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O perdão

Todos nós, cristãos, sabemos que devemos perdoar sempre que formos magoados,
feridos, ofendidos, sob quaisquer circunstâncias.

Por quê então, é tão difícil perdoar?

É difícil sim, porque somos seres ainda muito imperfeitos, com muito orgulho
e egoísmo, que nos dificultam o relacionamento entre as pessoas.

Temos grande dificuldade em colocarmo-nos no lugar do outro, procurando
perceber os sentimentos e emoções que o levam à ofensa. Muitas pessoas nem se
conscientizaram da importância e da necessidade dessa ação para o conhecimento
de si mesmas e dos outros.

Temos dificuldades imensas em comunicarmo-nos, uns com os outros, de forma
clara, expressando objetivamente nossos pensamentos e idéias. Quantas vezes
ofendemos e somos ofendidos pela má expressão das nossas frases, por não nos
fazermos entendidos.

Não sabemos também e não nos esforçamos para interpretar, corretamente, o que
o outro tenta nos dizer.

Como trazemos ainda, o mal dentro de nós, percebemos nos outros, com muito
mais facilidade, os defeitos, o que nos impede de compreendê-los. Habituamo-nos
a julgá-los, preconceituosamente, com exigências que não temos para conosco.

Vivemos durante inúmeras reencarnações considerando o perdão, a indulgência,
a bondade como expressões de fraqueza, de covardia. Entendíamos um dever
vingarmo-nos sempre que nos julgássemos ofendidos.

Hoje, que a luz dos ensinos de Jesus iluminaram nossos corações e nossas
mentes; hoje que a lógica da doutrina espírita nos mostra os elementos
justificativos da necessidade do perdão, queremos ser bons, perdoar,
incondicionalmente, como exemplificou Jesus. Todavia, sentimos dificuldade de
libertarmo-nos dos hábitos “de defesa da honra e da dignidade”, do “ter vergonha
na cara”, “ter sangue nas veias”, do “não levar desaforo pra casa”, porque
“difícil não é aprender coisas novas, difícil é desaprender hábitos antigos”.

Melindramo-nos, tão facilmente, por tão pequenas coisas, com as pessoas com
as quais convivemos e até com as que amamos!… Por quê?

Penso por estarmos, no presente, tentando desenvolver em nós as virtudes
exemplificadas por Jesus, esforçando-nos para vivenciar o bem, mas, ainda, muito
distantes dessa conquista, irritamo-nos, facilmente, com aqueles que, voluntária
ou involuntariamente, nos apontam nossos erros e enganos.

Gostaríamos que todos nos julgassem pelas nossas boas intenções e não pelas
nossas atitudes e ações equivocadas. Porém, nós também, em relação aos outros,
não nos esforçamos em compreender as suas dificuldades, os seus sentimentos e,
queremos deles atitudes e ações que consideramos ideais, mas que ainda estão
distantes de ser desenvolvidas por nós, em nós.

Por quê devemos perdoar?

Por muitas razões. Devemos perdoar para facilitar a convivência, o
relacionamento entre nós e os outros. Todos desejamos ser felizes, viver e
trabalhar em ambientes agradáveis, harmoniosos que proporcionem prazer,
satisfação, paz e o perdão recíproco, fraterno, de quem compreende que todos
cometemos erros e, portanto, precisamos de indulgência, este perdão é o elemento
capaz de transformar qualquer ambiente conturbado em ambiente prazeroso.

Devemos perdoar sempre que acontecerem grandes ou pequenas ofensas, porque o
perdão desfaz as vibrações negativas advindas do ofensor e de que se sente
ofendido, proporcionando a limpeza psíquica, levando à confiança recíproca que,
por sua vez, liberta-nos do medo de mostramo-nos tal qual somos, com nossos
defeitos e qualidades, de “soltarmo-nos” das amarras da insegurança, da
amargura, do preconceito… E essa confiança recíproca, provocada pelo perdão,
estimula-nos para a confiança no homem em geral, em nós próprios, em Deus e nas
suas leis, abrindo-nos para o bem, para a alegria!

Vivemos em um mundo de ondas e vibrações que se cruzam, se atraem, se repelem
conforme suas semelhanças e diferenças. Todo sentimento negativo, da tristeza ao
ódio, pelas vibrações tensas e opressas que emitem, atraem outras semelhantes,
de encarnados e desencarnados.

Em nosso próprio benefício, pois, precisamos cultivar sentimentos nobres
para, ao irradiá-los, atrairmos as irradiações boas. A mágoa, o rancor, a raiva,
o desejo de vingança, que nos impedem de perdoar, nos priva também de atrair
energias boas e agradáveis.

Quando alguém nos magoa, nos agride, nos fere, o perdão é a nossa proteção
contra o assédio das energias negativas.

Se estivermos atentos ao que sentimos quando não aceitamos a agressão alheia,
procurando desculpar, na compreensão do momento infeliz do outro, comparando com
o que sentimos quando deixamos penetrar em nós essas energias negativas que se
casam com as nossas, teremos a comprovação dos efeitos sublimes e balsamizantes
do perdão.

Devemos perdoar sempre porque o perdão, mesmo quando unilateral, desfaz o
sentimento de animosidade. E no decorrer do tempo, na convivência nesta
existência ou em futuras, através dos laços que se entrelaçam, o perdão terá
sido a chave que abriu a porta do coração à amizade, ao relacionamento afetuoso,
transformando adversários em amigos.

Quem necessita de perdão?

Todos nós, Espíritos eternos, imperfeitos ainda como demonstram a
complexidade de sentimentos e emoções contraditórios que se agitam dentro de
nós, levando-nos a erros e enganos.

Precisamos conseguir a consciência da necessidade do amparo mútuo e o perdão
no dia-a-dia oferece ao que perdoa e ao perdoado a oportunidade de refletir
sobre quem é, porque está aqui e para onde vai. O perdão no dia-a-dia leva-nos à
humildade de reconhecermo-nos todos iguais, na origem e na destinação, nas
possibilidades do desenvolvimento do nosso potencial, com as mesmas dificuldades
de aprendizado.

Por quê então, sermos duros, exigentes, rigorosos com os outros e indulgentes
conosco?

Como aprender a perdoar?

Perdoar é desculpar, não valorizando a ofensa, minimizando-a; é esquecer o
mal recebido; é não sentir no ofensor um inimigo, mas uma pessoa com
dificuldades pessoais.

Mas acima de tudo, em um grau elevado de evolução, perdoar é não sentir-se
ofendido, magoado, ferido pelo outro. Esse ideal a ser perseguido é não
necessitar de perdoar porque vê no ofensor um irmão necessitado de ajuda, de
compreensão, de amor. Nessa vivência, o exemplo maior é o de Jesus:
“Perdoai-lhes Pai, porque não sabem o que fazem”.

Até conseguirmos alcançar esse ideal é preciso ter essa meta como ponto de
chegada, como fim a ser atingido. Um dia, não importa o tempo que levar – aliás,
tempo é o que não nos falta: temos a eternidade – conseguimos. Como toda chegada
tem seu ponto de partida, precisamos iniciar já, agora, o fortalecimento de
nossa vontade no esforço de perdoar seja quem for, em qualquer situação ou
circunstância.

Estimulado pela vontade de desenvolver, em nós, a virtude do perdão, devemos
nos propor, perseverantemente, o exercício do perdão, sempre que surgir a
oportunidade, sem alarde, no íntimo de nós próprios, da maneira que pudermos, em
situação simples ou complexa, porque somente no exercício constante no
dia-a-dia, a própria ação de perdoar se constitui no reforço da vontade de
perdoar “não sete vezes, mas setenta vezes sete vezes”, conforme ensinou Jesus.

É uma luta interna, invisível aos olhos alheios, por vezes muito difícil e
tanto mais difícil se torna para a pessoa dominada pelo orgulho e egoísmo.

Aquele porém, que compreende e aceita que somos todos iguais na origem e no
destino, como dissemos acima, que todos somos perfectíveis, que a vida não se
limita a esta existência, tem os princípios básicos que justificam a necessidade
e a capacidade de cada um de nós em perdoar sempre.

Busquemos perdoarmo-nos sempre para que a vida social, “a pedra de toque das
boas ou más qualidades”, como escreveu Allan Kardec no livro “Céu e Inferno”,
cap. III item 8, possa propiciar, em nós, o desenvolvimento das qualidades
morais que Jesus nos ensinou e exemplificou.

(Jornal Verdade e Luz Nº 177 de Outubro de 2000)