Depoimento de uma Mãe
Nossa filha retornou ao plano espiritual, de onde veio há quarenta e quatro anos,
dois meses e vinte dias, depois de uma luta de cinco anos contra o câncer.
Foram anos de muito sofrimento, mais devido aos tratamentos. Todavia, nos intervalos
destes, ela se reerguia e trabalhava, elaborando sonhos e projetos e os executava.
Morava em Campo Grande, Estado de Mato Grosso do Sul, onde se realizou profissionalmente,
fez muitos e bons amigos, casou-se, teve um filho, teve um livro publicado, passou
a fazer parte de uma família que a recebeu de coração e braços abertos.
Quando o câncer se iniciou, senti apreensão e tristeza. Sabia porém, convictamente,
que tudo que acontece aos outros, pode acontecer conosco, havendo pois, milhões
de pais, milhões de pessoas com o mesmo problema. Sentia muito pelo seu sofrimento
e pelo que viria, mas confiava em Deus, que nos dá, através de suas leis, exatamente,
o que devemos e podemos receber.
Procurei estimulá-la na aceitação, na resignação ativa que leva a pessoa a procurar
libertar-se, na busca dos recursos adequados à cura, com confiança e serenidade.
Tive sempre a impressão de que ela não se curaria, que essa doença era conseqüência
final de atitudes e atos em antigas vidas passadas, e que chegara o momento dela
libertar-se, limpar seu perispírito enfermo, através do corpo físico.
Não tinha idéia de como me sentiria, quando ela desencarnasse.
Não estive presente ao seu desencarne. Quando pensava que era o princípio do
fim desta existência, já era o final.
Fui ansiosa para Campo Grande.
Ao me ver no velório, diante do seu corpo bonito, parecendo apenas ter fechado
os olhos e que sua boca iria abrir-se num sorriso, chorei, não tanto quanto desejava.
Logo, porém, percebi e me senti em um ambiente espiritual tão suave e doce, conseqüência
da assistência espiritual e dos sentimentos amorosos das pessoas que ali estavam,
que me equilibrei, acalmando-me.
Senti-me em paz e percebi, com uma nitidez muito clara, as presenças de meus
pais, desencarnados, aos quais Iris dedicava grande afeição, ambos recepcionando-a.
Não os vi, não tenho vidência, mas sentia-os ali, ambos com ela, um pouco distante
do corpo, liberta das dores físicas, em um sono tranqüilo e relaxante.
Senti, dentro e ao redor de mim, uma paz muito doce, terminando nesse instante,
o sofrimento de estarmos separadas, materialmente falando, por mais de oitocentos
quilômetros.
Para mim, o sofrimento maior não foi sabê-la com doença grave e dolorosa, porque
confio, plenamente, na justiça e na misericórdia da lei divina; sei que todos nós,
habitantes da Terra, encarnados e desencarnados, ainda precisamos da dor e do sofrimento,
para elevarmo-nos em direção à Luz Maior, devido a nossa dificuldade em amarmo-nos
uns aos outros.
O sofrimento maior foi estarmos separadas durante os dois últimos anos e meio,
vendo-a duas vezes por ano, quando ela a nós se reunia, com o marido e o filho.
Nesse período, nosso contato era por telefone, e eu a ouvia falar de suas dores,
sentindo na maneira como ela dizia: mãe, a intensidade do seu sofrimento e não poder
abraçá-la, servi-la ou chorar junto.
Todas as noites pedia a Deus que me permitisse reunir-me a ela, durante o sono
físico. Penso que lá estive, senão todas as noites, mas muitas delas, quando então,
despertava com alegria, gratidão e muita confiança em Deus.
Para mim, esse sofrimento de não estar junto, num período difícil, eu o considero
não só o maior, mas talvez o único que mereça este nome, porque doenças, dificuldades
financeiras, materiais, de relacionamentos, lutas internas, fazem parte do viver
na Terra; são oportunidades, desafios que nos levam ao crescimento intelectual e
moral. E existe prazer no processo de resolução dos problemas e desafios.
Meu maior sofrimento não foi pois, o desencarne da Iris.
Penso nela constantemente, como pensava antes, porém, com alívio de sabê-la liberta
do sofrimento físico, renascendo no plano espiritual, amparada por amores que a
esperavam.
Envio-lhe minhas vibrações de amor, digo-lhe – e sei que ela recebe minhas palavras
– que se entregue com confiança à proteção dos avós e/ou dos que estiverem com ela,
a fim de que possa, o mais breve possível, erguer-se, readaptar-se, ser útil, como
fazia nos intervalos do tratamento; que ela não se prenda ao marido e ao filho que
aqui deixou. Eles continuarão a amá-la e a viver.
Os filhos são Espíritos como nós, em processo evolutivo, que vêm até nós para
que os amemos e os auxiliemos no aproveitamento das experiências do viver na Terra.
Devemos pois, saber devolvê-los para o plano espiritual, quando eles partem ou deixá-los
aqui quando nós, pais, partimos.
Confiemos sempre nas leis naturais da vida, na certeza de que o amor verdadeiro
é eterno, durará para sempre, porque sempre, aqui ou no além, estaremos exercitando
a vida. E o mais importante do viver é amar, é esquecer-se de si para fazer o outro
feliz. Este é o amor que Jesus exemplificou, amor que todos buscamos, quase sempre
sem mesmo disso ter consciência.
Ali, no velório, compreendi que dor alguma seria capaz de abalar minha certeza
na imortalidade da alma.
Mesmo na hora do sepultamento, o que eu sentia era que Iris não estava ali, apenas
seu corpo estava sendo enterrado, corpo esse que lhe serviu para aqui viver, expressar-se,
manifestar-se, relacionar-se e libertar-se.
Estamos hoje, em melhores condições que antes. Ela está amparada e recebe nossas
vibrações de amor e saudade saudável.
Um dia, quando chegar a nossa vez de partir, ela estará nos esperando, auxiliando-nos
na passagem de um plano a outro e em nossa readaptação.
(Jornal Verdade e Luz Nº 186 de Julho de 2001)