É a Reencarnação Um Estímulo à Preguiça?
Umas das objeções freqüentemente apresentadas à tese reencarnacionista é a
suposição de que as pessoas ao aceitarem a pluralidade das existências possam se
tornar acomodadas com relação à sua transformação interior. O fato de admitirem
novas oportunidades lhes inibiria o impulso ao progresso espiritual. A
responsabilidade podendo ser adiada levaria os seres humanos, falhos por
natureza, a transferirem para outras vidas os deveres que se apresentassem na
romagem atual.
Consideram, alguns críticos, que a existência de uma só vida, ou seja, a
unicidade ao invés da pluralidade das existências, não permitiria este estímulo
à preguiça espiritual. Dizem-nos que não há como postergar para amanhã o que se
pode fazer hoje, apenas hoje.
Esta objeção é comumente mencionada ao dialogarmos com adeptos de
determinadas confissões religiosas. Raciocinemos comparativamente, colocando as
duas teses opostas lado a lado.
Pela crença na vida única, considerando a existência da alma e a
sobrevivência da mesma após a morte biológica, haveria duas hipóteses no que
concerne à destinação das criaturas. Ou seriam “salvas” ou estariam “condenadas”
a uma punição eterna ou extremamente longa até ao chamado “dia do juízo final”.
Para os religiosos que assim pensam, a salvação estaria disponível até o
último suspiro da existência terrena. Sempre haveria tampo do “pecador” se
arrepender de seus atos e “aceitar” Jesus no último instante, passando a ser
digno das recompensas futuras e eternas independentemente de erros anteriores.
Pela ótica da tese reencarnacionista o que nesta vida estamos semeando,
passaremos a colher no futuro, e não só nesta existência, como também, nas vidas
posteriores.
A responsabilidade pelos nossos atos torna-se muito maior, já que não há uma
idéia salvacionista, porém uma concepção de evolução e colheita obrigatória. Não
há, portanto, espaço para qualquer postura de acomodação ou preguiça.
Se nos propusermos realmente a examinar, de forma imparcial e desapaixonada
ambas as hipóteses, parecer-nos-á bastante claro que a pluralidade das
existências, ao contrário da concepção da vida única, exige muito amor e
conscientização de nossas imperfeições a serem corrigidas.
Ao invés de transferirmos a responsabilidade para outros que atuariam como
representantes da divindade, ou esperarmos um perdão milagroso que apaga as
nódoas da maldade mais encardidas e repugnantes, fruto de atos vis de nosso
espírito, há um estímulo constante para nos reformarmos intimamente rumo à
sabedoria e ao amor universal.
A concepção reencarnacionista ensina que não existe a “salvação” existe a
evolução. Não há almas “condenadas” mas transitoriamente enfermas. A mensagem
cristã de “ nenhuma das ovelhas se perderá”, ajusta-se plenamente na tese da
pluralidade das existências dando oportunidade a que todos atinjam a felicidade.
Permite atribuir facilmente a Deus a totalidade do amor e justiça.
No entanto, apesar do destino último de todas as criaturas após inúmeras
reencarnações ser um destino perfeito, estamos sujeitos a cada momento às
dolorosas conseqüências de nossos desatinos não existindo milagres
salvacionistas que nos levem preguiçosamente a um paraíso, independentemente de
uma vida pouco útil ou perniciosa ao próximo.
Dr. Ricardo Di Bernardi