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Quem não tem medo de nada levante a mão!

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Enéas Canhadas

Esta é uma pergunta que já fiz, muitas vezes, para as pessoas que estavam presentes às palestras que proferi sobre os medos que sentimos. Alguns poucos se arriscam a dizer que não têm medo de nada. Em geral as pessoas admitem que possuem lá os seus medos.

Lembro-me de uma senhora que levantou a mão e disse com muita convicção que não tinha medo de nada. Depois, na hora do intervalo para o cafezinho veio me procurar e comentou: “Sabe, como disse, eu não tenho medo de nada, a única coisa que me deixa um pouco preocupada é a morte!” No entanto já me deparei com algumas pessoas, um tanto audaciosas, que afirmaram não ter medo de nada.  A respeito dessa ousadia, vamos tratar no item sobre as atitudes que demonstramos ao sentir medos.

Quero convidar você, meu amigo leitor da FEAL, para estudar este assunto em alguns capítulos. Trata-se de conteúdo extenso e difícil para ser abordado de forma breve. Não podemos ser superficiais e não devemos deixar de fora os tópicos mais importantes.

Voltando à senhora que se dizia “apenas” preocupada com a morte, podemos dizer que nem sempre temos uma consciência muito precisa dos nossos medos. Outras vezes, não nos damos conta de que eles existem dentro de nós.

Em geral não sabemos o quanto podemos conhecer de nós mesmos e a autoconsciência que obtemos, ao viver experiências proporcionadas pelo contato com os nossos medos.

Frente aos limites impostos pelos sentimentos de medo, mergulhamos na nossa própria realidade de maneira mais aguda e profunda.

O que vai nos conduzir nestas reflexões sobre os medos, não é o fato de alguém dizer que não sente medos, mas sim o de poder analisar os medos como um fenômeno inerente aos seres humanos. É perfeitamente normal sentir medo.

Alexander Lowen inicia o quarto capítulo do seu livro “Medo da Vida” fazendo esta pergunta: “Se a vida se resume em ser, porque temos tanto medo disso? Por que nos é tão difícil nos entregarmos e simplesmente sermos?”.

Do que é que o ser humano tem medo?  Vejamos o que diz Aristóteles no livro II da Retórica sobre o medo. “É uma dor ou uma agitação produzida pela perspectiva de um mal futuro que seja capaz de produzir morte ou dor”. Aristóteles observa ainda que não se temem todos os males, mas só os que podem trazer grandes dores e destruições e mesmo estes, só no caso de não serem demasiado longínquos, mas por parecerem próximos e iminentes.

O medo diminui ou elimina-se em condições que tornam os males menos temíveis ou os fazem parecer inexistentes.

O dicionário Aurélio define o medo como o que sentimos frente a noção real, ou imaginária, de algo que nos ameaça. André Luiz, através da psicografia de Francisco Cândido Xavier, em “Nosso Lar”[2] no capítulo 42, classifica “o medo como dos piores inimigos da criatura, por alojar-se na cidadela da alma, atacando as forças mais profundas”.

Podemos admitir facilmente que o medo atinge a nossa alma. E quando as coisas acontecem envolvendo a nossa alma, ficam muito mais complicadas, não é mesmo?  A doutora Susan Jeffers, em seu livro “Como Superar o Medo”[3] diz que o grande problema frente ao medo é que sentimos não poder enfrentá-lo. “ (…) no fundo de cada um de seus medos há, simplesmente, o medo de não poder enfrentar qualquer coisa que a vida possa lhe apresentar” assim como pensar que não consigo enfrentar uma doença, meus erros, a perda do meu emprego ou dos meus bens, a velhice, a solidão, a perda de um amor e assim por diante. A verdade é que se tivéssemos certeza de que poder enfrentar qualquer coisa, não teríamos medo de nada.

Na condição em que vivemos neste mundo, sujeitos a ameaças e perigos de todos os tamanhos e intensidades, na iminência de não suportar uma ameaça, concluímos que, no final das contas, tememos a morte.

O nosso maior temor, verdadeiramente, é o medo de não suportar, de sucumbir em alguma experiência. Não suportando, desaparecemos. Não somos e não existimos mais. É a perda da consciência, isto é, morrer.