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O Alerta Sutil Que Lemos nos Noticiários

O Alerta Sutil Que Lemos nos Noticiários

Constitui uma crença fundamental do espírita que o acaso não existe. No
Evangelho, podemos encontrar a afirmação de Jesus: “não cai um único fio de
cabalo de nossas cabeças sem que Deus o saiba”. É com base nessa certeza que
devemos estar atentos para certas coincidências aparentes que ocorrem a nosso
redor, mas que, na verdade, podem servir de alerta. Parafraseando novamente o
Evangelho, é preciso que tenhamos “olhos de ver” e “ouvidos de ouvir”.

Há meses o noticiário internacional tem estado repleto de informações até
certo ponto alarmantes sobre a síndrome chamada de BSE ou vulgarmente de “mal da
vaca louca”. Como se sabe, a “encefalite espongiforme bovina” (eis o nome
técnico que dá razão à sigla BSE) é causada pela insistência de diversos
criadores europeus de alimentarem o gado bovino com um tipo de ração que contém
restos processados de animais mortos (em geral, gado bovino que morre por
diversas causas que, em princípio, não comprometeriam o uso de seus restos como
matéria-prima de ração para o rebanho remanescente).

Agora se sabe que a ingestão desse tipo de ração faz com que o gado produza
um tipo de molécula chamada príon que nada mais é do que o resultado da digestão
das proteínas adicionadas à ração através do processamento de restos de outros
animais mortos. Esses príons acabam contribuindo diretamente com a degeneração
das células cerebrais do gado, gerando a síndrome.

Se pensarmos friamente, o tipo de alimentação que parece estar na origem do
“mal da vaca louca”constitui-se em uma espécie de “canibalismo forçado” que foi
imposto ao gado europeu. A suposta justificativa para essa prática estaria na
tentativa de “evitar o desperdício”. Afinal, se uma cabeça de gado morre devido
a alguma causa que não seja uma doença contagiosa, por que o criador deveria
desperdiçar todo o investimento feito naquele animal: alimentação, vacinas,
gastos com mão-de-obra no manejo, etc?! Compreende-se assim que, em nome da
maior produtividade e lucratividade, os criadores europeus tenham cogitado de
violentar um princípio muito elementar da vida sobre a Terra: nenhuma espécie
canibal sobrevive ou se desenvolve por muito tempo. Em O Livro dos Espíritos,
encontramos esse tema desenvolvido em algumas questões, sobretudo aquelas
pertinentes às Leis de Reprodução e de Conservação.

A lição que acredito devemos tirar desse episódio, que vem tomando contornos
de verdadeira catástrofe na Europa, é que não deve o homem querer reinventar a
Criação. Mas, seria esse um alerta restrito à questão da bovinocultura européia?
Certamente não! Tentar ultrapassar os limites da intervenção humana sobre a obra
de Deus é uma prática que possui uma outra frente muito mais preocupante: a
clonagem humana e a “programação genética” que se tornaria possível a partir
dela.

O chamado “Projeto Genoma”, que mobilizou cientistas e acadêmicos em toda
parte do mundo, inclusive no Brasil, não foi apenas um empreendimento que buscou
abrir caminho para a compreensão e eventual cura de males ainda incuráveis e de
origem genética, do câncer ou à calvície masculina. Há claros interesses
comerciais em decifrar a seqüência genética do Homem. Tanto isso é verdade que
um grupo de pesquisadores da iniciativa privada desenvolveu um trabalho paralelo
e quase adiantou-se ao grupo do Projeto Genoma na divulgação do sequenciamento
dos genes humanos. Em paralelo com as pesquisas dedicadas ao genoma, e com certa
vantagem temporal, desenvolviam-se as experiências de clonagem de animais
superiores como ovelhas e macacos.

Até onde esses esforços científicos – louváveis, em princípio – podem nos
levar?

O presidente norte-americano George W. Bush afirmou há algumas semanas que
não assinaria os Protocolos de Kyoto para a redução da emissão de gases
poluentes porque “salvar a atmosfera terrestre não era economicamente
interessante para os EUA hoje”! Diante dessa afirmação fria e surpreendente em
sua sinceridade, acredito que estamos frente de um perigo real. Como evitar o
uso dos conhecimentos da genética e das técnicas de clonagem para fins
essencialmente comerciais? Como evitar que o Homem queira brincar de Deus? Como
evitar que pessoas sem valores éticos e sentimento religioso acabem querendo
programar seus filhos geneticamente?

O desastre em que vem se transformando a disseminação da BSE na Europa mostra
que contrariar princípios básicos da Criação pode e deve gerar males não
previstos e terríveis. Que espécie de novo gênero humano poderia surgir caso a
manipulação genética fosse aplicada em larga escala? Que critérios outros que
não o frio interesse material moveria os “profissionais” responsáveis pela
programação genética que seria vendida como qualquer outro serviço médico no
mercado? Na eventualidade de esse tipo de prática ser bem sucedido em gerar
seres humanos dotados de características altamente desejáveis, que tipo de
discriminação sofreriam aqueles que não fossem nascidos como resultado dessa
escolha genética?

Deus é extremamente generoso nos alertas que nos envia através da vida, sejam
aqueles que dizem respeito particularmente a cada um de nós, sejam aqueles que
se vinculam às questões mais amplas da Humanidade. O descompasso entre a
evolução da Ciência e da Técnica e a evolução da Moral já nos conduziu à
tragédia sem precedentes da Segunda Guerra Mundial. Naquele momento, todo o
conhecimento técnico da Revolução Industrial acabou contribuindo para a
construção de imensos mecanismos de destruição em massa. Agora, mais uma vez,
esse descompasso nos ameaça de uma forma mais sutil mais igualmente horrível.
Acredito sinceramente que o Homem se aproxima mais rapidamente de Deus quando
desiste de ser Deus. Nessa humildade essencial, demonstrada na grande síntese da
figura simples, pobre e quase obscura de Jesus, reside certamente a senda que
conduz ao Pai.

(Publicado no Boletim GEAE Número 415 de 17 de abril de 2001)