A Tormentosa Incerteza do Materialismo e da Incredulidade
Os Tomés da Vida continuam reencarnando, vez que pululam na Terra os
materialistas e os incrédulos…
Dizem os Espíritos Amigos que a bem pouca coisa se reduziriam as nossas
convicções se acreditássemos tão somente naquilo que podemos ver ou observar com
o testemunho dos sentidos. E é justamente por conhecer a natureza humana que
Jesus, após o luminoso amanhecer de lúculas alvinitentes, testemunhado pela
ex-obsidiada de Magdala, exclamou com certa tristeza, ante um Tomé espantadiço:
“Porque me viste, creste; bem-aventurados os que não viram e creram”.
Registram as palavras das Escrituras (Lc., 4:14 a 31.), que Jesus foi expulso
de Sua terra natal por causa da incredulidade de Seus conterrâneos.
Em todas as épocas a incredulidade tem sido a fiel escudeira da Humanidade,
cerceando-lhe os passos na senda evolutiva.
Sensível à magnitude dos escolhos caudatários da incredulidade e do
materialismo, o caroável Mestre Lionês aborda o tema à exaustão, onde entre
outros judiciosos apontamentos, podemos destacar:
“(…) É crença geral que, para convencer, basta apresentar os fatos.
Esse, com efeito, parece o caminho mais lógico. Entretanto, mostra a experiência
que nem sempre é o melhor, pois que a cada passo se encontram pessoas que os
mais patentes fatos absolutamente não convenceram. A que se deve atribuir isso?
É o que vamos tentar demonstrar.
No Espiritismo, a questão dos Espíritos é secundária e consecutiva; não
constitui o ponto de partida. Este precisamente o erro em que caem muitos
adeptos e que, amiúde, os leva a insucesso com certas pessoas. Não sendo os
Espíritos senão as almas dos homens, o verdadeiro ponto de partida é a
existência da Alma. Ora, como pode o materialista admitir que, fora do mundo
material, vivam seres, estando crente de que, em si próprio, tudo é matéria?
Como pode crer que, exteriormente à sua pessoa, há Espíritos, quando não
acredita ter um dentro de si? Será inútil acumular-lhe diante dos olhos as
provas mais palpáveis. Contestá-las-á todas, porque não admite o princípio.
Todo ensino metódico tem que partir do conhecido para o desconhecido. Ora,
para o materialista, o conhecido é a matéria: parti, pois, da matéria e tratai,
antes de tudo, fazendo que ele a observe, de convencê-lo de que há nele alguma
coisa que escapa às leis da matéria. Numa palavra, primeiro que o torneis
ESPÍRITA, cuidai de torná-lo ESPIRITUALISTA. Falar-lhe, portanto, dos Espíritos,
antes que esteja convencido de ter uma alma, é começar por onde se deve acabar,
porquanto não lhe será possível aceitar a conclusão, sem que admita as
premissas.
Antes, pois, de tentarmos convencer um incrédulo, mesmo por meio dos
fatos, cumpre nos certifiquemos de sua opinião relativamente à alma, isto é,
cumpre verifiquemos se ele crê na existência da alma, na sua sobrevivência ao
corpo, na sua individualidade após a morte. Se a resposta for negativa,
falar-lhe dos Espíritos seria perder tempo. Eis aí a regra. Não dizemos que
não comporte exceções. Neste caso, porém, haverá provavelmente outra causa que o
torna menos refratário…
Entre os materialistas, importa distinguir duas classes.
Primeira classe: colocamos nesta os que o são por sistema. Nesses,
não há a dúvida, há a negação absoluta, raciocinada a seu modo. O homem, para
eles, é simples máquina, que funciona enquanto está montada, que se desarranja e
de que, após a morte, só resta a carcaça.
Felizmente, são em número restrito e não formam escola abertamente
confessada. Não precisamos insistir nos deploráveis efeitos que para a ordem
social resultariam da vulgarização de semelhante doutrina.
Quando dissemos que a dúvida cessa nos incrédulos diante de uma explicação
racional, excetuamos os materialistas extremados, os que negam a existência de
qualquer força e de qualquer princípio inteligente fora da matéria. A maioria
deles se obstina por orgulho na opinião que professa, entendendo que o
amor-próprio lhes impõe persistir nela. E persistem, não obstante todas as
provas em contrário, porque não querem ficar de baixo. Com tal gente, nada há
que fazer; ninguém mesmo se deve deixar iludir pelo falso tom de sinceridade
dos que dizem: fazei que eu veja, e acreditarei. Outros são mais francos e dizem
sem rebuço: ainda que eu visse, não acreditaria.
A segunda classe de materialistas, muito mais numerosa do que a
primeira compreende os que o são por indiferença, por falta de coisa melhor,
pode-se dizer. Não o são deliberadamente e o que mais desejam é crer, porquanto
a incerteza lhes é um tormento. Há neles uma vaga aspiração pelo futuro;
mas esse futuro lhes foi apresentado com cores tais, que a razão deles se recusa
a aceitá-lo. Daí a dúvida e, como conseqüência da dúvida, a incredulidade. Assim
sendo, se lhes apresentardes alguma coisa racional, aceitam-na pressurosos.
Esses, pois, nos podem compreender, visto estarem mais perto de nós do que, por
certo, eles próprios o julgam.
Aos primeiros não faleis de revelação, nem de anjos, nem do paraíso: não
vos compreenderiam. Colocai-vos, porém, no terreno em que eles se encontram e
provai-lhes primeiramente que as leis da Fisiologia são impotentes para tudo
explicar; o resto virá depois.
De outra maneira se passam as coisas, quando a incredulidade não é
preconcebida, porque então a crença não é de todo nula; há um gérmen latente,
abafado pelas ervas más, e que uma centelha pode reavivar. É o cego a quem se
restitui a vista e que se alegra por tornar a ver a luz.
Ao lado da tribo dos materialistas propriamente ditos, há uma terceira
classe de incrédulos que, embora espiritualistas, pelo menos de nome, são tão
refratários quanto aqueles. Referimo-nos aos incrédulos de má-vontade. A esses
muito aborreceria o terem que crer, porque isso lhes perturbaria a quietude
nos gozos materiais. Temem deparar com a condenação de suas ambições, de seu
egoísmo e das vaidades humanas com que se deliciam. Fecham os olhos para não ver
e tapam os ouvidos para não ouvir…
Apenas por não deixar de mencioná-la, falaremos de uma quarta categoria, a
que chamaremos incrédulos por interesse ou de má-fé. Os que a compõem sabem
muito bem o que devem pensar do Espiritismo, mas ostensivamente o condenam por
motivos de interesse pessoal. Não há nada que se possa fazer por eles, vez
que o puro materialista tem para o seu engano a escusa da boa fé e possível será
desenganá-lo, provando-se-lhe o erro em que labora; mas no outro, há uma
determinação assentada, contra a qual todos os argumentos irão se chocar em vão.
O tempo se encarregará de lhe abrir os olhos e de lhe mostrar, quiçá à custa
própria, onde estavam seus verdadeiros interesses, porquanto, não podendo
impedir que a Verdade se expanda, ele será arrastado pela torrente, bem como os
interesses que julgava salvaguardar.
Além dessas diversas categorias de opositores, muitos há de uma infinidade
de matizes, entre os quais se podem incluir: os incrédulos por pusilanimidade,
que terão coragem, quando virem que os outros não se queimam; os incrédulos por
escrúpulos religiosos, aos quais um estudo esclarecido ensinará que o
Espiritismo repousa sobre as bases fundamentais da religião e respeita todas as
crenças; que um de seus efeitos é incutir sentimentos religiosos nos que os não
possuem, fortalecê-los nos que os tenham vacilantes. Depois, vêm os incrédulos
por orgulho, por espírito de contradição, por negligência, por leviandade, etc.,
etc…
Não podemos omitir uma categoria a que chamaremos incrédulos por
decepções. Abrange os que passaram de uma confiança exagerada à incredulidade,
porque, sofreram desenganos. Então, desanimados, tudo abandonaram, tudo
rejeitaram. Estão no caso de um que negasse a boa-fé, por haver sido ludibriado.
Ainda aí o que há é o resultado de incompleto estudo do Espiritismo e de falta
de experiência.”
A incredulidade e o materialismo têm sido, portanto, em todas as épocas, os
dois grandes escolhos da Humanidade.
Dar-lhes combate é nossa missão, e o Espiritismo nos oferece todos os
recursos para o êxito dessa nobre tarefa descortinadora dos imensuráveis e
alcandorados horizontes espirituais, erradicando de vez esses grilhões que
impedem a ascese espiritual das criaturas no rumo da destinação assinada para
todos nós por Deus.
(Publicado no Boletim GEAE Número 423 de 7 de agosto de 2001)