Sobre o que vou escrever? Vem a vontade, falta a ideia. Sem dúvida, ocorrência comum a todo escritor, em fases de maré rasa, em que a inspiração parece se esvair por um ralo sob a pressão das preocupações cotidianas. Não obstante, teimo. Escrever, publicar livros, textos sobre temas espirituais, edificantes, na medida do possível útil e agradáveis a todos, é um dos grandes referenciais de vida do qual não abro mão. Dentre todos os detalhes do caminho, está entre os que mais alegrias me trazem. Então, sobre o que escrevo hoje?
Só resta o palpite, o impulso intuitivo, determinado, talvez, por imagens repetidas que deparei nas últimas horas frequentando principalmente o Facebook em busca de entretenimento e interatividade com amigos.
Vi pelo menos umas cinco fotos deslumbrantes de paisagens campestres noturnas, a céu aberto, em locais do mundo praticamente isentos do obscurecimento dos efeitos da luz elétrica sobre a visão fantástica dos céus esfarinhados de estrelas! E, para mim, nada talvez nos devolva melhor do que esses cenários mágicos a retomada da noção do que seja Deus!
Lembro-me de uma vez em que estive na Ilha de Fernando de Noronha, e experimentei in loco esta vivência inesquecível. Em turismo de grupo, passeando pelas paisagens encantadas daquele lugar paradisíaco em plena noite de verão, com os céus assoberbados das milhares de luzes da nossa Via Láctea, achei de me deitar sobre uma daquelas pedras imensas próximas do mar, na região onde caminhávamos. Demorei-me em silêncio por breves minutos naquela atitude meditativa, e recordo de ter de repente comentado do nada, como se meu espírito falasse, ali, sem a interferência do corpo, das cordas vocais: “- Não sei porque acho que a morte é bem isso!…” Ao que alguém do grupo que me ouvia das proximidades respondeu, também com os olhos presos na vastidão impressionante, silente, daqueles milhões de astros faiscantes nas extensões incalculáveis dos céus límpidos: – “Então deve ser uma coisa boa! A morte!…”
Hoje, acredito que tenha sido a sensação de Unidade absoluta do meu íntimo, do meu espírito dissociado do veículo corporal naquele estado de transe, com a vastidão da Vida manifesta livre, perfeita, natural ao meu redor, que me compeliu a largar aquelas palavras soltas no ar.
Sim. Hoje guardo a convicção. De que é justo nesses momentos raros de comunhão plena, desimpedida, amorosa com a Criação divina, que compreendemos a plena essência de toda a manifestação vital ao redor de nós. Aquele céu infinito, silente e solene, unificado com a verdade mais genuína de nossos espíritos! No agora eterno, cá estamos também infinitos, permanentes, onipresentes! Em nós, como nos milhares de mundos brilhando em movimento na sinfonia soberba dos espaços, como também nas flores felizes com os ares do inverno bem ali, na minha varanda; como no gato manhoso do vizinho, e nos seres humanos que, aos milhões, nos cercam espalhados na Terra – em tudo está Deus!
E talvez seja essa a segunda razão do que opto por escrever agora. Pela associação disso com a segunda cena assistida ontem em vídeo que anda passeando pela web, sobre o sofrimento hediondo vivido pelas crianças na África.
Vi dois meninos de sete anos, esquálidos, abandonados, arrastando-se pela terra esbatida porque não tinham mais forças para levantar. Uma equipe espanhola em visita humanitária fazia as imagens. Uma única irmã de oito anos ainda saudável era tudo que tinham aquelas duas crianças agonizantes, recolhendo migalhas do chão sujo para saciar a fome. E a repórter da equipe chora convulsivamente, assistindo às cenas inacreditáveis.
A pequena heroína de oito anos corre de um lado para outro. Traz de longe uma bacia cheia com água, e, com movimentos instintivos, pega os irmãozinhos, um a um, para o banho. Lava-os com perícia materna, sem dar muita atenção aos que de certa distância comovem-se, quase em choque, com a cena. Os meninos não têm o tamanho normal para crianças de sete anos, ainda assim, inertes, sem forças para ficar de pé, pesam – mas a menina, diligente, os carrega de um lado para outro como pode. Findo o banho, coloca-os sobre um acolchoado tosco na terra esbatida. Seca-os, debaixo do choro sofrido de um deles. Depois, entrega-lhes biscoitos que a equipe de filmagem lhe entrega para comer. Ela oferece primeiro aos dois irmãozinhos, que ficam ali, roendo os biscoitos deitados, nas mãozinhas enfraquecidas. Só depois ela se permite comer.
Tudo instintivo! Deus em pessoa agindo naquela menina, e ainda ali, naquela situação crítica, conduzindo-a a auxiliar primeiro os mais fracos e frágeis enquanto lhe sobram as forças. Uma criança apenas – de oito anos!
Deus! A Vida manifesta, e presente em todos – inclusive nos repórteres perplexos, todos notadamente entravados em palavras e atitudes, talvez que envergonhados de sua robustez bem nutrida de origens em países capitalistas, talvez perguntando-se, como eu mesma fiz, assistindo em horrível estado de perplexidade ao vídeo, como que chegamos a este ponto!
Como permitimos que crianças de quaisquer partes do mundo, desta jóia flutuante nos espaços infindos acolhendo a mesma Vida manifesta pelo Criador em todo o infinito, fossem, assim, relegadas a um tal martírio? Como se valessem, as suas vidas, menos do que as de pessoas viventes de outras regiões deste planeta pródigo? Como se os recursos deste mundo rico, pleno, pudessem assim ser monopolizados apenas em favor de alguns, por razões inteiramente arbitrárias, em prejuízo de tantos outros?!
Amigos, precisamos do que o Mestre Jesus outrora definiu como “olhos de ver” – sem os quais, nem olhando, conseguimos enxergar! Sem os quais, segundo Suas próprias palavras, nos convertemos comodamente em “cegos que conduzem outros cegos, sepulcros caiados, bem vistosos por fora, mas cheios de podridão por dentro”!
Precisamos recobrar a capacidade ancestral de simplicidade na percepção das coisas! E o contato direto, desobstruído com as expressões divinas que diariamente nos aparecem em toda a sua majestade, é vital para que, sempre a tempo, voltemos a valorizar a Vida em toda a extensão da sua manifestação pelo Criador generoso, presente dentro e fora de nós!
Porque é óbvio demais, e está bem diante de nós, a cada minuto! Porque é, esta, a grande, definitiva Verdade que cabe a todos enfim recordar para agir em favor da única felicidade real possível – fora das sombras enganosas dos interesses frios da materialidade: Deus, o Criador, é presente em tudo que nos rodeia! Em nós. Fora de nós. No vizinho, no parceiro de trabalho. No israelita e no islâmico, no africano e no americano, no muçulmano, no indiano, no francês e no chinês! Não importa!
Onde há Vida, está presente Deus – a Origem maior de tudo!
E somente com base nesta certeza conseguiremos, enfim, vencer nossos piores enganos e medos para agir; para acabar em definitivo com as causas de toda a miséria e sofrimento que paralisam a raça humana e então preservar, cuidar, santificar em cada minuto tudo o que o Criador idealiza como a manifestação do sonho mais perfeito para cada coisa presente no Universo, e para cada ser em trajetória neste nosso planeta ainda tão perdido em sombras!
Ps.: Os conceitos aqui emitidos não expressam necessariamente a filosofia FEAL, sendo de exclusiva responsabilidade de seus autores.