Curso de Introdução ao Espiritismo
Raros têm sido durante muito tempo, na França, nos meios oficiais, os
experimentadores liberados das rotinas clássicas e dotados das qualidades
necessárias para bem conduzir estas delicadas observações. Todos aqueles que têm
procedido com perseverança e imparcialidade puderam constatar a realidade das
manifestações dos defuntos. Mas, tão logo publicam os resultados de suas
pesquisas, encontram, mais freqüentemente, apenas incredulidade, indiferença ou
escárnio. Os homens de ciência, para explicar os fatos espíritas, têm acumulado
sistema sobre sistema e recorrido às hipóteses mais inverossímeis, torcendo os
fenômenos para os fazer entrar em suas concepções.
É assim que vimos surgir tantas teorias estranhas, como a do nervo crepitador
de Jobert de Lamballe, a das articulações estalantes, a dos automatismos
psicológicos, a das alucinações coletivas, até aquela subliminar. Essas teorias,
mil vezes refutadas, renascem sem cessar. Dir-se-ia que os representantes da
ciência oficial nada temem tanto quanto serem obrigados a reconhecer a
sobrevivência e a intervenção dos Espíritos.
O estudo dos fenômenos é de uma importância capital ; é sobre ele que repousa
o espiritismo por inteiro ; mas, muito freqüentemente, a falta de método, a
falta de continuidade e de direção nos experimentos, tornam estéreis a boa
vontade dos médiuns e as legítimas aspirações dos pesquisadores. É a essas
causas que é preciso atribuir os resultados pouco concludentes que se obtém em
tantos meios. Experimenta-se ao acaso, febrilmente, sem cuidar das condições
necessárias ; tem-se pressa de obter os fenômenos transcendentes. Por
conseqüência mesmo do estado de espírito com que se conduzem as pesquisas,
acumulam-se as dificuldades e, por fim, após algumas tentativas, obtém-se apenas
fatos insignificantes, banalidades ou mistificações, desencorajando e afastando
os experimentadores.
Os homens de ciência querem impor à essas pesquisas as regras da ciência
ortodoxa e positiva, que consideram como os únicos fundamentos da certeza, e se
essas regras não forem adotadas e seguidas, rejeitam sem piedade todos os
resultados obtidos.
Entretanto, a experiência nos demonstra que cada ciência tem suas regras
próprias. Não se pode estudar com sucesso um nova ordem de fenômenos
inspirando-se em leis e condições que regem fatos de uma ordem diferente. É
somente por meio de pesquisas pessoais ou graças à experiência adquirida nessa
via pelos pesquisadores conscienciosos, e não em virtudes de teorias à priori,
que se pode determinar as leis que governam os fenômenos ocultos. Essas leis são
as mais sutis e complicadas. Seu estudo exige um espírito atento e imparcial.
Mas como exigir imparcialidade para aqueles cujo interesse, renome e
amor-próprio estão ligados estreitamente a sistemas ou a crenças que o
Espiritismo poderia abalar ?
Não é necessário ser um matemático, um astrônomo, um médico de talento, para
empreender, com chance de sucesso, as investigações em matéria de Espiritismo ;
basta conhecer as condições a preencher e submeter-se a elas. Essas condições,
nenhuma outra ciência poderia indicar. Somente a experimentação assídua e as
revelações dos Espíritos-guia, nos permitem estabelecê-las de uma maneira
precisa.
Em muitos casos, o fenômeno espírita se produz com uma espontaneidade que
excede todas as previsões. Pode-se apenas constatá-lo. Ele se impõe e escapa à
nossa ação. Chame-o, ele se furta. Mas se você não pensa mais nele, reaparece.
Isso ocorre em quase todos os casos de aparições à distância e nos fenômenos de
casas assombradas. Os fantasmas vão e vêm, sem se preocupar com nossas
exigências e nossas pretensões. Espera-se durante horas e nada se produz. Faz-se
menção de partir, as manifestações começam.
À propósito da imprevisibilidade dos fenômenos, recordemos o que disse o Sr.
Varley, engenheiro chefe dos serviços de postes e telégrafos da Grã-Bretanha1
:
“A Sra. Varley via e reconhecia os Espíritos, particularmente enquanto
estava em transe (estado de sonambulismo lúcido) ; ela é também uma médium muito
boa de encarnações, mas não tenho sobre ela quase nenhuma influência para
provocar o transe, de modo que me é impossível servir de sua mediunidade para
fazer experiências. ”
É um ponto de vista errôneo e grosseiro, de conseqüências impertinentes,
considerar o Espiritismo como um domínio onde os fatos se apresentam sempre
idênticos, onde os elementos de experimentação podem ser disponibilizados à
nossa vontade. Fica-se exposto com isso a ter pesquisas vãs ou a resultados
incoerentes.
Os sábios têm em pouca conta as afinidades psíquicas e a orientação dos
pensamentos, que constituem entretanto um fator importante no problema espírita.
São levados a considerar o médium como um aparelho de laboratório, como uma
máquina que deve produzir os efeitos à vontade, e usam para com ele de uma
cerimônia excessiva. As Inteligências invisíveis que o dirigem são comparadas
por eles a forças mecânicas. Em geral, se recusam a ver nelas seres livres e
conscientes, cuja vontade entra em grande parte nas manifestações, que têm suas
idéias, seus desejos, seu objetivo, que desconhecemos, e que não estão sempre
com o propósito de interagir ; umas porque a desenvoltura e a visão muito
material dos experimentadores as afastam ; as outras porque, muito inferiores,
não sentem a necessidade de demonstrar aos homens as realidades da
sobrevivência.
Vale anotar:
- Não se pode repetir à vontade o fenômeno que se quer estudar, porque os
Espíritos têm sua vontade própria. Estuda-se então o fenômeno Espírita em
condições outras do que as das ciências clássicas como a Química, a Biologia,
a Física, etc…
Para saber mais:
- No Invisível Léon Denis (1ª parte, cap. IX, Condições de
experimentação) - No Invisível Léon Denis (1ª parte, cap. II, Os modos de estudos)
1Proceedings of the Society psychical research, v. II.