Sobre o Movimento de Mocidades
Roni Couto
Dificuldades e insucessos rondam nosso movimento espírita, exigindo de seus dirigentes as virtudes cristãs, bastante recomendadas por eles, para a continuidade das tarefas, na maior paz e fraternidade possíveis. Entre as portas abertas em nossas casas espíritas, impressiona a questão do movimento de Mocidades, que não tem merecido o silêncio dos dirigentes, como temos observado pela leitura constante deste e de outros periódicos espíritas, em nosso estado. A situação das Mocidades Espíritas, que não é a ideal, enfim levou a discussões mais amplas sobre sua reformulação, que é realmente inadiável. O resultado será a continuidade do ensino e da vivência espírita dentro das instituições de forma harmônica. O caminho é a tolerância e o desejo de ver a todos vitoriosos, e não alguns vencedores apenas.
O movimento dos jovens espíritas paulistas precisa mudar. Mas não só ele. Os conflitos e desvios envolvendo os jovens refletem o equívoco que existe na relação jovem -“adulto”, de ambas as partes. De um lado, os jovens aproximam-se dos centros espíritas cheios de idéias modernas, eufóricos por mudanças. De outro estão os dirigentes, com bem mais idade que aqueles, muitos arredios a qualquer mudança. Todo o conflito nasce dessa incapacidade de somar a modernidade que o jovem traz com a experiência dos mais velhos. A relação que se estabelece é a de ganhar ou perder. Então, para que se possa conviver, o jovem realiza um autêntico movimento paralelo, e os dirigentes, acomodados, concordam com essa distância.
Na realidade, uns e outros transportam para o movimento espírita os conflitos familiares. Por que apenas entre os jovens observam-se as ações revolucionárias? Simplesmente porque o jovem, em sua vida particular, vive os anseios da independência, o clima universitário, a sensação das múltiplas possibilidades para seu espírito sonhador. Sua percepção dessa realidade e a relação familiar estabelecida dentro de casa, quando negativas, só poderão provocar novos conflitos na Mocidade Espírita, quando esse jovem sentir que sua liberdade está sendo tirada. Os pais, por outro lado, na instituição espírita, tenderão a dar ordens, o que não combina com o clima de fraternidade que queremos na seara espírita.
A modificação do quadro desenhado acima, que não se deve generalizar, tem dois aspectos. O primeiro é o mais difícil, e também o mais urgente: a modificação íntima. Não estaremos nós a dizer o que deve ser feito sobre isso, quando se tem, na Doutrina Espírita, preciosas lições para a resolução dos conflitos íntimos, mediante uma séria auto-análise. Essa é a tarefa comum a todos nós.
O segundo aspecto dessa modificação depende unicamente dos dirigentes, que devem tomar as decisões administrativas necessárias para que o chamado movimento paralelo desapareça na relação Mocidade-Centro. Temos, como reflexão e sugestão, as seguintes propostas:
1. Aproximar o Departamento de Mocidade da diretoria do Centro.
Muitos dirigentes dirão que o coordenador do Departamento de Mocidade não tem funções na diretoria, e por isso essa proximidade sugerida não precisa existir. Essa opinião é causa e ao mesmo tempo conseqüência da distância que separam “jovens” e “adultos”. Conforme foi divulgado por este periódico (nº 54, julho/agosto de 1999), é a diretoria que vai escolher os coordenadores do departamento. Essa proximidade deverá existir, sem que haja, para o dirigente, a preocupação com a “concorrência” que o jovem poderá representar nas mesquinhas disputas de cargo. O coordenador do Departamento de Mocidade, quando convidado a se aproximar, verá a importância que o grupo jovem desperta entre os dirigentes, gerando um respeito mútuo.
2. Deixar de ver no jovem uma figura incapaz de trabalhos mais sérios.
A opinião geral relaciona a Mocidade apenas à música, ao teatro, à campanha do quilo. Sem desprezar o trabalho humilde da Casa Espírita, nós questionamos porque o jovem não pode fazer parte de trabalhos mais sérios, que exijam estudo e responsabilidade, quando ele apresenta tais características. Os dirigentes que assim procedem perdem na integração com os jovens, desperdiçam recursos humanos – item escasso na seara espírita – e estimulam a migração do jovem para lugar nenhum, quando ele já não se encontra com idade compatível com o grupo jovem, sendo que ele deveria encontrar as portas abertas para o trabalho entre os adultos.
3. Conhecer sua Mocidade Espírita, e se interessar por ela.
Aqui o problema é recíproco: jovens que apenas freqüentam a Mocidade, sem saber o que se passa entre os outros grupos, sobre eventos de confraternização ou palestras e, é claro, sem conhecer ninguém mais além dos jovens. Os dirigentes, por sua vez, apenas têm notícia da existência do grupo jovem, sem um contato mais amplo. A atitude a ser tomada neste caso é a mais simples possível: conhecer o grupo jovem, perguntar sobre suas atividades, interessar-se por seus eventos, e cobrar os resultados esperados.
4. Não transformar o Departamento de Mocidade em uma entidade independente.
Muitas vezes os jovens ouvirão dos dirigentes da Casa: “O Departamento de Mocidade não tem dinheiro!” Qual outro departamento de um Centro Espírita necessita ser auto-suficiente? Alguma vez o Departamento de Doutrina, ao organizar uma semana espírita, teve de encontrar seus próprios recursos para garantir a presença dos expositores? E as crianças, já tiveram de fazer um chá beneficente para comprar material para suas aulas? No entanto, o Departamento de Mocidade precisa de ter seu próprio dinheiro. Como conseqüência, haverá a necessidade de uma conta no banco, de um tesoureiro – ou dois -, de secretário disso, daquilo, e pronto: está montada uma instituição dentro da outra. A Mocidade tem uma diretoria, com estatuto próprio, dinheiro próprio, não devendo, portanto, se subordinar à direção da Casa, que não se prontificou a ajudar…
Este é apenas mais um sintoma da falta de interação na família espírita. Se é razoável que os jovens batalhem pelos recursos para os eventos de maior porte que eles organizam, não é certo que devam ter seu próprio dinheiro para as atividades de estudo ou para a melhoria de suas salas. Senão, repetimos, para que o Centro Espírita? Nossa sugestão é que os eventos – dignos, é claro – para a obtenção de dinheiro ou qualquer outro recurso, sejam o resultado do trabalho de todos. Depois, todos poderão utilizar o dinheiro, conforme a necessidade.
Todos, e nós, espíritas, com maior razão, queremos a paz e a fraternidade invadindo o mundo. Seria muito eficaz, para os nossos sonhos, que concretizássemos tais conquistas em nossas casas espíritas, lugar ideal para os exercícios da renúncia e da paciência. A melhoria do movimento de mocidades será apenas uma das vitórias que iremos conquistar, que tem neste texto um incentivo vindo do coração de quem vê o assunto com carinho, por saber o que representa a Mocidade Espírita para nossas almas, ansiosas que vivem pela perfeição.
(Dirigente Espírita Nº 57 – Janeiro e Fevereiro de 2000)