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Visão Correta do Espiritismo

Visão Correta do Espiritismo

É inegável que o Espiritismo, essencialmente, como fato natural, como lei da
vida, é de todos os tempos, encontra-se ainda que de modo difuso ou velado no
alicerce de todas as crenças imortalistas, razão por que deve ser concebido não
como uma seita particular e sim como elemento capaz de fortalecer as diversas
religiões e abrir caminho para que elas se encontrem com as várias ciências,
levando o homem a cumprir de maneira integral seu destino neste mundo, através
do desenvolvimento tanto das potencialidades sentimentais quanto intelectivas.
Assim sendo, nada impede que um católico, um teosofista, um amante da umbanda ou
do esoterismo seja também espírita, em face do caráter universalista, cósmico,
do Espiritismo, e quem quiser defender esta posição certamente descobrirá
algumas frases de Allan Kardec para se apoiar. Contudo, somente será espírita em
parte, e não de modo completo, pois é igualmente indiscutível que a
verdadeira Doutrina Espírita está no ensino que os Espíritos deram
(“O Livro
dos Espíritos”, introdução, item XVII), e tal ensino é suficientemente claro
quando estabelece os fundamentos de uma filosofia racional
(idem,
Prolegômenos) que incompatibiliza a teoria e prática do Espiritismo com tudo
aquilo que tem sabor místico e é destituído de conteúdo lógico. Daí porque
ninguém pode ser fiel à causa espírita se deixar de agir com bom senso.

Não basta tirarmos carteirinha no Clube da Pureza Doutrinária para servirmos
com proficiência ao Espiritismo. Importa termos a sua visão correta e o bom
senso indica que, para isso, o primeiro cuidado é não sermos radicais. Na
história de todos os movimentos que hão surgido para alargar os horizontes
mentais do ser humano sempre foram as concepções extremistas que estragaram
tudo… São elas as fontes geradoras da ortodoxia e toda ortodoxia é fechadura
dogmática trancando as janelas da livre análise, sem a qual torna-se impossível
o progresso. Acontece que tanto há uma ortodoxia excessivamente conservadora,
vocacionada para sustentar o tradicionalismo, quanto há uma ortodoxia
exageradamente renovadora, que nada respeita, nem mesmo os valores fundamentais
e imprescindíveis à identidade de um pensamento filosófico. A primeira produz
por imobilismo a fé cega e a segunda vai tão longe que destrói qualquer fé,
ainda que nascida do conhecimento bem construído. Ê lamentável, mas ainda não
aprendemos uma grande lição da Antiguidade clássica: virtude está no meio…

Com o devido apreço aos que lutam por fixar o Espiritismo unicamente no plano
científico ou exclusivamente na esfera religiosa, e ainda com a justa
consideração àqueles que de sejam conservá-lo em sua feição primitiva ou
modernizá-lo por completo, ousamos afirmar que a providência básica para termos
uma ótica senão perfeita, pelo menos razoável, do Espiritismo, consiste em
abandonarmos a presunção de sabedoria infusa e estudarmos com inteligente
humildade obra de Kardec, onde são limpidamente expostos os princípios
inquestionáveis de nossa Doutrina e os pontos sobre o quais ela própria
recomenda reflexão, pesquisa e debate para amadurecimento das idéias.

O mal é que, ao invés de examinarmos sem premeditação os livros do mestre
lionês, recorremos a eles com o deliberado ânimo de catar argumentos esparsos
alimentadores de nossas tendências ideológicas, sem admitir que, como as demais
pessoas, estamos sujeitos a limitações perceptivas. Ora, como todos nos situamos
em graus de evolução diferenciados, cada um vê o Espiritismo de uma forma
distinta, resultando daí as insanáveis divergências opiniáticas Se sabemos
administrá-las, cultivando-as com equilíbrio e moderação, ainda dá para
convivermos em regime de trabalho solidariedade e tolerância, consoante a
divisa, ou lema, da Codificação. Se caímos no radicalismo, terminamos sendo
nocivos e não úteis ao ideal comum. É o que parece, salvo melhor juízo…

(Reformador nº2000 de Novembro de 1995)