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Praga e Plaga

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Enéas Canhadas

Se você quiser jogar uma praga em alguém, estará praticando um ato moral evidentemente, porque carregado de onipotência e de julgamento. Tal ato, contraria o princípio moral de não julgar ninguém. Você estará também amaldiçoando e desejando que coisas nocivas e nefastas aconteçam a alguém, daí ferindo também o princípio de justiça que é amar o próximo como a si mesmo.

Se você quiser jogar uma plaga em alguém, você estará querendo dizer que vai jogar um terreno ou uma extensão de terra sobre alguém e isso será impossível. Ninguém vai entender a sua intenção, será incompreedido e julgado louco porque a expressão dessa ação não fará sentido. Mas, se você se refere à uma antiga designação de certo tom musical ou quer dizer que algo está oblíquo ou não está em linha reta, ou não está “certo”, então o uso da palavra “plaga” será um termo correto embora uma expressão de pouco uso.

O problema em usar a palavra “plaga” está no fato de que ela contém um julgamento ao classificar uma postura, uma ação ou um comportamento como incorreto. Uma rua pode ser oblíqua à uma via principal e uma ladeira pode causar dificuldades aos transeuntes por ser oblíqua demais. Mas se você se refere à atitude de alguém como incorreta, no sentido que se aplica a atos de incorretude, no sentido moral de que não devem ser praticados para não ser prejudicial a alguém então existe, nesse caso, um ato moral ao classificar a atitude do outro ou dos outros como incorreta, errada, perniciosa ou mais ainda se considerar que tais atitudes, além de não serem retas, constituem pragas. Nesse caso você está igualando atitudes humanas com epidemia, doença ou mesmo uma coisa danosa ao mundo, natureza e também aos demais seres humanos. Lançar uma praga é lançar uma maldição e classificar uma ação humana de praga é o mesmo que dizer que tal ação causa malefícios, prejudica a paz e harmonia dos seres humanos.

As imprecações existem na boca dos seres humanos na medida em que existe a inveja, a maledicência, o desejo de prejudicar o outro e principalmente de julgar o nosso semelhante. O ser humano é muito mobilizado pelos sentimentos de ódio, raiva, agressividade, desamor e o ato de julgar implica em comparar objetos, características, pessoas, atitudes e comportamentos. No caso das atitudes humanas, ao compararmos, estamos classificando os atos de moralmente elevados e admiráveis como também atos condenáveis e passíveis de punição. Se dizemos “eu não faria o que fulano fez” estou dizendo que eu faria melhor, e em muitos casos que eu agiria de maneira mais certa que ele. As imprecações existem para que possamos de maneira bastante radical, nos fazer de juiz que condena e lança um voto de destruição para o outro, podendo resultar até mesmo em morte ou simplesmente extermínio do nosso próximo.

Quando a história nos relata a respeito de ditadores que mandaram matar centenas e também centenas de milhares de pessoas, estavam julgando e condenando tais pessoas. Como sabemos, pelos motivos muitas vezes mais pessoais, caprichosos, preconceituosos e mais tiranos que possamos imaginar.

No verbete “prag” o antepositivo do latim “plaga” significa golpe e também chaga e ferida. O Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa informa que pode muito bem existir ligação com o verbo “plango” que é de uso antigo entre os romanos acabando por gerar derivados como “plagósus” a alguém que “gosta de golpear” ou seja “cheio de golpes”. Também vem daí “plágio” que significa “dar pancadas, espancar, desancar, ferir”.

Como a nossa língua portuguesa permite muita flexibilidade no uso das suas palavras, daí favorecendo a invenção de termos que, com facilidade, acabam sendo incorporados como uso e costume e por fim acabando por transformar-se em verbetes, talvez ainda venha um dia, ou mesmo a partir de agora, existir o verbo “plagar”. Esse verbo bem poderia dar nome e significar a classificação de um comportamento ou atitude como “plaga” isto é, algo que não está reto e por tanto, oblíquo ao que “deveria” ser. O problema será definir quem determinou o que “deveria” ser reto. Estaríamos, de novo, imersos numa questão de foro íntimo para cada ser inteligente que possa usar o seu livre arbítrio.

Segundo o Rabino Nilton Bonder no seu livro “Código Penal Celeste” Adão e Eva foram expulsos do paraíso não por causa da desobediência, uma vez esta fazia parte do livre arbítrio e se o livro arbítrio decorre da inteligência e da liberdade não poderia ser proibido. A transgressão do casal habitante do paraíso está no fato de tentar “igualar-se ao Criador” e aí o ser humano, finito, mortal e vulnerável mexeu numa caixa de abelhas para o que ele não tinha total competência. Quando queremos ser onipotentes ou atuar como Deus, passamos por cima da realidade mais básica e primária do ser humano que é também sua condição, a de ser limitado. Não vai adiantar perguntar sobre isso para o Bispo, ele não poderá ajudar. Estaremos diante da mesma questão: não será possível receber a autorização para ser igual a Deus de um outro ser humano, pois onipotência e poder todas as coisas só são possíveis a Deus. Não vai adiantar você insistir e desejar fazer-se detentor da verdade e atribuir-se o poder de julgar, nem que seja amigo do Papa.

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