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Golfinhos, Papagaios e Muriquis: Três Caminhos Diferentes da Evolução Anímica

Três espécies vivendo em meios diferentes revelam estar em caminhos seguros rumo ao reino hominal e além

(Artigo Publicado na Revista Internacional de Espiritismo, Agosto de 2003)

Em artigo nosso na edição de maio passado desta RIE, intitulado Os Diversos Caminhos da Evolução Anímica, ficamos de apresentar exemplos de caminhos evolutivos tomados por três espécies animais, uma vivendo na terra, outra, no mar e uma terceira deslocando-se pelo ar. É o que passamos a fazer.

O golfinho roaz-corvineiro (Tursiopis Truncatus) pertence à ordem dos cetáceos, mamíferos que migraram de volta às águas há cerca de 60 milhões de anos.

Os estudiosos têm descoberto vários comportamentos inteligentes desses animais, fazendo eco a uma tradição que remonta à antiguidade grega. Entre tais comportamentos vários se devem ao sofisticado sistema de comunicação que possuem, incluindo um padrão de assobios próprio que cada indivíduo usa para se identificar, como se fosse uma espécie de nome próprio, o uso de dialetos de assovios específicos por cada grupo, capacidade dos indivíduos comunicarem entre si conceitos abstratos, como provado em um experimento feito pelo Dr. Javis Bastian e capacidade de aprender vocalizações e repeti-las.

Igualmente notável é sua elevada inteligência emocional. A maior parte do tempo são alegres, brincalhões e afetuosos entre si, mesmo quando em cativeiro, tendo demonstrado sempre uma amizade especial pelos humanos. Possuem senso de humor, fazendo molecagens com peixes e aves marinhas somente para se divertirem.

Exibem estratégia, usando batedores para sondar pela primeira vez algo novo em seu caminho ou formando alianças entre seu grupo e um outro para enfrentar um terceiro com que têm algo em disputa. Decidem o que fazer usualmente por consenso, depois de demoradas interações entre os membros do grupo. Em interação com o Dr. John Lilly, um golfinho alterou a regra de um jogo de sons e, ao perceber que um assobio seu não estava sendo ouvido, baixou a freqüência do mesmo até se assegurar que a comunicação se havia estabelecido. A partir desse momento o golfinho guardou a faixa de escuta do Dr. e se manteve dentro dela até o final. Foi um caso singular de um animal fazer um experimento com um ser humano.

A Ciência hoje se divide principalmente entre duas hipóteses para o surgimento das aves, uma que afirma terem elas descendido dos dinossauros e outra terem tanto elas quanto os dinossauros descendido de uma terceira forma, comum a ambas.

Entre as aves, várias espécies têm revelado comportamento inteligente. Dentre elas, escolhemos para nosso estudo o papagaio cinza africano (psittacus erithacus), espécie que vem sendo estudada há várias décadas pela Dra. Irene Maxine Pepperberg, da Universidade do Arizona.

Alex é o nome do simpático papagaio que vemos na foto ao lado. Ele é o papagaio cinza africano mais velho dentre os estudados pela Dra. Irene e por seus colaboradores. Alex aprendeu a responder a perguntas sobre mais de 100 objetos diferentes. Sabe designar corretamente cores, formas e números, utilizando tais conceitos com sentido e de forma combinada, lidando ao mesmo tempo com conceitos abstratos como o tamanho relativo e a noção de igual ou diferente. Sabe como e quando dizer “não”, “venha cá”, “eu quero <tal coisa>” e “quero ir a <tal lugar>”. Sua capacidade lingüística eqüivale à de uma criança de dois anos, ao passo que seu raciocínio na solução de problemas corresponde a uma de quatro, pelo menos. Como diz a Dra. Pepperberg, se Alex é incapaz de conversar como um ser humano, por outro lado consegue dizer com clareza o que deseja e responder corretamente a perguntas que lhe fazem.

Chamamos a atenção dos leitores para o fato de Alex estar aprendendo a linguagem e os conceitos de uma espécie totalmente diferente da sua, uma espécie não apenas pertencente a outra ordem, como são os golfinhos em relação ao homem, mas a outra classe, feito que em muito valoriza os resultados por ele obtidos. Afinal, não se conhece humano algum que tenha sequer começado a se comunicar na linguagem de uma espécie próxima, quanto mais na de uma tão afastada.

Das espécies que escolhemos para comentar a que veremos agora é a mais próxima do ser humano. Estamos falando do amigável muriqui (Brachyteles Arachnoides), também chamado de mono carvoeiro, o maior primata das Américas, vivendo no que resta da outrora pujante Mata Atlântica e que hoje, infelizmente, encontra-se ameaçado de extinção. A primeira pesquisadora a estudar os muriquis foi a Dra. Karen Strier, da Universidade de Wisconsin-Madison, mas agora são vários os pesquisadores brasileiros que o fazem.

O Muriqui é uma espécie singular pela sua vida grupal pacífica, onde um grau de disputa mais elevado jamais ocorre. São animais extremamente carinhosos uns com os outros, sendo comum ver esses animais tocando-se ou se abraçando por poucos ou vários minutos, formando, às vezes, cachos onde vários deles se abraçam ao mesmo tempo, pendurados pelas caudas. A hierarquia entre eles não é baseada nem na força nem na idade, como em outras espécies, mas no grau de afetividade de que cada indivíduo é objeto. Fêmeas e machos têm peso e tamanho semelhantes, inexistindo qualquer forma de agressividade ou competição no comportamento sexual, que se mostra livre e respeitoso. A comunicação entre os muriquis parece ser rica e sofisticada, como evidencia um estudo conjunto feito pelos pesquisadores Francisco Mendes e César Ades, sob o patrocínio da Fapesp (Federação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo). Sem terem que usar qualquer estimulante ou psicotrópico, eles lograram formar a pura sociedade alternativa que a raça humana idealizou e jamais conseguiu realizar.

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No Item 56 do Capítulo I da Segunda Parte de O Livro dos Médiuns lemos: “Com pequenas diferenças quanto às particularidades e exceção feita das modificações orgânicas exigidas pelo meio em o qual o ser tem que viver, a forma humana se nos depara entre os habitantes de todos os globos. Pelo menos, é o que dizem os Espíritos”.

Chama a atenção no texto acima a expressão cautelosa que o Codificador colocou ao final. Fica, no entanto, claro pela leitura, que Kardec entendia que o meio em que o ser tem que viver é fator condicionante da sua constituição física. Kardec, dotado que era de grande cultura, apurado raciocínio e aguçada intuição, devia pressupor existirem mundos de constituições físicas as mais diversas. Ora, em assim sendo, a afirmação de que a forma humana se mantinha, basicamente, entre os diversos mundos deve ter-lhe parecido, no mínimo, estranha. Estaria aí a justificativa da mencionada cautela?

Verificamos não ter o assunto sido objeto de nenhuma questão formal do Codificador aos Espíritos, tampouco o tendo sido de uma resposta assinada por algum dos assim chamados “expoentes da Codificação”. Fomos encontrar, apenas na Revista Espírita de março de 1858, uma outra afirmação de Kardec com base no que haviam dito os Espíritos sobre a questão. Trata-se do artigo intitulado “A Pluralidade dos Mundos”, onde lemos: “Chegamos, pois, por um simples raciocínio, que muitos outros fizeram antes de nós, a concluir pela pluralidade dos mundos, e esse raciocínio se encontra confirmado pela revelação dos Espíritos. Eles nos ensinam, com efeito, que todos esses mundos são habitados por seres corpóreos apropriados à constituição física de cada globo”. Se atentarmos para a última frase, veremos que ela coloca claramente como regra a mesma afirmação que, como consta em O Livro dos Médiuns, pode ser equivocadamente entendida como exceção a uma regra.

Viemos de apresentar exemplos concretos de espécies que evidenciam poder perfeitamente prosseguir em sua evolução sem sofrerem notáveis mudanças em sua constituição física e sutil. Transladados para mundos mais e mais evoluídos, enquanto concluem seu aprendizado no reino onde estagiam, chegará o dia, em que, inevitavelmente, estarão prontos para o ingresso no reino hominal. Nesse dia certamente haverá, dentre as inúmeras moradas existentes na casa do Pai, uma ao menos onde sua constituição física sutil se apresente como a de mais fácil adaptação para se moldar àquela que lá abriga a espécie humana.

Bibliografia

(Publicado no Boletim GEAE Número 475 de 18 de maio de 2004)