Ano Bom
Achamos admirável a disposição de ânimo das criaturas que se saúdam à entrada
de cada Novo Ano, augurando votos de felicidades umas às outras.
É ainda uma das belas praxes cultivadas pelo espírito humano, abstração feita
ao caráter meramente protocolar que, em alguns casos, possa oferecer.
Isso ameniza um pouco as asperezas da trajetória terrena e dá novo alento ao
trato social, que se reveste assim de mais beleza e atrativo.
Quem realiza semelhante prodígio de cordialidade e delicadeza nas
manifestações dos sentimentos? quem responde por esse clima de amenidade de que
nos damos conta dentro e fora dos ambientes domésticos? quem contribui, assim,
de maneira tão decisiva, para que as coisas, de um final de ano ao começo de
outro, mostrem- se abrandadas, cativantes, impregnadas de um quê de radiosidade
envolvente e penetrativa?
E a resposta é – o Tempo, única e exclusivamente o Tempo, esse patrimônio
comum de todos e denominador comum de renovação de tudo, tal como o entendia
Padre Germano, que situava nele alcandoradas esperanças de grandiosas
realizações e grandes realidades.
Quando empregamos as expressões “Ano Novo” e “Ano Bom”, para qualificar um
outro ciclo do Calendário, temos – talvez sem o perceber – a idéia de que o
Tempo é uma das maiores e mais exuberantes bênçãos com que o Criador nos
felicita na experiência planetária.
Todo Ano poderá ser Bom, ainda que nossas impressões sejam em contrário.
Ele será bom, tanto quanto o desejamos, não pelo que recebermos, mas pelo que
dermos; não pelo que os outros nos fizerem, mas pelo que fizermos aos outros;
não pelo que eles forem para nós, mas pelo que formos para eles, isto é, todo
Ano- Novo será necessariamente Ano Bom, se bons nossos pensamentos e atos, se
boas nossas palavras e atitudes.
Manifestações de coisas ótimas são também novidades ótimas.
Transmissão de notícias alentadoras. Anúncio de acontecimentos promissores.
Divulgação de mensagens salutares. Surpresas agradáveis. Lembranças carinhosas.
Impressões estimulativas. Impulsos de cordialidade. Expansões de sadio bom
humor. Delicadas demonstrações de sentimento gratulatório. Expressões de
gentileza. Apresentação de maneiras discretas, distintas, corretas e nobres.
Tudo que possa contribuir para edificar e expandir o Bem, de que dermos
autênticos testemunhos, serão como que parcelas de nós mesmos que se entranharão
na Alma do Tempo, refletindo nela Luz e Bondade de nossa própria alma.
Tudo que, por nosso intermédio, caracterizar e definir o Belo, caracterizará
e definirá gemas e preciosidades do nosso relicário íntimo, já por si mesmo
embelezado.
Assim, se, ao término de um “Ano”, acharmos que ele não foi “Bom”, como
esperávamos que o fosse e sempre esperamos que o seja, é que não realizamos o
ideal da Bondade em nós mesmos.
Não nos fazendo bons nem melhores, coisa alguma de bom e melhor poderemos
amealhar na caixa forte de nossas riquezas e aquisições.
Não sabendo demonstrar valor diante das situações difíceis com que nos vemos
a braços, estas se nos afigurarão adversas, madrastas e inarredáveis.
Não revelando tolerância, faltar-nos-ão elementos para suportar e compreender
os outros.
Não manifestando espírito de disciplina, as coisas mostrar-se-nos-ão
tumultuadas e incontroláveis.
Não demonstrando boa vontade, tudo nos parecerá penoso, difícil, estranho,
anormal, anômalo, incompreensível.
Não nos esforçando por progredir, as maravilhas da Evolução manter-se-ão
distantes e ausentes, ocultas e inapreensíveis, sem que possamos vê-las,
senti-las e alcançá-las.
Não trabalhando com afinco, as melhorias de condições de vida retrair-se-ão
ao nosso contato.
Não estudando com real aplicação, o Conhecimento e a Cultura permanecerão
alheios à nossa presença.
Não nos dedicando ao fiel cumprimento dos nossos deveres humanos e
espirituais, as verdadeiras alegrias e venturas da existência não darão acordo
de si à passagem de nossos corações.
Não nos conduzindo bem, as boas coisas não se apresentarão em nosso caminho,
nem se farão sentir em nós e por nós, estrada afora.
Um Ano é Bom quando bons nos fazemos em todo o seu decurso, evidenciando a
presença de Deus em nossas vidas.
REFORMADOR, JANEIRO, 1997