As Quatro Nobres Verdades – Parte 8
“(…) convém esclarecer que a verdade do sofrimento, enunciada pelo
Buda em seu primeiro sermão, pertence à verdade relativa e não descreve a
natureza última das coisas, pois aquele que atinge a realização espiritual
goza de uma felicidade inalterável e percebe a pureza infinita dos fenômenos:
nele, todas as causas de sofrimento desapareceram. Então, por que destacar
tanto o sofrimento ? Para tomar consciência, em um primeiro momento, das
imperfeições do mundo condicionado. Neste mundo da ignorância, os sofrimentos
se acrescentam uns aos outros: um de nossos pais morre, o outro o segue
algumas semanas depois. As alegrias efêmeras se transformam em tormentos:
parte-se para um alegre piquenique em família e nosso filho é picado por uma
cobra. A reflexão sobre a dor, portanto, deve nos incitar a tomar o caminho do
conhecimento. (…) ” Matthieu Ricard, Ação sobre o mundo e ação sobre sí
mesmo, O Monge e o Filósofo, Ed. Mandarim
A ilusão de um “eu” individual leva ao egoísmo e a considerar as coisas deste
mundo como permanentes. Este apego leva ao sofrimento. O homem deve libertar-se
dessa ignorância, compreender que tudo é impermanente (transitório) e aí terá
atingido a felicidade.
O ser que age para se libertar da ignorância, seguindo as regras do caminho
óctuplo, vive longe dos extremos – nem o ascetismo exagerado, muito menos o
apego desmesurado aos bens materiais – daí a expressão “caminho do meio”. Pelo
ideal do Bodhisattva, há a valorização do esforço para melhorar o mundo e trazer
a felicidade para todos. O Budista deve sempre agir para diminuir o sofrimento,
onde e da maneira que lhe for possível.
– Espiritismo
“172 – Todas as nossas diferentes existências realizam-se na Terra ?
Não, vivemo-las nos diferentes mundos: as da Terra não são as primeiras nem as
últimas, porém das mais materializadas e distantes da perfeição.173 – A cada nova existência corporal a alma passa de um mundo a outro
ou lhe é possível viver muitas vidas no mesmo planeta ? Pode reviver várias
vezes no mesmo planeta, se não estiver suficientemente avançada para passar a
um mundo superior.” O Livro dos Espíritos, Allan Kardec.
O mundo material é transitório, temos uma percepção limitada da
realidade devido as nossas limitações de entendimento e de percepção. Como o
mundo físico é uma escola na jornada evolutiva do ser, e as vicissitudes da vida
material desafios para o espírito, o verdadeiro espírita deve sempre procurar
melhorar a sí mesmo e, conseqüentemente, melhorar também seu modo de agir no
mundo. Assim, pela lei de caridade e pela prática da sabedoria, o espírita deve
sempre procurar melhorar a situação de seu próximo e da sociedade em que vive. O
Espiritismo não aprova os extremos, nem o ascetismo exagerado nem o apego aos
bens matérias. Somos depositários temporários dos bens deste mundo e devemos
empregá-los do melhor modo possível para o bem de todos.
– Análise
A primeira vista, em um estudo superficial, o Budismo parece ter uma visão
pessimista deste mundo, por sua aguda percepção do sofrimento e de suas causas.
Isso porém não corresponde a realidade, pois faz parte das bases doutrinarias do
Budismo a conscientização de que é possível superar-se o sofrimento e agir de
tal modo que se possa ter um razoável grau de felicidade já nesta vida. Desta
maneira, a concepção do mundo – e conseqüentemente da ação do homem no mundo –
valoriza o esforço no sentido do bem e do progresso.
O Espiritismo por outro lado, valoriza imensamente as oportunidades de
aprendizado oferecidas por este mundo material, enfatizando que o correto agir,
conforme as leis morais, resulta não só no progresso individual como no
coletivo. Para o Espiritismo ainda estamos a caminho da verdadeira civilização,
onde as leis de amor e de justiça serão aplicadas em sua verdadeira extensão.
Para que esta civilização seja atingida, precisamos nós todos nos empenharmos no
esforço de reforma interior e conseqüente mudança de comportamento.
Uma vez que se compreenda que somos espíritos, temporariamente reencarnados
em um corpo material com finalidades educativas e que tudo neste mundo é
transitório, se tem uma nova visão do mundo e pode se atingir a felicidade
relativa que nosso nível de progresso permite. A verdadeira felicidade só é
atingida com o progresso do espírito e sua depuração de todas suas imperfeições.
O fim do egoísmo, almejado tanto pelo Budismo, como pelo Espiritismo,
transformam o individuo e o mundo ao seu redor. Não há o apelo para o abandono
da ação no mundo, mas o redirecionamento desta ação. O melhor exemplo dentro do
Budismo é o próprio Dalai Lama, em seu trabalho incansável – e pacifico,
conforme as diretrizes de Buda – em prol de seu povo.
(Publicado no Boletim GEAE Número 436 de 30 de abril de 2002)