia do trabalho de Unificação, as
quais resumidamente: a) baseiam-se nos princípios de fraternidade, liberdade e
responsabilidade preconizados pelo Espiritismo; b) se caracterizam por oferecer
sem exigir compensações, ajudar sem criar condicionamentos, expor sem impor
resultados e unir sem tolher iniciativas; c) proporcionam integração e
participação dos Centros Espíritas de forma voluntária, respeitando-se a
autonomia administrativa que dispõem; d) oferecem programas de apoio e
colaboração simplesmente como subsídios; e) estimulam o estudo constante e
aprofundado das obras de Allan Kardec; f) objetivam colocar, com simplicidade e
clareza, a mensagem consoladora e orientadora da Doutrina; e g) preservam aos
que das atividades de Unificação participam, o direito natural de pensar, de
criar e de agir que o Espiritismo preconiza, assentando-se, porém, todo e
qualquer trabalho nas obras da Codificação Kardequiana.

Se as unidades e células do Movimento Espírita que se sentem excluídas das
estruturas do movimento de Unificação patrocinado pela FEB tiverem perfeito
entendimento dessas colocações, perceberão que se exclusão houver será apenas
dentro de um formato administrativo. A proposta de Unificação verdadeira, aquela
que de fato transcende aos limites que os homens insistem em estabelecer, tanto
está firme e vigorosa na Codificação quanto na estrutura apresentada pela FEB.
Ocorre que para administrar o movimento unificador, a FEB criou, conforme já
vimos, o CFN. Mas o CFN é apenas um órgão que, embora de muita relevância, se
propõe a reunir e congregar representantes do Movimento Espírita para bem
estruturá-lo. Estruturá-lo em que bases? A nosso ver, essas são pelo menos duas:
da aplicação e da vivência. Na aplicação, temos por tarefa desenvolver uma boa
orientação e divulgação espírita junto aos dirigentes e às Casas Espíritas, no
intuito de bem prepará-los para exercerem com equilíbrio e denodo suas funções;
na vivência, pela assimilação e prática da postura contida e ensinada na
Codificação Espírita. Nesse espírito, lembramos Jesus quando asseverou: Todo
aquele que faz a vontade de Deus é meu irmão, minha irmã e minha mãe (33), ou
seja, quando estamos orientando bem e divulgando equilibradamente, com base nos
postulados morais e cristãos, integralmente contidos na Codificação, estamos
fazendo Unificação, ainda que porventura não estejamos ligados diretamente ao
CFN ou a qualquer outro órgão.

Nisso tudo, devolvemos a palavra a Kardec em quem, sem pretensão de
mitificá-lo, sempre encontramos a reflexão precisa e a ponderação equilibrada:
Fora, portanto, pueril constituírem bando à parte alguns, por não pensarem todos
do mesmo modo. Pior ainda do que isso seria o se tornarem ciosos uns dos outros
os diferentes grupos ou associações da mesma cidade. (…) se alguma
concorrência haja de entre eles existir, outra não deverá ser senão a de fazer
cada um maior soma de bem. As que pretendam estar exclusivamente com a verdade
terão de o provar, tomando por divisa:

Amor e Caridade, que é a de todo verdadeiro espírita. Quererão prevalecer-se
da superioridade dos Espíritos que as assistem? Provem-nos pela superioridade
dos ensinos que recebam e pela aplicação que façam deles a si mesmas. Esse o
critério infalível para se distinguirem as que estejam no melhor caminho (34)
(grifos originais). (Nota: no capítulo 31 de O Livro dos Médiuns há uma mensagem
do Espírito Fénelon, de número 22, sobre a qual acreditamos tenha o Codificador
erigido o raciocínio ora exposto).

Unificação sem uniformização

Concluindo nossos apontamentos, poderíamos dizer que este item seria
desnecessário. Dizemos seria porque alguns podem não lê-lo, por sua extensão, ou
mesmo lendo-o, mas pela falta de síntese que me é peculiar, não perceberem que
de tudo o que já foi exposto se infere que união não é sinônimo, nem direto nem
indireto, de uniformização.

A uniformização das atitudes humanas, tanto em nosso nível atual quanto,
acreditamos, em nível Superior, é perniciosa, pois tolhe a liberdade não só de
agir, mas inclusive de pensar. Por outro lado, nem tudo que se uniformiza
necessariamente se une; o comportamento da Sociedade nos demonstra isso a
mancheias.

Em Espiritismo, querer que essa sinonímia exista e prevaleça na prática entre
seus adeptos, é negar os fundamentos cristãos e morais em que a própria Doutrina
se assenta. Por tudo isso, é muito justo convir mais uma vez com Kardec quando
assevera que Não será à opinião de um homem que se aliarão os outros, mas à voz
unânime dos Espíritos; não será um homem, como não será qualquer outro, que
fundará a ortodoxia espírita; tampouco será um Espírito que se venha impor a
quem quer que seja; será a universalidade dos Espíritos que se comunicam em toda
a Terra, por ordem de Deus.

Esse o caráter essencial da Doutrina Espírita; essa sua força, a sua
autoridade (35) (grifos originais).

Unir para irmanar; unir esforços para construir. Unificar para fortalecer;
unificar para convergir. Estudar Kardec para aprender; estudar Kardec para
exemplificar; estudar Kardec para progredir.

Viver o Evangelho, amando; viver o Evangelho, compreendendo; viver o
Evangelho para evoluir.

Jesus e Kardec são um todo, são unos e convergem para um só fim. Se neles
estamos concordes e com eles não discordamos, nossa união não tem por que se
demorar. Afinal, Jesus apontou que por muito se amarem é que os seus discípulos
serão reconhecidos enquanto Kardec definia o verdadeiro espírita pela sua
transformação moral e pelos esforços que empreende para domar suas más
inclinações.

Nesse ponto, é justo nos questionarmos: enquanto homens, temos feito tudo que
devemos? Temos feito tudo que podemos? E o que temos feito é o melhor que
podemos e sabemos? – E enquanto Sociedade Espírita, estaremos sendo fraternos,
estendendo as mãos, nos sentando para resolver as divergências? Teremos sabido
destacar os pontos positivos daqueles de quem discordamos? Estaremos sendo
Espíritas?

São muitas as reflexões que surgem. Pena que, na maioria das vezes, não
passem de reflexões. Se nos dispusermos a colocar em prática essas – e muitas
outras reflexões acerca da necessidade de nossa ação pessoal e efetiva -, com
certeza atingiremos um só fim, pois estaremos reunidos num todo já que uno será
nosso pensar e agir. Aí não mais haverá barreiras nem guerras; aí estará, de
fato, estabelecida a verdadeira união. Esse é o Espírito de Unificação que
entendemos.

Referências

  1. Mensagem Unificação, publicada na revista Reformador de outubro
    de 1977, p. 301.
  2. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. In.: Novo Dicionário da
    Língua Portuguesa. 2ª ed., 1986, Nova Fronteira/RIO.
  3. KARDEC, Allan. Os obreiros do Senhor. In.: O Evangelho Segundo o
    Espiritismo. cap.20, item 5, p. 329, 84ª ed., 1982, FEB/RIO.
  4. KARDEC, Allan. Prolegômenos. In.: O Livro dos Espíritos. p. 50,
    ed. 57ª, 1983, FEB/RIO.
  5. KARDEC, Allan. Das reuniões e das Sociedades Espíritas. In.: O
    Livro dos Médiuns. cap. 29, item 350, p. 434, 47ª ed., 1982, FEB/RIO.
  6. KARDEC, Allan. Caráter da Revelação Espírita. In.: A Gênese.
    cap. 1, 1ª nota de rodapé do item 53, p. 42, 24ª ed., 1982, FEB/RIO.
  7. KARDEC, Allan. Amplitude de ação da comissão central. In.: Obras
    Póstumas. cap. Constituição do Espiritismo, item 6, pp. 328 e 329, 12ª ed.,
    1964, FEB/RIO.
  8. KARDEC, Allan. Os trabalhadores da última hora. In.: O Evangelho
    Segundo o Espiritismo. cap. 20, item 3, p. 326, 84ª ed., 1982, FEB/RIO.
  9. RIBEIRO, Guillon. Introdução. In.: Trabalhos do Grupo Ismael. p.
    33, 1ª ed., 1941, FEB/RIO.
  10. O documento foi republicado na revista Reformador de janeiro de
    1979, p. 46.
  11. Publicado na revista Reformador de abril de 1950, pp. 73 e 74.
  12. Unificação, publicada em Reformador de dezembro de 1975, p.
    275.
  13. Primado do Amor, publicada em Reformador de dezembro de 1992,
    p. 361.
  14. Unificação, publicada em Reformador de outubro de 1977, p.301.
  15. Em A Gênese (cap. 1, item 13), Kardec afirma que … a doutrina
    não foi ditada completa, nem imposta à crença cega (…). Numa palavra, o que
    caracteriza a revelação espírita é o ser divina a sua origem e da iniciativa
    dos Espíritos, sendo a sua elaboração fruto do trabalho do homem – e completa
    em Obras Póstumas (cap. Constituição do Espiritismo, item 2): … É inerente
    ao caráter essencialmente progressivo da Doutrina. (…) Apoiada tão só nas
    leis da Natureza, não pode variar mais do que estas leis; mas, se uma nova lei
    for descoberta, tem ela que se por de acordo com essa lei. Não lhe cabe fechar
    a porta a nenhum progresso, sob pena de se suicidar (grifos originais).
  16. Grande Conferência Espírita realizado no Rio de Janeiro item
    2º, In., Reformador de novembro de 1949, p. 243.
  17. Grande Conferência Espírita realizado no Rio de Janeiro item
    12º, In., Reformador de novembro de 1949, p. 244.
  18. Conforme súmula da reunião transcrita em Reformador de novembro
    de 1981, p. 337.
  19. Conforme súmula da reunião transcrita em Reformador de novembro
    de 1981, p. 338.
  20. Conforme súmula da reunião transcrita em Reformador de novembro
    de 1981, p. 396
  21. A parte da súmula da reunião de que trata este assunto está
    transcrita em Reformador, de janeiro de 1984, p.22 e de junho de 1984, pp.186
    a 188.
  22. É Kardec (no item O Chefe do Espiritismo, In.: Obras Póstumas.
    cap. Constituição do Espiritismo, item 3, p. 317. 12ª ed., 1964, FEB/RIO) quem
    pondera: Uma constituição, por muito boa que seja, não poderia ser perpétua. O
    que é bom para certa época, pode tornar-se deficiente em época posterior. As
    necessidades variam com as épocas e com o desenvolvimento das idéias. Se não
    se quiser que com o tempo ela caia em desuso, ou que venha a ser postergada
    pelas idéias progressistas, será necessário caminhe com essas idéias. (…)
    Fora grave erro acorrentar o futuro por meio de uma regra que se declarasse
    inflexível.
  23. Para maiores detalhes, recomendamos a leitura dos artigos:
    FEESPÍRITA/91 – Congresso Internacional de Espiritismo e Unificação do
    Movimento Espírita em Nível Internacional, publicados em Reformador de janeiro
    de 1992, pp. 26 e 27, e pp. 34 e 35.
  24. O registro dos apontamentos da reunião do CEI se encontra em
    Reformador de abril de 1993, pp. 33 a 35.
  25. In.: O Trabalho de Unificação do Movimento Espírita no Brasil,
    In.: Reformador de março de 1991, p. 80.
  26. In.: O Trabalho de Unificação do Movimento Espírita no Brasil,
    In.: Reformador de março de 1991, p. 80.
  27. KARDEC, Allan. O chefe do Espiritismo. In.: Obras Póstumas.
    cap. Constituição do Espiritismo, item 3, p. 317, 12ª ed., 1964, FEB/RIO.
  28. KARDEC, Allan. O chefe do Espiritismo. In.: Obras Póstumas.
    cap. Constituição do Espiritismo, item 3, p. 319, 12ª ed., 1964, FEB/RIO.
  29. KARDEC, Allan. Das reuniões e das Sociedades Espíritas. In.: O
    Livro dos Médiuns. cap. 29, item 348, p. 423, 47ª ed., 1982, FEB/RIO.
  30. O documento foi publicado na revista Reformador de março de
    1991, tendo sido recentemente transcrito no documento básico do VIII Congresso
    Espírita da Bahia (12 a 15/novembro/1993).
  31. In.: O Trabalho de Unificação do Movimento Espírita no Brasil,
    In.: Reformador de março de 1991, p. 80.
  32. In.: O Trabalho de Unificação do Movimento Espírita no Brasil,
    In.: Reformador de março de 1991, p. 80 a 83.