Oposição declarada
Ideias novas sempre encontram resistência
Reflitamos sobre o trecho a seguir, que Allan Kardec escreveu na Revista Espírita,
de abril de 1868 (edição EDICEL, na tradução de Júlio Abreu Filho): “(…) Todas
as grandes idéias, todas as idéias renovadoras, tanto na ordem científica quanto
na ordem moral, receberam o batismo da perseguição, e isto devia ser, porque elas
ferem os interesses dos que viviam velhas idéias, preconceitos e abusos. Mas, desde
que essas idéias constituam verdades, não viram que a perseguição não lhe deteve
o curso? Não está aí a história de todos os tempos para provar que, ao contrário,
elas cresceram, consolidaram-se, propagadas mesmo pelo efeito da perseguição? (…)
Não se perseguiram senão as idéias nas quais se via o futuro; as que julgaram sem
conseqüência deixaram que morressem de morte natural (…).”
O trecho comenta sobre agressões veementes sofridas por um correspondente. Com
o título Intolerância e Perseguição ao Espiritismo, o Codificador relata
a situação de violência de um sacerdote contra um adepto, pois “(…) aquele missionário
que espumava de raiva pregando contra o Espiritismo, e se agitava com tanto furor
que um instante temeram que caísse do púlpito. (…)”.
Nota o leitor que na transcrição constante do primeiro parágrafo há a expressão
ferem os interesses dos que viviam velhas idéias, preconceitos e abusos.
Ora, a Boa Nova de Jesus e a própria Revelação Espírita feriram velhos interesses.
Entre outras definições, a palavra interesse, segundo o Michaelis
(edição Melhoramentos), significa conveniência; sentimento egoísta ou de cobiça;
cuidado, empenho em favor de alguém ou alguma coisa.
Em trecho de O Evangelho Segundo o Espiritismo, no capítulo XXIII (que
Kardec nominou Estranha Moral), item 14, do subtítulo Não vim trazer a
paz, mas, a divisão (1), encontramos: “(…) Ora, é tenaz o interesse;
jamais cede à evidência; irrita-se tanto mais quanto mais peremptórios e demonstrativos
de seu erro são os argumentos que se lhe opõem. Sabe ele muito bem que
está errado, mas isso não o abala, porquanto a verdadeira fé não lhe está na alma.
O que mais teme é a luz, que dá vista aos cegos. É-lhe proveitoso o erro;
ele se lhe agarra e o defende. (…)”. Os destaques são de nossa autoria.
E, no item 12 do mesmo capítulo, Kardec argumenta que “Toda ideia nova forçosamente
encontra oposição e nenhuma há que se implante sem lutas. Ora, nesses casos, a resistência
é sempre proporcional à importância dos resultados previstos, porque, quanto maior
ela é, mais numerosos são os interesses que fere. (…) Assim, pois, a medida
da importância e dos resultados de uma idéia nova se encontra na emoção que o seu
aparecimento causa, na violência da oposição que provoca, bem como no grau e na
persistência da ira de seus adversários (…).”
Por esses pequenos trechos fica fácil entender os obstáculos que encontra a propagação
do Espiritismo. É muito natural em virtude das idéias que apresenta a Doutrina Espírita.
Somente o amadurecimento moral e intelectual será capaz de remover citados obstáculos,
normalmente acentuadamente marcados pelo preconceito.
Nada, pois, de espanto ou perplexidade. O melhor caminho é mesmo continuar trabalhando,
com persistência e dedicação.
(1) Edição no 118 – de agosto de 2001 –, da Federação Espírita
Brasileira, na tradução de Guillon Ribeiro, página 340
Matéria publicada originariamente no jornal O CLARIM, de maio de 2004.